Quem pode garantir que Marilena estava lá na hora em que tudo ocorreu?
Pejado de sua santidade de Helena,
ou prenhe de sua volubilidade de Maria,
quem, tão cheio de pecado,
poderia proclamar-lhe qualquer sentença?

Marilena não fugiu da cena,
porque nem deixou marcas de sua presença.
Apareceu dia destes
numa esteira,
a beira-mar,
tomando sol
e bebendo cerveja.

Perguntaram-lhe:
Onde vós estáveis,
Marilena,
na noite daquela novena
em que o corpo de Esculápio,
filho de Dionísio,
foi encontrado?

– Tava era na cachaça,
dançando côco,
comendo camarão na ponta da praia.

Arrostaram Marilena
e a trancaram à chave,
por conta de que aquilo
não era álibi que prestasse.

Fizeram-na exemplo para toda a cidade.

Porque dormia com um doutor santo
e não tinha por ele nenhuma piedade?
Por conta de suas coxas reluzentes
atrapalhando o juízo da cristandade?

Nada.

Foi porque era insuportável
para todos eles
aquela insistente
incômoda
maldita felicidade.