Em Dobris, junto a Praga,
conversando com
Jorge Amado,
meu companheiro de anos e de lutas:
De onde
vens agora?

Eu, dos largos rios
da Guatemala e México,
do fulgor verde
do rio Doce, adentro.
Levava
fogo de aves selvagens,
orvalho
de foz.

Contei-lhe meus caminhos.
Ele regressava
da Bulgária, trazia
luz de roseiras vermelhas
no peito,
e contou-me as coisas,
os homens, as empresas,
o socialismo em marcha
naquela
terra eriçada, agora construtora.

Era tarde, as brasas
ardiam
na lareira de pedra.
Fora
o vento removia sussurrando
as folhas das faias.

Juntos peregrinamos,
perseguidos,
e eis que aqui a paz
nos reunia.

Tínhamos
pão,
luz,
fogo,
terra,
castelo.
Não eram só nossos,
eram de todos.

Não queríamos
falar. O vento
falava por nós.
Estendia-se
no bosque,
voava
com as folhas desprendidas.
O vento
ia ensinando,
cantando
o que nós éramos,
éramos e tínhamos.

A claridade terrestre
nos rodeava.

Solene era o silêncio.
Longos haviam sido os caminhos.

E a aurora batia as janelas
de novo
para ir conosco pelo mundo.

As Uvas e o Vento Pablo Neruda
Tradução de Carlos Nejar
L&PM Editores