Dia 15 de março comemora-se o dia do circo, comemora-se não, lembra-se. Pois não há nada a comemorar, a situação dos circos não tem a menor graça. Outra coisa que contribui para isto é a banalização da imagem do palhaço, tudo quanto é manifestação estão lá as pessoas com nariz vermelho achando que estão ofendendo alguém.

      Onde já se viu comparar um político ladrão com um palhaço? Acho de uma deselegância estas manifestações, sabe. Mas lá no fundo eu entendo estas pessoas, são adultos, e como tal, muitos não se lembram da infância. Quando se perde a capacidade de sorrir…

      Particularmente sempre achei o sorriso mais subversivo que a raiva. 

      Nesta época eu lembro quando o circo chegava na minha quebrada, era uma festa nas ruas. O Circo ficava lá na piraporinha onde hoje é o sacolão, em frente à Casa de Cultura M, boi mirim, e mais se parecia com uma nave espacial cheio de gente esquisita dentro.

      Os artistas subiam em cima do caminhão e saíam fazendo propaganda do espetáculo, e a molecada, nós, íamos atrás, tentando pegar algum bilhete para entrar de graça. O palhaço, o leão, macaco, a mulher de barba, vixe, o fascínio era tanto que estes personagens pareciam um caleidoscópio a girar diante dos nossos olhos.

      Como assistir sem dinheiro, furar a lona? Sim, muitos furavam a lona, mas eu não, consegui um emprego de vendedor de chocolate . Assistia a tudo de perto, eu e o meu irmão, nenhuma criança no mundo era mais feliz que a gente, nehuma. O riso tinha gosto de chocolate.

      O chato é que as vezes o Sidney Magal ia cantar e aquilo virava uma zona, é, antigamente, na periferia, os artistas se apresentavam em circo. Lembra de Jane e Herondi, Marcos Roberto, Odair José ? Pois é, eles também fazem parte da minha infância: "não se vá…".

      Quando a gente já caminhava nas nuvens, fomos demitidos do emprego e da alegria, não conseguíamos vender um chocolate sequer, é que a gente ficava o tempo inteiro sentado trabalhando com os olhos, para tristeza do patrão e para delírio do coração.

      Nestes dias a periferia se vestia de magia, e a gente, apesar da dureza da realidade, éramos moleques de muita sorte, era um tempo de ser beliscado pelo mais puro bálsamo da vida: a felicidade.

      Eram anos incríveis.

 

 

Sérgio Vaz é escritor (publicou Subindo a ladeira mora a noite; A margem do vento; Pensamentos vadios e A Poesia dos deuses inferiores) fundador  da Cooperifa (cooperativa cultural da periferia); Organizador do Sarau da cooperifa (movimento poético que acontece às quartas-feiras num bar da periferia); Curador do livro “O rastilho da pólvora”, antologia poética do sarau (43 poetas) parceira com Itaú Cultural. Curador do seminário “Arte na periferia” (literatura, música e cinema), parceria com Itaú cultural; Poesia contra a violência (oficinas poéticas com alunos da rede pública); Revista Literatura marginal (projeto da revista caros amigos); Participação no livro Hip Hop a lápis (curadoria do site vermelho.org); Prêmio Heróis invisíveis, concedido pelo jornalista Gilberto Dimenstein; Participação poética nos cds dos grupos Sabedoria de vida, GOG, 509-e  e grupo 2ho. E-mail: [email protected]