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    Comunicação

    Ode ao Amor

    Enches o peito de cada homem, medras Nalma de cada virgem, e toda a alma Enches de beijos de infinita calma… E o aroma dos teus beijos infinitos Entra na terra, bate nos granitos E quebra as rochas e arrebenta as pedras! És soberano! Sangras e torturas! Ora, tangendo tiorbas em volatas, Cantas a Vida […]

    Enches o peito de cada homem, medras
    Nalma de cada virgem, e toda a alma
    Enches de beijos de infinita calma…
    E o aroma dos teus beijos infinitos
    Entra na terra, bate nos granitos
    E quebra as rochas e arrebenta as pedras!

    És soberano! Sangras e torturas!
    Ora, tangendo tiorbas em volatas,
    Cantas a Vida que sangrando matas,
    Ora, clavas brandindo em seva e insana
    Fúria, lembras, Amor, a soberana
    Imagem pétrea das montanhas duras.

    Beijam-te o passo multidões escravas
    Dos Desgraçados! – Estas multidões
    Sonham pátrias doiradas de ilusões
    Entre os tórculos negros da Desgraça
    – Flores que tombam quando a neve passa
    No turbilhão das avalanches bravas!

    Tudo dominas! – Dos vergéis tranqüilos
    Aos Capitólios, e dos Capitólios
    Aos claros pulcros e brilhantes sólios
    De esplendor pulcro e de fulgências claras,
    Rendilhados de fulvas gemas raras
    E pontilhados de crisoberilos.

    Sobes ao monte onde o edelweiss pompeia
    Nalma do que subiu àquele monte!
    Mas, vezes, desces ao segredo insonte
    Do mar profundo onde a sereia canta
    E onde a Alcíone trêmula se espanta
    Ouvindo a gusla crebra da sereia!

    Rompe a manhã. Sinos além bimbalham.
    Troa o conúbio dos  amores velhos
    – As borboletas e os escaravelhos
    Beijam-se no ar… Retroa o sino. E, quietos
    Beijam-se além os silfos e os insetos
    Sob a esteira dos campos que se orvalham.

    E em tudo estruge a tua dúlia – dúlia
    Que na fibra mais forte e até na fibra
    Mais tênue, chora e se lamenta e vibra…
    E em cada peito onde um Ocaso chora
    Levanta a cruz da redenção da Aurora
    Como a Judite a redimir Betúlia!

    Bem haja, pois, esse poder terrível,
    – Essa dominação aterradora
    – Enorme força regeneradora
    Que faz dos homens um leão que dorme
    E do Amor faz uma potência enorme
    Que vela sobre os homens, impassível!

    Esta de amor ode queixosa, Irene,
    Quedo, sonhei-a, aos astros, ontem, quando
    Entre estrias de estrelas, fosforeando,
    Egrégia estavas no teu plaustro egrégio
    Mais bela do que a Virgem de Corrégio
    E os quadros divinais de Guido Reni!

    Qual um crente em asiático pagode,
    Entre timbales e anafis estrídulos,
    Cativo, beija os áureos pés dos ídolos,
    Assim, Irene, eis-me de ti cativo!
    Cativaste-me, Irene, e eis o motivo,
    Eis o motivo porque fiz esta ode.

     

    Augusto dos Anjos
    Eu e outras poesias
    Editora Civilização Brasileira – edição 1997

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