Por nós clamava a terra com som de canhão urrante.
Por nós inchavam-se os campos, embriagados de sangue.
Estamos aqui,
expulsos das entranhas da terra
pela cesariana da guerra.
Estamos glorificando
a ti,
dia
de insurreições.
de rebeliões,
de revoluções –
a ti
que passas, esmigalhando cabeças!
Do nosso segundo nascimento, o dia.
O mundo amadurece.
Acontece –
ancora um navio ao longe,
solta fumaça
e, pelo espelho d’água, foge,
por muito se respira a fumaça das lendas baças, –
era assim que a vida fugia de nós até hoje.
Para nós foi preparado
o Evangelho, o Alcorão
 “O paraíso perdido e reencontrado”,
e outros
e outros
inúmeros contos de fada.
Todos prometem a alegria do além, – inteligentes, espertos.
Aqui,
na terra querermos
viver
nem acima,
nem abaixo
de todos estes pinheiros, casas, estradas, cavalos e ervas.
Enjoaram-nos as gulodices do céu –
deixem-nos comer o pão à vontade!
Enjoaram-nos as paixões de papel! –
deixem-nos viver com mulher de verdade!
Lá,
nos vestiários dos teatros
lantejoulas, a roupa fulgura
e capas mefistofélicas,   
é tudo que se pode achar!
Empenhava-se o alfaiate velho: não para nossa cintura.
Então,
que seja desajeitada
as roupa –
mas nossa.
Agora é nosso o lugar!
Hoje,
sobre a poeira dos teatros,
irrompe nosso rasgo:
“Tudo de novo!”
Pare e fique pasmo!
Pano, povo!

 

Dispersam-se. Esgarçam o pano, borrado com as relíquias do antigo teatro.

 

Vladimir Maiakóvski – Mistério Bufo – um retrato heróico, épico e satírico da nossa época (1918)
Tradução de Dmitri Beliaev
Editora Musa – edição 2000.