Política Social e Desenvolvimento em Cuba (2000-2006)
Apesar de parecerem já superadas as concepções que privilegiavam unicamente o crescimento econômico como sinônimo de desenvolvimento e que hoje geralmente seja aceita a existência de um componente social indispensável para que se possa falar de desenvolvimento, ambos os aspectos continuam a ser tratados como elementos contrapostos, especialmente no caso dos países subdesenvolvidos. Ou, quando muito, a atenção aos temas sociais é concebida como um elemento compensatório das desigualdades gerador do modelo econômico neoliberal.
No caso de Cuba, a evolução registrada nos últimos 47 anos mostra que, em seu modelo socialista, os avanços sociais estiveram presentes de forma privilegiada, unidos a um crescimento econômico discreto – porém sustentável –, oferecendo o apoio indispensável ao processo de desenvolvimento.
Conformou-se assim um sistema de relações sociais que tem demonstrado como é possível primeiro preservar e, depois, superar as conquistas alcançadas no âmbito social, inclusive em condições de retrocesso econômico, tal como as enfrentadas durante os anos 90 do século passado.
Tais resultados se apóiam na concepção da satisfação das necessidades básicas dos cidadãos como um direito garantido na Constituição do país, ao mesmo tempo em que se desenvolvem valores humanos superiores na sociedade.
Como se afirmou: “O conceito de desenvolvimento social sobre o qual se apóia a política social cubana significa avançar de maneira simultânea na melhoria das condições de vida e de bem-estar material, na eqüidade e na transformação dos valores, nos comportamentos e nas relações sociais”(1).
O avanço social da Revolução cubana (1959-1999)
Durante os primeiros 30 anos de Revolução, os significativos avanços sociais alcançados por Cuba levaram à erradicação da pobreza no país, atingindo indicadores bastante notáveis em seu desenvolvimento, especialmente nas esferas da educação, saúde pública e emprego(2). Não obstante, essa positiva evolução foi abalada na última década do século passado. A partir de 1990, Cuba teve de enfrentar a mais profunda crise econômica de sua história. A perda abrupta e sem compensações das relações comerciais e financeiras mantidas durante 30 anos com os antigos países socialistas europeus e com a URSS, assim como o endurecimento do bloqueio econômico contra Cuba por parte dos Estados Unidos, obrigaram-na a adotar um programa econômico de emergência para enfrentar o que em Cuba é denominado como período especial. Esse programa foi colocado em prática em 1990, apoiado numa estratégia cujos objetivos fundamentais eram resistir e superar os efeitos da crise ao menor custo social possível, mantendo e aperfeiçoando o modelo socialista, enquanto se criavam as condições para a reinserção da economia cubana na economia mundial, contando com o consenso político indispensável para tanto.
O impacto da crise foi, sem dúvida, brutal. O PIB caiu 35% entre 1989 e 1993. O déficit fiscal se elevou a 33% do PIB em 1993 e as importações a preços correntes reduzidas em 75% em quatro anos(3). Para enfrentar essas difíceis circunstâncias teve início um processo de mudanças no modelo econômico que – sem renunciar a sua essência socialista –, abriria um maior espaço aos mecanismos de mercado para reativar a produção e os serviços, num processo não isento de notáveis complexidades, mas que conseguiu não retroceder nas conquistas sociais básicas alcançadas.
A crise provocou uma redução no saldo dos recursos disponíveis, produto das exportações de bens e serviços realizados pelo país, afetando os níveis de consumo e de investimento na economia, a partir de um descenso muito forte no PIB. Porém, os efeitos sobre o investimento, mas principalmente sobre o consumo, têm em Cuba limites social e politicamente infranqueáveis, razão por que se tratava de obter recursos mínimos indispensáveis para cobrir essa brecha por diferentes vias.
A forma de alcançar esse objetivo constitui também um traço singular da economia cubana nesta década. Não foram logrados esses recursos mediante a abertura da economia para as forças do mercado, nem mediante um processo de privatização da propriedade estatal, nem cerceando os próprios gastos sociais do orçamento público. Nessas condições, o processo de recuperação teve início com a luta por garantir o acesso ao máximo possível de recursos para assegurar a sobrevivência, mantendo níveis mínimos de consumo e orientando o investimento para setores que asseguravam elevados níveis de recuperação em curto prazo.
Como conseqüência das medidas adotadas, a economia freou sua queda em 1994 e manteve um crescimento que se sustenta desde 1995, apresentando uma taxa média anual de 4,8% entre 1995 e 2000, e de 7,1% entre 2000 e 2005, a preços constantes de 1997(4). Junto com a recuperação econômica produz-se uma significativa melhoria nos indicadores sociais mais importantes, que tinham sido afetados pela crise até meados da década passada(5). De tal forma, entre 1995 e 1999:
• O salário médio cresce de 194 pesos mensais para 222; a posse de divisas em mãos da população passa de 44% para 62%; enquanto o índice de desemprego baixa de 8,3% para 6,3%.
• A média de habitantes por médico se reduz de 193 para 172; a taxa de mortalidade infantil em menores de um ano baixa de 9,4 para 6,5, e o gasto do orçamento na saúde pública, em relação ao PIB, se eleva de 5,1% para 5,9% entre 1996 e 1999.
• O nível de escolarização de crianças de 0 a 5 anos aumenta de 89,5% para 98,5%; de 6 a 14 anos de 97,5% a 98,2%. Por outro lado, o nível médio de escolaridade da população passa de 8 para 9 graus (anos) de ensino e o percentual do orçamento para a educação, em relação ao PIB, aumenta de 6,1% para 7,0% entre 1996 e 1999.
• Por último, o consumo de macronutrientes cresce 18,5% em termos energéticos e 23,8% em termos protéicos.
As transformações na política social (2000-2006)
A partir de 2000 verifica-se em Cuba um desenvolvimento social ascendente, com a introdução de novos conceitos que permitiram alcançar resultados superiores em muito pouco tempo. Levando em conta que o objetivo essencial do processo de desenvolvimento no país tem sido a mais completa realização do ser humano – mediante a satisfação das necessidades materiais e espirituais da população –, junto com o desenvolvimento de elevados valores morais, como premissas de uma sociedade melhor, foram adotadas decisões no último qüinqüênio baseadas na possibilidade de aperfeiçoar a política social aplicada.
Esse novo enfoque tem se sustentado em procurar atingir o máximo de resultados com o mínimo de recursos, em conseguir um efeito concreto e direto na população em curto prazo, enquanto se dá renovada vigência aos princípios da solidariedade social e são criadas as bases estratégicas para assegurar o desenvolvimento mediante a criação do capital humano indispensável que requer a economia baseada no conhecimento. Tudo isso com um alto nível de participação de todos os cidadãos, diretamente ou por meio de organizações sociais(6). Sob tais premissas, durante os últimos seis anos a política social concentra sua atenção em temas estratégicos para o desenvolvimento do país, tanto na ordem social como econômica.
A política aplicada para se chegar a um elevado desenvolvimento parte da consideração de que em uma sociedade eqüitativa e solidária ninguém fica excluído. Todos os seus membros são capazes de desempenhar um trabalho socialmente útil, de forma a ser possível alcançar o pleno emprego, razão pela qual devem realizar-se todos os esforços para conseguir a qualificação necessária da população com vistas a assegurar seu melhor desempenho social. Nesse contexto se concebe o estudo como emprego remunerado para reciclar os membros da sociedade temporariamente sem trabalho, especialmente os da população mais jovem(7). Nesse sentido, nas decisões adotadas, joga um papel fundamental a política aplicada na educação, dirigida a oferecer os conhecimentos que sirvam de premissa para o mais alto desfrute da existência do ser humano, ao mesmo tempo em que concebe a cultura geral e integral como indispensáveis para se ter acesso à economia do conhecimento e para propiciar as mudanças estruturais necessárias para o futuro desenvolvimento econômico do país.
Um requisito básico para o desfrute de uma existência socialmente enriquecida pela educação é constituído por uma vida saudável, com vistas ao que se aplica a política apropriada com o fim de lograr um sistema de saúde pública em níveis de excelência, assim como a garantia da prática massiva do esporte. Tudo isso deve se complementar com assistência e seguridade social personalizadas para caracterizar e atender prioritariamente os grupos sociais de maior risco.
O impacto da política social na qualidade de vida da população (8)
As decisões de política social adotadas têm permitido – ainda no contexto de uma lentidão nos ritmos de crescimento econômico a partir do ano de 2000 – à sociedade cubana registrar notáveis avanços em seu desenvolvimento social, o que se expressa sinteticamente no seguinte:
• Emprego, investimentos e seguridade social
O emprego se expande nos últimos cinco anos, fazendo com que descenda a taxa de desemprego de 6,3% em 1999 para 1,9% em 2005.
Nesse sentido tem-se prestado especial atenção aos jovens desvinculados do estudo e do trabalho com a organização de Cursos de Superación Integral, onde, em 2005, 129.038 jovens receberam qualificação, elevando sua auto-estima. Esse programa tem tido grande impacto nos próprios jovens, na família e na comunidade, materializando o conceito de estudar como emprego.
Os salários médios crescem em 48,6%, enquanto o índice de preços ao consumidor cresce somente 7,3% entre 2000 e 2005.
Por outro lado, os gastos sociais básicos, financiados pelo orçamento (Educação, Saúde e Seguridade Social) duplicam entre 1999 e 2005, aumentando sua proporção em relação ao PIB de 18,2% para 28,7%.
Também tem se produzido uma transformação significativa no atendimento aos grupos sociais mais vulneráveis, com a aplicação massiva de uma assistência social personalizada através de brigadas de estudantes e da incorporação de 28.459 novos trabalhadores sociais formados em cursos intensivos planejados com esses fins. Tal esforço tem permitido a criação de condições de acesso à eqüidade e à justiça social de forma concreta, com um tratamento individualizado e dando especial atenção às crianças e aos jovens com dificuldades.
Nessa etapa foram aperfeiçoados os programas para o atendimento do adulto idoso e das pessoas com algum tipo de incapacidade, efetuando-se neste último caso um estudo que permitiu conhecer a situação pessoal de 366.864 deficientes(9).
• Educação geral e superior
Durante este período teve início o que se pode qualificar como uma revolução educacional no país. Para levar adiante essa transformação foi adotada uma série de decisões, entre as quais cabe destacar as seguintes:
• Início da reforma de escolas e do processo de formação de professores emergentes, que permitam reduzir o índice de alunos por professor a 20 no ensino primário e a 15 no ensino secundário básico.
• Modificação do sistema de ensino secundário básico, com professores integrais capazes de dominar várias disciplinas e com um ensino mais personalizado, com 96% de alunos estudando em período integral, beneficiados com uma merenda escolar de alto valor nutricional.
• Incorporação ao ensino da utilização de meios audiovisuais, o que representa o uso de 101.459 televisores e 30.331 vídeos nas salas do primário e do secundário básico, com a eletrificação total das escolas, incluindo todas as rurais.
• A introdução desses meios veio acompanhada de mudanças na programação da TV, na qual foram inaugurados canais dedicados à educação. Concomitantemente, criou-se uma programação destinada a elevar o nível de cultura geral da população, por meio de uma série de cursos transmitidos no sistema Universidade para Todos. Hoje, mais de 62% de toda a programação televisiva cumprem objetivos educacionais.
• Simultaneamente, foram introduzidos a aprendizagem e o uso da computação em todos os níveis de ensino. Foram instalados 24 mil computadores e formados 12.958 professores especializados em informática, somente no ensino primário. Adicionalmente, funcionam em torno de 600 clubes de computação em todo o país, dedicados ao ensino, especialmente de jovens e crianças. Ao anterior deve-se somar a criação da Universidade de Ciências Informáticas, onde hoje estudam aproximadamente 8 mil alunos, além de 40 mil que se formam em cursos politécnicos, como técnicos médios em computação.
• Às transformações anteriores acrescente-se a universalização do ensino universitário, com a matrícula de 510 mil estudantes, atendidos por 122 mil professores, apoiada com a abertura de turmas em um grupo importante de carreiras em nível de cada município do país, que contam com 3.150 sedes universitárias e com o desenvolvimento da educação à distância.
• Produto do trabalho desenvolvido durante mais de 45 anos e das decisões mais recentes, são apreciados avanços notáveis na qualidade da educação. Assim, eleva-se a escolaridade média da população para 9,5 graus (anos) de ensino, sendo 59,8% com nível médio superior e 7,4% com graduação universitária terminados. Ao mesmo tempo, registra-se a taxa de analfabetismo de 0,2%.
• Quanto à qualidade do ensino primário, Cuba obteve os melhores resultados na região, de acordo com um estudo realizado pelo Laboratorio Latinoamericano de Evaluación de la Calidad de la Educación, coordenado pela Unesco(10). Hoje as crianças aprendem 2,2 vezes mais em Matemática e 1,5 vezes mais em Espanhol do que há quatro anos.
• Cultura geral e integral
Junto com as transformações educacionais, a elevação do nível cultural da população também foi um traço definitivo da evolução social dos últimos três anos.
As ações promovidas nesse período mostram igualmente o início de profundas mudanças que podem resumir-se no seguinte:
• O desenvolvimento do ensino artístico recebe um forte impulso com a criação de 15 escolas de instrutores de arte – uma por província –, onde hoje estudam 15.707 alunos. Isto permitirá contar nos próximos anos com o pessoal necessário para o ensino artístico em todo o sistema educacional e para a gestão cultural comunitária.
• Em todo o país, foram construídas sete novas escolas de artes plásticas, às quais se unem escolas de balé e de outras manifestações culturais.
• Prossegue a reforma de casas de cultura e teatros emblemáticos das diferentes províncias.
• Há 352 videoclubes juvenis e 1.918 salas rurais de TV em zonas intrincadas.
• Fortalece-se o trabalho editorial, com a publicação de milhares de livros a baixo custo, colocados ao alcance da população em bibliotecas e escolas, e mediante a venda de Bibliotecas Familiares. Ao mesmo tempo, se consolida como um acontecimento cultural em cada ano a Feira do Livro, que se celebrou em 2005 em 35 cidades do país, com mais de 9,5 milhões de participantes.
• Saúde Pública
A partir dos avanços já alcançados no fim da década passada, requer-se atingir um nível de excelência nos serviços de saúde para a população, mediante um desenvolvimento superior da promoção de saúde, da prevenção de enfermidades, assim como das ações de recuperação e reabilitação. Entre as decisões mais significativas adotadas já desde 2000, encontram-se as seguintes:
• Desenvolvimento do Programa Nacional de Saúde e Qualidade de Vida, destinado a obter mudanças nas atividades e hábitos da população que reduzam os fatores de risco, para incidir na diminuição das principais enfermidades crônicas não transmissíveis e outras afecções, assim como para alcançar estilos de vida mais saudáveis.
• Trabalho de complementação da assistência médica à população, com mais de 71 mil médicos, um para cada 161 habitantes(11), incrementando o nível de resolutividade do médico de família e dos centros policlínicos, para os quais se executa um programa de reparação e equipamento que permita elevar sua qualidade. Também foram habilitadas 118 salas de terapia intensiva em policlínicos onde não existem hospitais, cobrindo todos os municípios do país. Igualmente foram habilitadas 452 salas de reabilitação nos centros policlínicos, 24 novos serviços de hemodiálise e 88 óticas. Paralelamente serão investidos mais de US$ 400 milhões em equipamentos de alta tecnologia em um programa de reabilitação de 61 hospitais hoje sendo modernizados.
• Avanço no programa de produção nacional de medicamentos, com vistas a alcançar em breve 100% de satisfação das necessidades da população, enquanto se concebem as farmácias como centros assistenciais, formando parte do sistema de saúde do país.
• A partir dos esforços realizados durante mais de 45 anos e dos passos dados mais recentemente, verificam-se avanços importantes nos indicadores de saúde.
• De tal forma, reduz-se a quantidade de habitantes por médico de 171, em 1999, para 161 em 2005; a taxa de mortalidade infantil em menores de um ano baixou de 6,5 por mil nascidos vivos para 6,2; a expectativa de vida ao nascer se elevou de 76,15 anos para 77,0; e o índice de infecção por Aids é um dos mais baixos do mundo.
• O alcançado por Cuba no âmbito do desenvolvimento social nos últimos três anos demonstra – apesar de um descenso nos ritmos de crescimento econômico – ser possível concentrar e designar os recursos para se obter importantes resultados a um baixo custo, desde que haja estrutura social e vontade política que o possibilite.
O capital humano criado em Cuba e seu impacto no desenvolvimento (12)
A política social adotada por Cuba tem dado como resultado a criação de um significativo estoque de capital humano que se manifesta nos elevados níveis de educação média da população, nos anos de expectativa de vida alcançados, nos níveis de cobertura da seguridade e assistência social obtidos, na cultura geral e integral de que usufrui a sua população e, especialmente, seu segmento mais jovem.
Se nos valemos de indicadores técnico-científicos específicos, que expressem com maior nitidez o grau em que um capital humano se concentra como fator dinamizante do processo de desenvolvimento, os resultados são também relevantes.
Primeiro chama a atenção o fato de alguns indicadores não revelarem o potencial disponível em toda a sua magnitude, caso não se considere seu desempenho em uma sociedade com um elevado nível de socialização no emprego de seus recursos materiais e humanos.
Assim, os usuários de Internet são apenas 9 por mil habitantes, o gasto em investigação-desenvolvimento (I-D) é de 0,8% do PIB e existem 538 investigadores em I-D por milhão de habitantes.
Não obstante, o acesso à Internet se multiplica na mesma medida em que os computadores não são majoritariamente para uso exclusivamente pessoal, mas instalados e utilizados intensivamente por amplas camadas da população. Por outro lado, a concentração e centralização dos recursos permitem elevar significativamente seu impacto em investigadores que trabalham coordenadamente e não competem entre si (13). Além do mais, a participação no processo de I-D não é privativa de cientistas profissionais, pois 155 de cada mil habitantes tomam parte em trabalhos científicos e de inovação tecnológica por meio de organizações sociais e eventos massivos(14). Em geral, se reconhece no caso de Cuba um elevado índice de criação de capacidades em ciência e tecnologia (0,11), enquanto se registra uma elevada eficiência relativa do recurso econômico no desenvolvimento humano.
No caso de Cuba, o conceito de capital humano tem uma conotação econômica, mas também um elevado conteúdo social.
A respeito disso, assim assinalou o comandante-em-chefe Fidel Castro: “Capital humano implica não somente conhecimento, mas também consciência, ética, solidariedade, sentimentos, heroísmo e a capacidade de fazer muito com muito pouco”(15). Não é casual, portanto, a expressão de maior significado do capital humano em Cuba estar associada aos serviços médicos de alta qualidade e ao desenvolvimento da biotecnologia no país.
Hoje existe um Pólo Científico de Biotecnologia formado por 15 centros de investigação e empresas com mais de 2.400 cientistas e engenheiros, que produzem biofármacos, vacinas e medicamentos genéricos avançados, cuja exportação em 2005 duplicou os níveis do ano precedente e trabalha com empresas de mais de 40 países, incluindo empresas mistas na China e em outros Estados. Tornam-se relevantes, entre suas produções, a vacina contra a hepatite B, a estreptoquinasa recombinante, a vacina antimeningocócica, além de vacinas contra o câncer, produzidas inclusive em associação com empresas norte-americanas como a Cancervax.
Por outro lado, a partir da modificação do ensino de computação, centros como a Universidad de Ciencias Informáticas produzem softwares de alto valor a ritmos acelerados.
No caso de Cuba, manifesta-se assim uma sólida tendência que vai dando origem a um novo setor de produção e serviços, baseado na investigação científica e no desenvolvimento de alta tecnologia.
O impacto do desenvolvimento social cubano na colaboração internacional(16)
Um aspecto a destacar no desenvolvimento social cubano é seus frutos terem sido compartilhados ao longo de 47 anos com os povos de Ásia, África, América Latina, Caribe, e inclusive Oceania – na maioria dos casos, de forma gratuita.
De tal modo, entre 1963 e 2004, 223.280 cubanos desenvolveram relações de colaboração com povos do terceiro mundo em 155 países.
Em 2004 mais de 35.724 compatriotas realizavam atividades de cooperação em aproximadamente 109 países, dentre os quais, 23.896 eram trabalhadores da saúde, atuando em 70 nações diferentes.
Entre os projetos de maior significação, encontra-se o Programa Integral de Saúde, iniciado em 1998, que se desenvolve em 28 países da América Latina, Caribe, África e Ásia.
Também teve enorme repercussão o programa para atender afecções da vista, mediante o qual, começando pela Venezuela, foram operados em Cuba até o final de 2005, 172.316 pacientes de diferentes países da América Latina e Caribe, de forma gratuita, dando origem à Operación Milagro, que deve crescer este ano.
Igualmente, em 2005 foi criado o Destacamento Henry Reeve, integrado por milhares de médicos, técnicos e especialistas que têm como missão assistir a outros povos, em caso de graves desastres naturais ou epidemias.
Durante o ano passado, esse Departamento ofereceu ajuda gratuita à Guatemala, com mais de 600 médicos, durante três meses, em razão dos danos causados pelo furacão Stan; encontra-se dando apoio com mais de 2.300 médicos e outros técnicos ao povo do Paquistão, devastado por um terremoto; e ofereceu ajuda de mais de 1.500 profissionais para atender às vítimas do furacão Katrina, nos Estados Unidos – oferta humanitária rechaçada pelo insensível governo desse país.
Desempenhou também um relevante papel a formação de profissionais em Cuba, onde no ano passado estudavam gratuitamente 15.527 bolsistas de todas as regiões do mundo.
Merece especial destaque a formação de médicos na Escuela Latinoamericana de Medicina, criada em 1998, onde se formam 8.927 estudantes de 27 países, e que já efetuou a sua primeira graduação.
O programa de formação de pessoal médico para América Latina e Caribe amplia-se notavelmente durante o presente ano.
Outras esferas destacadas na colaboração oferecida gratuitamente durante 2005 foram o esporte, com 3.235 colaboradores em oito países da América Latina e África, assim como a educação, onde 513 colaboradores trabalham em 16 países, também da América Latina e África.
As possibilidades de ajuda atualmente oferecidas por Cuba a outros povos não têm paralelo no mundo de hoje e podemos afirmar – sem medo de equivocar-nos – que somente nosso país dispõe de capital humano e sentido de solidariedade social indispensáveis para poder fazê-lo.
A medição do impacto do desenvolvimento social cubano através do PIB
A medição do desenvolvimento social expresso através do PIB, mediante a contribuição dos serviços sociais básicos a esse desenvolvimento, apresenta importantes insuficiências, especialmente no caso de Cuba, onde esses serviços são oferecidos de forma gratuita, dentro e fora do país.
Os serviços sociais gratuitos apresentam duas características distintas: são bens não transacionáveis e não têm preço de mercado. Devido a isso a contribuição dos serviços sociais gratuitos ao PIB mede-se pelo valor agregado somente em termos do gasto e não pelo valor real do serviço prestado.
Há três críticas principais que podem ser feitas a este método:
• Ao não existir uma tarifa internacional reconhecida, o valor dos serviços não transacionáveis é determinado fundamentalmente pelo nível geral do em cada país. Deste modo, um mesmo serviço será valorizado em um país rico em uma proporção várias vezes superior ao considerado para um país pobre. • Os serviços públicos são subestimados em relação aos privados, já que em relação a estes últimos é considerada uma taxa de rentabilidade.
• Valorar pelo gasto é contrário à teoria moderna – sustentada em numerosos estudos – que aceita os gastos em educação e saúde incrementarem o capital humano e manterem um efeito sobre o crescimento econômico.
Adicionalmente, deve-se destacar que o sistema de Contas Nacionais das Nações Unidas está fortemente orientado para a contabilização de atividades de caráter mercantil. Assim, observa-se que quanto maior o grau de mercantilização de uma economia maior o valor contabilizado e vice-versa(17) .
De tal modo, pode-se afirmar que a metodologia atual para a medição dos serviços sociais tem importantes insuficiências que, no caso de Cuba, limitam sua utilização na medição da contribuição destas atividades para a economia e, em especial, em relação a sua contribuição ao desenvolvimento econômico, razão pela qual torna-se necessário elaborar uma metodologia que permita corrigir tais insuficiências(18).
Não obstante, não se parte do zero nesse sentido, pois existem experiências sobre a aplicação de tarifas aos serviços públicos de saúde na Europa, assim como para o aluguel imputado à moradia, que permitem avançar na mesma direção em que Cuba tem trabalhado o valor agregado pelos serviços sociais para o cálculo do PIB nos últimos dois anos(19) .
Este trabalho se inscreve, além disso, no processo de aperfeiçoamento do Sistema de Contas Nacionais das Nações Unidas, conforme pôde ser apreciado recentemente(20).
A vitalidade do modelo de desenvolvimento socialista cubano mostra como é possível obter um desenvolvimento social significativo, ao mesmo tempo em que se transforma a estrutura produtiva para sustentá-lo, ainda que em meio à hostilidade e ao bloqueio dos Estados Unidos contra Cuba, que tem custado mais de US$ 81 bilhões e penalidades incalculáveis para o nosso povo.
O que foi alcançado cria as bases que garantem o avanço da nação cubana, mas também a oportunidade de oferecer uma contribuição significativa a outros povos, especialmente da América Latina e Caribe, com a convicção de que um mundo melhor é possível.
Dr. José Luis Rodríguez García é Ministro de Economia e Planejamento e Vice-Presidente do Conselho de Ministros. Indicadores sociais selecionados (1959-2005). Traduzido por Eugênio Rezende de Carvalho.
Notas
(1) ÁLVAREZ, E.; MATTAR, J. (comp.). “Política social y reformas estructurales: Cuba a principios del siglo XXI”. México: CEPAL, INIE, PNUD, LC/MexlG.7, LC/lL.2091, abril-2004, p 57.
(2) Ver quadro com indicadores estatísticos em anexo. A respeito, de forma mais ampliada, ver também os artigos RODRÍGUEZ, J. L. “El desarrollo económico y social en Cuba resultados de 30 años de Revolución”. Revista Cuba Socialista, n. 39, La Habana, mayo-junio 1989; e RODRÍGUEZ, J. L.; CARRIAZO, G. “Erradicación de la pobreza en Cuba”. La Habana: Ciencias Sociales, 1987.
(3) Ver RODRÍGUEZ, J. L. “Cuba. El camino de la recuperación económica 1995-1999”. Revista Cuba Socialista, La Habana, n. 16, 1999. A fonte dos dados não citada expressamente no trabalho provém de cálculos do autor baseados em informações da Oficina Nacional de Estadísticas, do Banco Central de Cuba e do Ministerio de Economía y Planificación.
(4) A partir das mudanças na metodologia de cálculo do PIB introduzidas desde 2004, requer-se um ajuste em toda a série que permita torná-la comparável para todo o período, tarefa em processo atualmente.
(5) Ver além da obra citada de ALVAREZ, E; MATTAR J., FERRIOL, A.; GONZÁLEZ, A.; QUINTANA, D.; PÉREZ, V. “Cuba: Crisis ajuste y situación social 1990 – 1996”. La Habana: Ciencias Sociales, 1998; e de CIEM/PNUD. “lnvestigación sobre desarrollo humano y equidad en Cuba 1999”. La Habana: Caguayo S.A., 2000.
(6) Para uma análise dos princípios desta política, ver CASTRO, F. “VIII Congreso de la UJC. Discurso de Clausura pronunciado por el Comandante en Jefe Fidel Castro Ruiz”. La Habana: Oficina de Publicaciones del Consejo de Estado, 2004.
(7) Numa sociedade na qual os serviços sociais básicos são oferecidos de forma gratuita, os gastos marginais para custear os estudos de um desempregado são mínimos.
(8) Ver quadro com indicadores estatísticos em anexo, bem como o trabalho de RODRÍGUEZ, J. L. “Informe sobre los resultados económicos del 2002 y el Plan Económico y Social para el año 2003”. INIE-CEPAL, além dos correspondentes aos anos de 2004 e 2005 no Jornal Granma (23.12.2002, 24.12.2004 e 23.12.2005).
(9) Ver a obra coletiva “Por la Vida” La Habana: Casa Editorial Abril, 2003. Basta dizer que 6.052 mães recebem um salário para o atendimento a seus filhos que sofrem de alguma grande incapacidade.
(10) Ver UNESCO. “Primer Estudio Internacional comparativo sobre lenguaje, matemática y factores asociados en tercero y cuarto grado”. Santiago de Chile, 2000.
(11) Estima-se que este índice seja classificado como primeiro lugar no mundo.
(12) Ver PNUD CIEM “Investigación sobre ciencia, tecnología y desarrollo humano en Cuba 2003”. La Habana: 2004; ONE. “Elementos sobre el capital humano. Definiciones, conceptos e indicadores”. La Habana, abril de 2003; OECD. “The knowledge-based. economy”. OCDE/ED (96)102, Paris, 1996; MORALES, A. “Como alcanzar el alto desempeño del capital humano en las entidades” e “Trabajo, capital humano y conciencia”. Revista Gaceta Laboral, La Habana, n. 11, 2005; PNUD. “Informe sobre Desarrollo Humano”. 2005. Nova Iorque, 2005, p. 243 e 286-289. (13) Ver LAGE, A. “La Economía del conocimiento y el socialismo”. Revista Cuba Socialista, La Habana, n. 30, 2004.
(14) Nisso jogam um importante papel as Brigadas Técnicas Juveniles, a Asociación Nacional de Inventores y Racionalizadores e o Forum Nacional de Ciencia y Técnica.
(15) Ver Revista Gaceta Laboral, ed. Cit. (discurso de 20 de agosto de 2005), p. 33.
(16) Ver “Objetivos de desarrollo del milenio Cuba. Segundo Informe”, julio-2005, p. 78-80; e cálculos do autor.
(17) Ver Manual del Sistema de Cuentas Nacionales. Tercera Revisión. Oficina de Estadísticas de Naciones Unidas, 1993.
(18) Ver ONE. “Perfeccionamiento de la medición del calculo de los servicios sociales en el Producto Interno Bruto”. Novembro de 2005.
(19) Ver Report on the task forces FOR ESA 95 Handbook Delimitation of general government Eurostat. BIICN. 390 C, Luxemburg, 1998, p. 8; e Sistema Europeo de Cuentas. SEC 95, p. 95.
(20) Ver CD Room Paper. ONE. Observaciones al Grupo Asesor de Expertos que participa en la actualización de la Revisión I del SCN 93 (Servicios Sociales del Gobierno), março de 2006.
Indicadores sociais selecionados (1959-2005)
ÁREAS 1959 1989 1999 2005
Emprego e investimentos
Salário médio mensal nominal (pesos) 129 (d) 188 222 330
Taxa de desemprego (%) 18,2 5.5 6.3 1.9(h)
Produtividade do trabalho (pesos) 1 739 4320 5 998 9 758
Educação
Escolarização em % (a) 55.1 98.61 97.77 99.35
Nível Primário 40.8 69 74.93 86.17
Nível Secundário 6.8 15.4 11.2 50.0(h)
Nível Terciário 3.1 6.4 … 8.8
Graus de escolaridade média da população (6 anos e mais) (b) … … 9.0 9.5
Graus de escolaridade média da população CPV (15 anos e mais
Taxa de analfabetismo (b) 23.6 3.8 … 0.2
Pessoal docente por mil habitantes (U) 3.27 22.7 17.6 22.6
% do orçamento educacional em relação ao PIB 2.8 8.6 7.0 9.3
Saúde
Expectativa de vida ao nascer (anos) 62,29(e) 74.75 76.15 77.00
Habitantes por médico (U) 1076 303 171 161(9)
Taxa de mortalidade infantil (por mil nascidos vivos) 60.0 11.1 6.5 6.2
Taxa de mortalidade infantil em menores de 5 anos (por mil nascidos vivos) 48.2(d) 13.6 8.4 8.0
Taxa de mortalidade materna (por 100 000 nascidos viv 125.3(e) 37.9 43.8 52.3
Nutrientes diários (c)
Quilocalorias 2410 2845 2429 3356
Proteínas 57.8 76.5 64.9 88.0
% do orçamento de saúde em relação ao PIB 0.7 4.7 5.9 5.7
Seguridade e assistência social
Aposentados e pensionistas da seguridade social (milhares) 154.0 1 100.0 1 326.0 1 538,4
Pensão média (pesos) 71.94 83.69 103.05 183.7
Beneficiários de assistência social (U) 127332 193724 535 134
Assistência social média (pesos) … 53.41 54.23 131 .00
Relação entre a pensão média e o salário médio 0.54(f) 0.45 0.46 0.56
% do PIB da seguridade social 0.3 5.7 6.8 6.3
OFICINA NACIONAL DE ESTADÍSTICAS. Indicadores seleccionados 1950-2000. La Habana: 2002. RODRÍGUEZ, J. L. “El desarrollo económico y social en Cuba: Resultados de 30 años de revolución”. Revista Cuba Socialista, La Habana, n. 39, maio-jun/1989. Para o ano de 2005, cálculos da Oficina Nacional de Estadística e do Ministerio de Economía y Planificación.
Notas – Indicadores:
(a) Os dados de 1959 correspondem ao censo de 1953.
(b) Corresponde aos censos de 1953, 1981 e 2002, respectivamente.
(c) Refere-se ao consumo aparente. Os dados que aparecem no ano de 1959 correspondem a 1962.
(d) Refere-se ao ano de 1962.
(e) Refere-se a 1952-1954.
(f) Refere-se ao ano de 1965.
(g) Refere-se ao ano de 2004.
(h) Cifras preliminares
EDIÇÃO 92, OUT/NOV, 2007, PÁGINAS 78, 79, 80, 81, 82, 83, 84, 85