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    Comunicação

    A Guerra em Leningrado

    (fragmento)   … O canhoneio calou-se. A cidade esta cheia de alvorada, é a hora da troca das exaustas sentinelas, as ruas estão claras e desertas. As zeladoras varrem os cacos de vidro, um incansável eco repete um som estridente, raspante, angustiante e arco-íris derramam-se pela sarjeta com os pedaços de vidro esmigalhado. À cidade […]

    POR: Olga Fiódorovna Bierggólts

    6 min de leitura

    (fragmento)

     

    … O canhoneio calou-se.
    A cidade esta cheia de alvorada,
    é a hora da troca das exaustas sentinelas,
    as ruas estão claras e desertas.
    As zeladoras varrem os cacos de vidro,
    um incansável eco repete
    um som estridente, raspante, angustiante
    e arco-íris derramam-se pela sarjeta
    com os pedaços de vidro esmigalhado.
    À cidade chegou a primavera,
    isso se sente nos destroços, no incêndio,
    no rio que vem bater no granito de suas margens
    como vem fazendo há séculos,
                                                       Silêncio.
    …Moçinha lá dos lados de Mamisson,
    que sabias da felicidade?
                                             Ela é
    desajeitada, tem a cara fechada, sofre de insônia
    e, ás vezes anda de braço dado com a morte.
    Perto dela, a alegria não é nada,
                                                    o contentamento é apenas pó.
    Diante dela o inimigo perde seu poder,
                                                                o medo também
                                                                                          e a podridão
    Ela voa, com asas de cisne,
    para cimos de tal modo inacessíveis,
    de tal modo solitários e despojados,
    que até os deuses podem inveja-la.
    (…)
    Estou feliz.
    E a cada dia percebo, com mais clareza,
    que vivi toda minha vida para chegar estes dias
    de impiedosa expansão.
    E não escondo o meu orgulho
    em ter, como mero soldado, entrado em teu destino,
    minha cidade,
                        e no rol de teus poetas.
    Não foste tu,
                       neste inverno biblicamente terrível,
    que me levaste até a trincheira onde meus irmãos combatem,
    petrificados, sem pranto,
    e lá deste-me a ordem de prantear teus filhos?
    e onde não pudeste erguer monumentos
    nem contar ou celebrar os mortos,
    lá onde se estendia a neve, esbraseada pelo clarão do incêndio,
    onde a escavadeira mal conseguia abrir as trincheiras,
    onde a dinamite em vão tentava ajudar-nos
    a abrir a terra, a alojar os túmulos,
    foi lá que obedeci à tua altiva ordem…
    E carregando o feixe de minha dura escolha,
    do fundo de mim mesma arranquei o poema
    sem poupar sua trama de ser vivo.

    A ordem de meu destino delineia-se claramente:
    com meus versos, eis-me muitos anos à frente,
    pregada à tua visão, conquistada, congelada
    neste gelo inimitável.

    … Quanto a ti, de quem devo, sem cessar,
    ter piedade, por que devo entristece-me,
                                                                   lamentar-te?
    Eu quero é celebrar-te com glória anônima
    e muda –
                    a mais alta glória que existe nesta terra – ;
    para sempre eis-te confundido
    com tudo aquilo que era maior do que a nossa própria vida,
    o sonho,
                a alma,
                           a pátria,
                                        a existência
    e, para mim, cada lugar tornou-se o local do teu túmulo,
    e em toda parte esta a tua ressurreição.

    É o que afirma a voz sonora de Moscou
    quando, abalando em todas as cúpulas da noite,
    ela canta com a mesma força os vivos e os mortos
    e, para a Morte, prevê
                                       a pena de morte.

     

    Poesia Soviética
    Seleção ,tradução e notas de Lauro Machado Coelho
    Editora Algol