Quem há de gabar a lagoa se não o sapo?
Das ilhas filhas da pororoca
falamos nós que é nossa sorte
Ser morador e filhos do extremo-norte
A vila “Cá te espero”, alto Anajás
Entrou no noticiário nacional
Pra você ver!
Deu furo de TV na BBC.

Araruta teve seu dia de mingau
O povo Anajá e Aruã,
Filhos da luta dos Nheegaíbas
Quando se mexem são 'atentados'
Que nem formigas
Quando boi pisa no formigueiro.

Os Furos de Breves já podem se gabar
Em ser a primeira região marajoara
A receber em festa popular
O primeiro Presidente eleito
Pela gente brasileira pra governar
O país descoberto por Cabral.

Poema internacional não rima com a mina
Da pobreza paroquial do verso caboco
Os idiotas da objetividade não sabem
Que a gente sabe que eles
Lá na cidade rica de marquetingue
Nada entendem da nossa varja
A nossa identidade na lama sem fama
Os caras deitam odes a primeiromundos
E fundos
Da nossa varja entendemos nós.

Várzea ou varja em bom português
Pra ficar freguês da velha lusofonia
Que nem canua que vem
Do aruaque canuá pelo nheengatu
Não através do castelhano canoa
Os donos da gramática ladina
Sumano, senhor meu mano
Metem à força nota zero na escola
Dada como esmola
Falando eles anglobrazilian pra inglês ver.

Que pena, morena
Que o Lula lá não haja tempo
De ser o nosso Lulá cá na varja
Vir de tão longe
Por tão longa espera
E quando acaba
Mingau de bacaca…
Lá pegaram o homem e levaram embora
Antes das águas quebrar
E escutar o canto da saracura.

Ara veja! Deixa de frescura, te digo, morena
Pela fé da Mucura:
Se eu pudesse e meu dinheiro désse
Eu zinho e os caruanas do pajé
Não deixávamos o Lula
Ir naquela hora
Sem ao menos tomar chibé
Espiar o “clímax igapóreo” do planeta
Conhecer o Braço Esquerdo do Mapuá
Ali plantar na Resex
Com o derradeiro Índio marajoara do PT
Projeto de reserva da biosfera
Bem verdinha e amarela
Pra todo mundo ver.

Diacho! Os homens do Presidente
Não sabem que a gente sabe
Que eles não sabem…

Que pressa é essa? esta gente!
Deixassem o Presidente
Esquentar o banco e espiar o sítio
Tomar açaí
Esticar mais dois dedos de prosa
Tirar sesta na rede, tomar banho na maré
Na beira do igarapé.
Pois vamos convidar o Presidente Hugo Chávez
A vir tomar banho de chuva
Curar aquela cuíra toda
Chamar o sr. Bush filho para o papo
Passear montado em búfalo
A filosofia do bicho ensina ao homem
Que força com força não resolve…
Aprender a andar na boa, de remo e canoa
Assim a paz com a justiça ficará mais bonita
No seio da maré.
Se o Lula voltar sem pressa
Conversa de compadres não vai faltar
O staff que não se estafe mais
Espere sentadinho até o galo cantar.

Noves fora a pressa da viagem
O Presidente deu animo novo à gente
E recado bem dado
Que vale pra meio mundo sair do buraco
das doces ilusões minerais da Vale
Pra gente ainda não valeu um tostão
O leilão das minas
Pra gente ter muito cuidado
Com papel que a União nos deu
O título bonito de uso perpétuo
Da nossa terra usurpada um dia
Pra ser ela do senhor da capitania
da Ilha Grande diz-que de Joannes
Um tal senhor Antônio de Sousa de Macedo
Secretário d'El-Rei ou Sancho Pança
Da ilha Barataria, trisavô dos barões
De Joannes e da privatização vulgo “seis Marias”
O barão remoto ninguém viu mais cedo
Ou mais tarde nestas bandas
Doidas por estropício de hidrovia
Olho gordo nas serrarias do linhão
Taradão das balsas da zona franca.

O Lula veio aqui desatar o nó
Antigamente dado no velho Marajó
Pena que o Presidente
Não tivesse tempo de ficar pra novena
Morena
Escutar aquele caso do cacique Piié
O índio mais sabido destas paragens
Rei dos Mapuá sem eira nem beira
Que deu lição ao padre Vieira.

Foi ele entre os Sete Caciques
Nheengaíbas que mudou a história
Da guerra sem pé nem cabeça
Disse sim à chance da Paz nas ilhas
Deu passagem a Portugal
Na conquista do rio das amazonas
Que findou na proclamação de Muaná
A ser este mundão de Brasil zil, zil…
Nas vozes da varja.

Os caras não sabem deste Brasil aqui
Onde a saracura canta e uirapuru faz dó
De peito sem defeito na ópera seringueira
Que mostra a cara da Amazônia ribeirinha
Neste imenso Marajó
Que recobra a memória de dois mil anos
Da gente brasileira por conta própria.

A varja é nossa, deixa de bandalheira
A primeira cultura superior brasileira
Nasceu nesta ilhas filhas da Cobragrande
Tu tá sabendo, morena?
Ah, que pena, deixaram Lula ir embora
Sem saber desta história perdida
Entre árvores e chuvas.

Fica pra próxima, tá combinado?
Sem afobação, meu irmão: o zen bubuia
Farinha no prato e peixe na cuia, aleluia!

 

 

José Varella – Belém-PA, academia do peixe-frito
7 de dezembro de 2007.