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    Comunicação

    Nossa várzea, nossa identidade

    Quem há de gabar a lagoa se não o sapo? Das ilhas filhas da pororoca falamos nós que é nossa sorte Ser morador e filhos do extremo-norte A vila “Cá te espero”, alto Anajás Entrou no noticiário nacional Pra você ver! Deu furo de TV na BBC. Araruta teve seu dia de mingau O povo […]

    POR: José Varella

    6 min de leitura

    Quem há de gabar a lagoa se não o sapo?
    Das ilhas filhas da pororoca
    falamos nós que é nossa sorte
    Ser morador e filhos do extremo-norte
    A vila “Cá te espero”, alto Anajás
    Entrou no noticiário nacional
    Pra você ver!
    Deu furo de TV na BBC.

    Araruta teve seu dia de mingau
    O povo Anajá e Aruã,
    Filhos da luta dos Nheegaíbas
    Quando se mexem são 'atentados'
    Que nem formigas
    Quando boi pisa no formigueiro.

    Os Furos de Breves já podem se gabar
    Em ser a primeira região marajoara
    A receber em festa popular
    O primeiro Presidente eleito
    Pela gente brasileira pra governar
    O país descoberto por Cabral.

    Poema internacional não rima com a mina
    Da pobreza paroquial do verso caboco
    Os idiotas da objetividade não sabem
    Que a gente sabe que eles
    Lá na cidade rica de marquetingue
    Nada entendem da nossa varja
    A nossa identidade na lama sem fama
    Os caras deitam odes a primeiromundos
    E fundos
    Da nossa varja entendemos nós.

    Várzea ou varja em bom português
    Pra ficar freguês da velha lusofonia
    Que nem canua que vem
    Do aruaque canuá pelo nheengatu
    Não através do castelhano canoa
    Os donos da gramática ladina
    Sumano, senhor meu mano
    Metem à força nota zero na escola
    Dada como esmola
    Falando eles anglobrazilian pra inglês ver.

    Que pena, morena
    Que o Lula lá não haja tempo
    De ser o nosso Lulá cá na varja
    Vir de tão longe
    Por tão longa espera
    E quando acaba
    Mingau de bacaca…
    Lá pegaram o homem e levaram embora
    Antes das águas quebrar
    E escutar o canto da saracura.

    Ara veja! Deixa de frescura, te digo, morena
    Pela fé da Mucura:
    Se eu pudesse e meu dinheiro désse
    Eu zinho e os caruanas do pajé
    Não deixávamos o Lula
    Ir naquela hora
    Sem ao menos tomar chibé
    Espiar o “clímax igapóreo” do planeta
    Conhecer o Braço Esquerdo do Mapuá
    Ali plantar na Resex
    Com o derradeiro Índio marajoara do PT
    Projeto de reserva da biosfera
    Bem verdinha e amarela
    Pra todo mundo ver.

    Diacho! Os homens do Presidente
    Não sabem que a gente sabe
    Que eles não sabem…

    Que pressa é essa? esta gente!
    Deixassem o Presidente
    Esquentar o banco e espiar o sítio
    Tomar açaí
    Esticar mais dois dedos de prosa
    Tirar sesta na rede, tomar banho na maré
    Na beira do igarapé.
    Pois vamos convidar o Presidente Hugo Chávez
    A vir tomar banho de chuva
    Curar aquela cuíra toda
    Chamar o sr. Bush filho para o papo
    Passear montado em búfalo
    A filosofia do bicho ensina ao homem
    Que força com força não resolve…
    Aprender a andar na boa, de remo e canoa
    Assim a paz com a justiça ficará mais bonita
    No seio da maré.
    Se o Lula voltar sem pressa
    Conversa de compadres não vai faltar
    O staff que não se estafe mais
    Espere sentadinho até o galo cantar.

    Noves fora a pressa da viagem
    O Presidente deu animo novo à gente
    E recado bem dado
    Que vale pra meio mundo sair do buraco
    das doces ilusões minerais da Vale
    Pra gente ainda não valeu um tostão
    O leilão das minas
    Pra gente ter muito cuidado
    Com papel que a União nos deu
    O título bonito de uso perpétuo
    Da nossa terra usurpada um dia
    Pra ser ela do senhor da capitania
    da Ilha Grande diz-que de Joannes
    Um tal senhor Antônio de Sousa de Macedo
    Secretário d'El-Rei ou Sancho Pança
    Da ilha Barataria, trisavô dos barões
    De Joannes e da privatização vulgo “seis Marias”
    O barão remoto ninguém viu mais cedo
    Ou mais tarde nestas bandas
    Doidas por estropício de hidrovia
    Olho gordo nas serrarias do linhão
    Taradão das balsas da zona franca.

    O Lula veio aqui desatar o nó
    Antigamente dado no velho Marajó
    Pena que o Presidente
    Não tivesse tempo de ficar pra novena
    Morena
    Escutar aquele caso do cacique Piié
    O índio mais sabido destas paragens
    Rei dos Mapuá sem eira nem beira
    Que deu lição ao padre Vieira.

    Foi ele entre os Sete Caciques
    Nheengaíbas que mudou a história
    Da guerra sem pé nem cabeça
    Disse sim à chance da Paz nas ilhas
    Deu passagem a Portugal
    Na conquista do rio das amazonas
    Que findou na proclamação de Muaná
    A ser este mundão de Brasil zil, zil…
    Nas vozes da varja.

    Os caras não sabem deste Brasil aqui
    Onde a saracura canta e uirapuru faz dó
    De peito sem defeito na ópera seringueira
    Que mostra a cara da Amazônia ribeirinha
    Neste imenso Marajó
    Que recobra a memória de dois mil anos
    Da gente brasileira por conta própria.

    A varja é nossa, deixa de bandalheira
    A primeira cultura superior brasileira
    Nasceu nesta ilhas filhas da Cobragrande
    Tu tá sabendo, morena?
    Ah, que pena, deixaram Lula ir embora
    Sem saber desta história perdida
    Entre árvores e chuvas.

    Fica pra próxima, tá combinado?
    Sem afobação, meu irmão: o zen bubuia
    Farinha no prato e peixe na cuia, aleluia!

     

     

    José Varella – Belém-PA, academia do peixe-frito
    7 de dezembro de 2007.