Notas teóricas em torno das crises financeiras
A tempestade econômica que se espraia dos Estados Unidos, desde agosto de 2007, demanda reflexões acerca dos mecanismos das crises financeiras. A crise, aliás, ensejou até transes psicopáticos. O outrora chefão do Fed (Banco Central dos EUA), Alan Greenspan – “maníaco soprador de bolhas”, acertou-o em cheio Belluzzo –, por exemplo, afirmou que a crise atual ocorre sob a égide de modelos em que “respostas inatas do ser humano resultam das oscilações entre a euforia e o medo”.
[1] Em três partes – metologicamente heterogêneas – e breves conclusões, este artigo discorre sobre ele mentos de aproximações à gênese e à dinâmica das crises financeiras. A idéia central consiste em encadear formulações de pensadores consagrados, entre clássicos e contemporâneos, nos possibilitando “juntar peças” que dão forma à relação entre as crises financeiras hodiernas e a especulação.
PARTE I
Há uma idéia crucial (e indevassável) em Marx: as crises econômicas do capitalismo devem ser com preendidas como uma espécie de ruptura imanente e cíclica dos circuitos de fluxo e refluxo dos processos produtivos [2]. Quando, a dado passo, uma queda geral dos preços estagna (e desorganiza) o processo de reprodução do capital, interrompem-se inúmeros “pontos da cadeia de obrigações de pagamento” em prazos antes estabelecidos, levando ao “desmorona mento do sistema de crédito”; advêm crises violentas com depreciações bruscas, até o decréscimo real da produção (Marx, idem p. 292).
Esse movimento não pode ser dissociado de outro fenômeno, típico do desenvolvimento desse regi me de produção: segundo Marx, “o sistema bancário é, pela forma de organização e pela centralização, o resultado mais engenhoso e mais refinado a que leva o modo capitalista de produção” [3]. Originariamente é isso que catapulta o movimento D-D’ – o capital portador de juros no capitalismo propriamente dito –, o valor que se valoriza a si mesmo, dinheiro que cria dinheiro, “sem que dessa forma se descubram os vestígios de seu nascimento” (Marx, apud Ma zzucchelli, 2004: 74).
Por conseguinte, “no capital produtor de juros está perfeita e acabada a representação fetichista do capital” – escreve Marx noutra passagem [4]. Ou seja, a forma capital a juros traz em si a seguinte idéia: toda a renda determinada e regular em dinheiro aparece como juros de um capital, vindo ele de um capital determinado ou não. Isso, para Marx, quer dizer que, no capital portador de juros, o cessionário o lança na circulação como capital, é valor de uso para obtenção de mais-valia e que se conserva desde o circuito, à volta. Noutras palavras de Marx:
“Cede A seu dinheiro não como dinheiro, mas como capital. O capital não experimenta aí transmutação [metamorfose] alguma. Muda apenas de mão. Sua conversão real em capital só se efetua nas mãos de B. Mas para A tornou-se capital em virtude da simples cessão feita a B. Só para B se verifica o retorno efetivo do capital, do processo de produção e circulação. (…) Cessão, empréstimo de dinheiro por determinado prazo, e devolução do dinheiro com juros (mais-valia) é a forma toda do movimento próprio do capital a juros como tal” (Livro 3, v. 5, 396-403).
O que conflui para a formação do capital fictício [5]. Quer dizer, é válido aos papéis que rendem juros o mesmo fenômeno ocorrente nas crises e estagnações dos negócios em geral: “o capital-mercadoria perde em grande parte a capacidade de representar capital-dinheiro potencial”. Aduz Marx, anunciando já então um aspecto estrutural (e contemporâneo!) que integra as crises financeiras:
“Esse capital fictício reduz-se enormemente nas crises, e em conseqüência o poder dos respectivos aos proprietários de obter com ele no mercado. A baixa nominal desses valores mobiliários no boletim da Bolsa não tem relação com o capital real que representam, mas tem muito que ver com a solvência do proprietário” [6].
Dito tudo isso em duas palavras mais claras: 1. Marx alude A como se fosse uma bifurcação do capital financeiro, o portador de juros e o fictício; 2. O capital fictício consistiria em títulos negociáveis no futuro (para ele composto por ações ordinárias das Bolsas, títulos públicos e a própria moeda de crédito – bancária) [7].
De conjunto: a acumulação de capital à base da apropriação do trabalho excedente, a taxa de lucro calibrando a taxa de juros, o capital portador de juros gestando capital fictício. Numa determinação que se relaciona com a busca incessante de valorização do valor, para a qual a especulação passa a ser parte constitutiva do desenvolvimento do moderno sistema de crédito. Especulação [8], vinculando-se à deflagração de crises:
“Quem precisa de uma casa nova escolhe-a entre as construídas para especular (…) Levantam-se recursos por meio de hipotecas, e o empresário vai recebendo dinheiro na medida em que anda a construção das diversas casas. Sobrevindo uma crise que paralise o recebimento das cotas devidas (…), na pior [das hipóteses], são penhoradas e vendidas pela metade do preço” (Marx, Livro 2, v. 3, Cap. XII).
Sim, pura e simples especulação imobiliária (“subprime”!) e crise. Segundo Marx, em meados dos anos 1840, a sofisticação especulativa (“derivativos”!) já corria solta na City londrina. Onde – descreve ele – A ordenava B comprar mercadorias a C em Manchester, para serem remetidas a D nas Índias Orientais; B pagava a C com letras de seis meses, emitidas por C contra B; mas B se “cobria”, emitindo por sua vez letras de seis meses contra A; quando a mercadoria era embarcada, A emitia, conhecendo o embarque, letras de seis meses contra D [9].
Também John Hobson (1894) – logo após a publicação do Livro 3, por Engels – aborda a relação entre o sistema de crédito e a especulação, o que aparece destacadamente no capitulo “O Financiário”, de John Hobson e seu marcante estudo [10]. Mas é Rudolf Hilferding quem avança inovadoramente na radiografia do capital financeiro na época dos monopólios.
Hilferding, ressaltando o caráter anárquico do sistema de produção capitalista, considera que a variação de preços é decisiva para o processo de expansão ou contração produtiva, para o começo de outra arrancada na produção etc. Se a perturbação na formação dos preços é periódica, é igualmente periódica a perturbação na lei dos preços – diz Hilferding. Imaginando, também, que a crise “supõe escassez de venda” [11], pela sua análise a crise é o momento em que ocorre a baixa na taxa de lucro, precedida de um período de prosperidade, com preços e lucros elevados, numa virada de “atividade febrilmente intensa, de altos lucros e da acumulação elevada” (1985: 245-6). Nessas fases – argumenta –, com a gradual subida da taxa de juros, o que faz cair a taxa de lucro; enquanto “aumenta o lucro do capital bancário”. Em tais circunstâncias, “a especulação tanto em mercadorias quanto em papéis de crédito nesse período está em florescência e exige muito crédito” (idem, p. 248).
No sugestivo Capítulo “As mudanças das crises. Cartéis e crises”, Hilferding destaca a relação entre as crises e o desenvolvimento do capitalismo. No sentido das transformações da produção capitalista levarem a certas mudanças nas formas de manifestação das crises: há, diz Hilferding, “fenômenos particulares, correspondentes a uma fase do capitalismo, ou talvez casuais, mas que se trata de tendências resultantes da essência do desenvolvimento capitalista” (idem, p.271) [12].
Assim, para ele (pp. 272-3), a) a mudança de uma crise de crédito em crise bancária, de um lado, e, de outro, em crise monetária têm a ver seja com [13]as mudanças na instituição creditícia, seja pelas mudanças existentes entre indústria e comércio; b) as mudanças fenomênicas de crises aparecem a partir dos progressos da concentração capitalista; e a crise do crédito “se desdobra em crise monetária quando o colapso do crédito gera uma escassez brusca de meios de pagamento” .
PARTE II
Especialmente após a 1ª Grande Depressão (1873-96), de impulso a seus monopólios e enorme centralização do capital bancário, os EUA expandem de uma maneira inédita seu poderio financeiro. Mais precisamente “O império da alta finança”, denominado por Victor Perlo em sua destacada obra [14].
Como bem evocou Frederico Mazzucchelli, os anos 1920 nos EUA foram marcados pela explosão do consumo de massas, fascínio pelos automóveis, facilidades do crédito, expansão dos subúrbios, renovação dos imóveis, multiplicação das rodovias, difusão da energia elétrica, crescimento do emprego, elevação dos salários reais, liberação dos costumes, a revolução do jazz etc. [15].
Exuberância, crescimento excepcional do produto industrial, e Grande Depressão. Uma antinomia de resultado lógico: os EUA em 1929 controlavam 42% da produção mundial total, enquanto Alemanha, Grã-Bretanha e França, juntos, detinham a fatia de menos de 28% da mesma; daí o impacto fulminante da crise. A recuperação vem apenas com o New Deal, de F. Roosevelt, mas persiste a crise internacional e sucede a ascensão do nazismo, até 1939; daí à 2ª Guerra Mundial.
Grande Depressão que, de acordo com John K. Galbraith, em Moeda: de onde veio, para onde foi (Novos Umbrais, 1983), nos EUA, em 1929 faliram 659 bancos, em 1930 1.352, número que atingiu 2.294 em 1931. “Em 1933, 4.004 bancos faliram ou foram considerados em situação imprópria para a reabertura após o feriado bancário” – afirmou o grande economista canadense [16].
Crise deflagrada pelo demolidor crash financeiro de Wall Street, e que mereceu do famoso economista Charles Kindleberger a obra The World Depression (1929-1939); e, notavelmente, numa decisiva contribuição para a interpretação da origem, dinâmica e repercussões nas relações internacionais em Manias, pânico e Crashes. Um histórico das crises financeiras. [17].
Nessa obra, que examina o fenômeno das crises financeiras por quase três séculos, Kindleberger nos apresenta um multifacético painel repleto de lições, talvez ainda não devidamente valorizado. Note-se, no Quadro abaixo, valiosos registros analíticos que podem ser extraídos de sua pesquisa, notadamente os variados circuitos de busca desesperada pela valorização do capital – e o incontornável “material inflamável” da especulação.
Noutro estudo, para Kindleberger – em conformidade com Alexandre Lamfalussy –, em meados dos anos 1980, o Sistema Monetário Internacional experimentava quatro “revoluções” conjuntamente: 1) um regime de taxas de câmbio flexíveis não conside[18]rado como provisório; 2) uma rede nova e mais barata de transportes e comunicações atando os mercados financeiros; 3) uma variedade de novos instrumentos financeiros que o mundo precisa de experiência para aprender como lidar; e 4) a ampliação acelerada da desregulamentação financeira .
Reexaminemos sinteticamente o que ocorreu.
PARTE III
Sabe-se que Leis e medidas regulatórias do sistema financeiro, após a Grande Depressão dos anos 1930, adotadas pelo presidente F. Roosevelt, sofreram ataque em fins dos anos 1960. Mas o processo de desregulamentação e liberalização financeira nos EUA brota da crise da década de 1970, demolindo os acordos de Bretton-Woods (1944), que continham, fundamentalmente: a) taxas de câmbio fixas, porém ajustáveis; b) fixidez nas (baixas) taxas de juros; e c) controle sobre os fluxos financeiros globais. Fez-se elevado crescimento econômico no capitalismo central (+ 1945-75) – a Era de Ouro, comemoravam os ingleses; os Trinta Gloriosos, diziam os franceses [19].
Adveio a crise (estagflação), com intensa volatilidade nas taxas de câmbio, de juros e desvalorização da moeda central. O poder do Estado norte-americano e do dólar responderam unilateralmente com erosão das bases do sistema monetário internacional: 1971, dólar sem lastro, depois chamado “padrão flexível”; 1973, flutuação cambial; 1979-81, brutal elevação da taxa básica de juros. Esse “programa” pavimenta a supremacia crescente do grande capital financeiro norte-americano. A moeda-reserva expressa a força financeira (mercado vasto, profundo e líquido), sustentada no poderio militar, econômico e ideológico dos EUA. Impulsionou-se a globalização financeira. Internacionalizaram-se as operações dos Fundos de Pensão, Mútuos e das Seguradoras. Feroz intensificação da concorrência entre esses Fundos, bancos e agências que reúnem grande legião de investidores e administram carteiras de ativos bastante diversificadas (ações, bônus, hipotecas garantidas etc). Globalização “financeirizada”: padrão de acumulação capitalista afiançado pela plutocracia dos Estados capitalistas.
Difundiu-se na ilusão do regresso à utopia do capitalismo liberal (neoliberal), na era do “supermonopólio” das finanças; das grandes operações dos Bancos Centrais dos países ricos; fusões e aquisições centralizam massas gigantescas de capital. Tais fenômenos, originários nos EUA, foram planetarizados com a desestruturação geopolítica (e ideológica) da bipolaridade mundial (1989-91): o colapso dos países socialistas do Leste europeu e da URSS (o “socialismo real”). (Todo o antigo Leste europeu socialista regressou ao capitalismo desembestado da globalização neoliberal).
Configuram a globalização financeira, a internacionalização e a liberdade de movimentos de capitais, a integração de mercados financeiros e de capitais. Para garantir a investidores e especuladores de todo caráter, exige-se uma legislação a mais uniforme possível e monitoramento global de riscos. Desse modo floresce um novo tipo de gestão dessa riqueza, “financeirizada” pela burguesia rentista. Nos EUA, a desregulamentação ascensional, desde meados dos anos 1980 [20], vinculou-se a processos de securitização de dívidas (garantias), institucionalização da poupança e de mecanismos de transferência de riscos (derivativos, hedges) e arbitragem (jogatina internacional com moeda, câmbio, juros, commodities).
Deveras facilitada pelo aporte das Novas Tecnologias de Informática e Comunicações, e transportes, a integração global dos mercados financeiros, passou a vivenciar uma crescente instabilidade estrutural. Fábrica de crises financeiras internacionais a um intervalo cada vez menor, iniciadas pelo grande crash de Wall Street (1987) – analisado minuciosamente por Kindeblerger. Vinte anos depois, lá, o furacão originário das hipotecas “subprime” (propensas ao calote) faz a economia dos EUA afundar. “Crise financeira épica”, denominou-a recentemente o economista liberal P. Krugman.
Ora, a instabilidade estrutural do ciclo capitalista motivou J. Schumpeter e J. M. Keynes, em enfoques distintos, a acentuarem um caráter endógeno e sistêmico das oscilações. Schumpeter, considerando a função das inovações tecnológicas no movimento de “destruição criativa”; Keynes, argumentando sobre a preponderância da incerteza numa economia monetário-financeira, a nublar as decisões de investimento e expectativas do cálculo capitalista.
Depois, H. Minsky reposicionou o olhar à perene instabilidade presente no capitalismo de hoje: a Hipótese da Instabilidade Financeira (HIF) era incontornável nos países capitalistas de “mercados financeiros sofisticados” [21]. Segundo Farhi [22], na atualidade, a concentração e a universalização das instituições financeiras produzem um forte aumento das operações especulativas e por uma intensa utilização da alavancagem na incessante busca pela rentabilidade mais elevada.
Instabilidade, pânico e crise. A partir daí, sublinhara o especialista M. Aglietta, nas crises financeiras “plenas” o passo seguinte é o “credit crunch” (aperto no crédito). Recordando as crises patrimoniais “mais violentas” que envolveram o setor imobiliário de vários países, na virada dos anos 90 passados, alertara Aglietta: “As crises de crédito resultantes de subavaliação dos riscos privados e do excesso de endividamento são desordens cujas conseqüências são mais lentas, mas freqüentemente mais insidiosas sobre a economia real” [23].
Breves conclusões
Essencialmente, pensamos que as crises financeiras hodiernas [24]:
– Assemelham-se às crises de superprodução de capital, refletindo o excesso de valorização do capital relativamente à determinada taxa de juros. A crescente e sofisticadíssima especulação – hoje sistemicamente baseada em alavancagens de títulos/derivativos –, como procuramos demonstrar, se estabelece estruturalmente na medida em que o próprio regime do capital vai se desenvolvendo; ela pertence à natureza do capital.
– No entanto, exacerbaram-se as características típicas da crise capitalista como a recorrência e a propagação global: tornam-se mais freqüentes, pelo aumento na rapidez da acumulação fictícia – decorrente especialmente da velocidade e do volume das transações com ativos financeiros.
– Ademais, passaram a ser abrigadas pela burla (interesseira) do descontrole regulatório do sistema bancário internacional e pela absoluta falência das agências de “risco”. (O gigantesco rombo de centena de bilhões de dólares, particularmente no sistema bancário internacional, decorrente da crise das “hipotecas subprimes”, voltou a motivar a cantilena oficial da “regulamentação financeira”).
– Chegou-se à anarquia completa de não se ter a mínima idéia precificação de ativos “podres” e generalizadamente contaminadores.
– É evidente que esse capitalismo é regime superado. Mas continuará a espalhar miasmas e barbárie enquanto não for derrubado, sepultado e soterrado.
Sérgio Barroso é doutorando em Economia Social e do Trabalho (Unicamp) e diretor de Estudos e Pesquisas da Fundação Maurício Grabois
NOTAS
[1] “Como podemos errar tanto?”, se pergunta ainda Greenspan, fazendo-se de idiota (“Preço estável das residências deve encerrar crise”, Financial Times/Valor Econômico, 18/3/2008, C-10).
[2] “As crises não são mais do que soluções momentâneas e violentas das contradições existentes, erupções bruscas que restauram transitoriamente o equilíbrio desfeito” (Karl Marx, O Capital, Livro 3, volume 4, p. 286, Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, s/d).
[3] E continua ele, enriquecendo a formulação: “Só o desenvolvimento completo do sistema de crédito e do sistema bancário promove e efetiva por inteiro esse caráter social do capital” (Marx, idem, Livro 3, volume 5, p. 695, Rio de janeiro, Civilização Brasileira).
[4] Livro 3, volume 5, p. 459, Rio de Janeiro, Civilização Brasileira.
[5] Daí Marx ter antecipado que “a formação do capital fictício se chama capitalização. Para capitalizar qualquer rendimento periódico, o que se faz é considerá-lo, com relação à taxa média de juros, como rendimento que daria um capital emprestado a esta taxa de juros” (Marx, apud, Mazzucchelli, , p.78, Campinas, IE/Unicamp, 2004, 2ª edição).
[6] Antes, afirmara: “com o juro ascendente cai o preço deles [dos papéis]. O que também provoca essa queda é a escassez geral de crédito, que força os detentores a lançarem-se em massa no mercado para obter dinheiro” (Livro 3, volume 5, pp. 566-7).
[7] Ver a discussão em “A transformação do capital financeiro”, de Robert Guttman, Campinas, Economia e Sociedade, nº 7, dez./1996.
[8] Note-se uma importante referência de Marx, à página 507, sobre as conseqüências do desenvolvimento do sistema de crédito e lucro a partir dos juros: “Reproduz nova aristocracia financeira, nova espécie de parasitas, na figura de projetadores, fundadores e diretores puramente nominais; um sistema completo de especulação e embuste no tocante à incorporação das sociedades, lançamento e comércio de ações” (Livro 3, v. 5, p. 507).
[9] Livro 3, v. 5, p. 472.
[10] Ver: Evolução do capitalismo moderno. Um estudo sobre a produção mecanizada (São Paulo, Abril Cultural, 1983 [1894]). Diz ele, a exemplo que qualquer “grupo de financistas, armado de recursos suficientemente grandes, pode controlar com firmeza um título, utilizando-o seja para esfolar o público investidor ingênuo, levando-o a comprar e vender com prejuízos, seja para ‘segurar’ o título e esmagar outros financistas que não ‘estão por dentro’” (p. 184).
[11] E adiante, com clareza Hilferding: “A expressão superprodução de mercadorias é, em geral, tão sem sentido quanto a expressão ‘subconsumo’. (…) “Contudo, precisamente por isso, a estreita base do consumo é apenas uma condição geral para a crise, que, de modo algum, é explicada pela constatação do ‘subconsumo’” (O capital financeiro, São Paulo, Nova Cultural, 1985:233).
[12] Prossegue: “Somente sua expansão implica a generalização da produção mercantil, a criação do mercado nacional e do mercado mundial concebido em permanente expansão. Com a ampliação do mercado, desenvolveram-se também as condições sob as quase pode haver crises” (idem, p. 271-2).
[13] Importa notar referências de Hilferding aos transportes e à comunicação, relativamente aos movimentos especulativos, dada a dinâmica da época. Escreve: “Finalmente, atua, na restrição da especulação mercantil, o desenvolvimento dos meios de transportes que reduziu muito a distância do mercado exatamente com as mercadorias sujeitas à especulação. Para isso concorre também a evolução do serviço de informação que a cada momento dá a posição de situação dos mercados” (idem, p. 275).
[14] Entre 1929 e 1955, Perlo lista oito grandes super-impérios norte-americanos, que “fundem”, principalmente, bancos, indústria, minas, petróleo, química, transportes e eletricidade: Morgan, Rockefeller, First National Bank, City Bank, Du Pont, Mellon, Cleveland, Chicago, Bank of América. In: O império da alta finança. Gênese do capitalismo monopolista de Estado nos EUA, v. II, Lisboa, Estampa, 1976 [1956].
[15] Ver, do autor: Os anos de chumbo. Notas sobre a economia internacional no entreguerras, mimeo. 2007, prelo.
[16] Em seu clássico A crise de econômica de 1929 – anatomia de uma catástrofe financeira (Lisboa, Dom Quixote, 1972, 4ª edição), Galbraith vai direto ao assunto: “Como já se frisou tantas vezes, o colapso do mercado de ações de outono de 1929 estava implícito na especulação que o precedeu. Sá havia uma dúvida: por quanto tempo a especulação duraria” (p. 254).
[17] Porto Alegre, Ortiz, 1992 [1989]. Lá sublinha Kindleberger, debatendo as razões várias da Grande Depressão: “A idéia de que a especulação, como causa de manias e crashes, repousa em uma instabilidade inerente ao credito é antiga” (p. 96). E mais adiante: “Quando ocorreu o crash, o sistema de crédito congelou subitamente” (p. 86).
[18] Ver: Movimentos internacionais de capitais, p. 103, São Paulo, Record, 2007 [1987].
[19] L. Belluzzo, após dizer que os sistemas financeiros em Bretton-Woods eram voltados ao crescimento econômico, assim vê o pós B-W: “Não foram poucos os ataques especulativos contra paridades cambiais, os episódios de deflação brusca de preços de ativos reais e financeiros, bem como as situações de periclitação dos sistemas bancários” (“O inimigo assusta os mercados”, in: Ensaios sobre o capitalismo no século XX, p. 18 e 22, São Paulo, Unesp/Unicamp, 2004).
[20] Em “A montagem de um novo regime monetário-financeiro nos Estados Unidos: 1982-94”, Cintra, também descreve, pioneiramente, o caminho para o domínio das finanças diretas e globalizadas (in: Transformações institucionais dos sistemas financeiros – um estudo comparado, de M.C.P. Freitas e M.A.M. Cintra, São Paulo, Fapesp/Fundap, 1998).
[21] Como bem argumentou Minsky, tal comportamento turbulento e caótico pode assumir a forma de: a) inflação interativa; b) bolhas especulativas; c) profunda deflação de débitos inter-relacionados. Ver: “Integração financeira e políticas monetárias”, de H. Minsky, Campinas, Economia e Sociedade, nº 3, dez./1994.
[22] Ver: “Riscos e instrumentos da finança contemporânea”, de M. Farhi, revista Princípios, nº 89, abr./mai 2007.
[23] Ver: Macroeconomia financeira. Crises financeiras e regulação monetária, de M. Aglietta, p. 13, São Paulo, Loyola, v. 2, 2004.
[24] A propósito da crise atual, assim anotou Braga: “A crise tem assumido novas formas em razão das mutações em curso. Mudanças no dinheiro e nas finanças, nas corporações que se tornaram simultaneamente produtivas e financeiras, nas decisões de investimento, nas decisões de consumo, nas interações entre juros e câmbio, nas operações dos bancos centrais, nas relações entre Estado e mercado, na natureza das relações entre países centrais e periféricos etc” (“Incertezas globais e teoria econômica”, de Braga, J.C.S., Valor Econômico, 11/1/2008).
EDIÇÃO 95, ABR/MAI, 2008, PÁGINAS 62, 63, 64, 65, 66, 67