No início dos anos 1990, após o fim da União Soviética, George Bush pai, como chefe da coalizão capitalista vitoriosa, proclamava que a humanidade teria como prêmio um ciclo de paz e prosperidade. As duas guerras de ocupação e pilhagem contra o Iraque e a invasão ao Afeganistão, somadas às chantagens e ameaças contra outros povos, sobejamente, já haviam desmentido a parte primeira da predição da Casa Branca.

Já a segunda – a prosperidade –, se concretizaria, segundo a propaganda dos vencedores, no curso da chamada globalização financeira e desde que os governos dos Estados soberanos aplicassem sem vacilações o receituário neoliberal ditado ao mundo pelo Consenso de Washington.

O “consenso” entre as potências capitalistas – e imposto aos demais países – tinha por objetivo eliminar óbices e amarras existentes para que o capital especulativo viesse a circular livremente na totalidade do planeta. Essas mudanças começam a se operar já nos anos 1980 e ganham celeridade na década de 1990.

Tal dinâmica se instaura, e se enlaça, com os fios da teia da especulação na economia de, praticamente, todos os países. Ativos de diferentes modalidades, algumas vezes, atingiram um montante superior ao PIB mundial. Com a integração das Bolsas, volumes fabulosos de capital fictício migram, de praça a praça, em busca de maiores rendimentos. A pilhagem da riqueza produzida pelos povos é feita sem nenhum tiro, mas deixa um estrago de bomba atômica.

No qüinqüênio final do Século XX, vieram à luz os imensos custos econômico-sociais pagos pelos países da periferia pela aplicação do receituário neoliberal. Soberania dos Estados aviltada, autoritarismo e restrição democrática, desnacionalização e estagnação das economias, vulnerabilidade externa. Imensa transferência de riqueza dos países da periferia ao centro capitalista via privatizações e pagamento de juros.

Quando as crises sacudiram México, Ásia, Brasil, Argentina, Turquia, os próceres estadunidenses do neoliberalismo por intermédio do seu arsenal midiático creditaram o fracasso do modelo à incapacidade das elites daqueles países. “Subservientes, mas perdulárias e incompetentes”.
Todavia, de agosto de 2007 aos primeiros meses de 2008, uma crise financeira – segundo alguns do calado da grande depressão de 1929 – irrompeu-se nos Estados Unidos da América, epicentro capitalismo. De uma inicial crise imobiliária a uma inconclusa crise financeira que afeta Estados Unidos, Europa e Ásia e reverbera em todo o mundo, mesmo com a inusitada resistência das economias de países em desenvolvimento.

Segundo previsão do FMI, de abril último, as instituições financeiras terão perdas de cerca de 1 trilhão de dólares. O Estado que fora execrado pelas máximas do neoliberalismo não mais que de repente é convocado para salvar bancos, seguradoras e outras instituições financeiras. Os Bancos centrais de Estados Unidos, União Européia, Japão, entre outros, injetam bilhões de dólares para manter a liquidez do crédito e impedir a bancarrota do sistema financeiro.

Mas, como sempre, os prejuízos das crises capitalistas são direcionados aos povos e aos trabalhadores. A projeção do crescimento da economia mundial em 2008 já foi rebaixada de 4.8% para 3.7%. Contração do crescimento econômico, sobrevalorização das moedas dos países em desenvolvimento, redução do crédito, inflação, desemprego, são algumas das conseqüências.

Essa saída tão antiga quanto as crises não pode ser encarada pelos governos progressistas e pelo movimento social como uma fatalidade. É preciso resistir contra essa investida. No Brasil essa luta se traduz, entre outras frentes, na mobilização política e social contra o Banco Central que insiste em manter a política de juros altos. Diz, com isso, combater “pressões inflacionárias”. Quando, na verdade, cede às pressões dos banqueiros. Não bastam os bilhões de reais de que já se apropriam. Querem mais.

EDIÇÃO 95, ABR/MAI, 2008, PÁGINAS 3