Sonho com claustros de mármore
onde em silêncio divino
os heróis, de pé, repousam:
pela noite, à luz da alma,
falo com eles: pela noite!
Estão em fila: passeio
entre as filas: as mãos suas
de pedra lhes beijo: os olhos
de pedra descerram: movem
os lábios de pedra: tremem
as barbas de pedra: empunham
a espada de pedra: choram:
vibra a espada na bainha!
Em silêncio, as mãos lhes beijo.

Falo com eles, pela noite!
Estão em fila: passeio
entre as filas: lacrimoso
me abraço a um mármore: – “Ó mármore,
dizem que bebem teus filhos
seu próprio sangue nas taças
venenosas de seus donos!
Que falam a podre língua
dos seus rufiões! Que comem
juntos o pão da ignomínia
na mesa em sangue banhada!
Que perdem em língua inútil
o último fogo! Enfim, dizem,
ó mármore adormecido,
que já morreu tua raça!”

Lança-me em terra, de um bote,
o herói que eu abraço: agarra-me
ao pescoço: varre a terra
com a minha cabeça: o braço
levanta: o braço lhe fulge
assim como um sol: ressoa
a pedra: buscam o cinto
as mãos brancas: e do sólio
saltam os homens de mármore!

 

Grandes vozes líricas hispano-americanas
Seleção e Tradução: Aurélio Buarque de Holanda Ferreira
Editora Nova Fronteira – edição 1990