É um coco.
Escura é sua casca, e é áspero por fora.
Mas, uma vez que se lhe rompe o invólucro,
A carne, casta e firme, parece raso.

Cruzou o mar para mim. Ofegante navio
Trouxe-me do Brasil bruxo, deslumbrador.

Quando os dentes enterro em sua polpa compacta,
Parece-me que bebo a água do Amazonas
E mordo Sol.

Todo o trópico de ouro e de escarlate e anil
Deu-lhe sumos vitais ao materno palmar.
Ele viu a maior Lua da Terra,
E ele conhece a luz total.

Conhece as espantosas brasas do meio-dia,
Lentos crepúsculos e vivas alvoradas,
E o perfume das selvas que cavalga no vento
Para acender as ânsias e os sonhares.

Este dia chuvoso, para mim, graças a ele,
Tem um íntimo resplendor solar.
Remordendo-lhe a carne branca e preta,
Em Pernambuco estou, no Rio, ou no Pará.

E a minha juventude, quieta e reconcentrada,
Por ele, vai, louca, a viajar.

O sonho leva-a pela mão
Lá para além do “rio-mar”.

 

Grandes vozes líricas hispano-americanas
Seleção e Tradução: Aurélio Buarque de Holanda Ferreira
Editora Nova Fronteira – edição 1990