O ano de dois mil e oito chegou com o brilhantismo que marca as grandes datas históricas  – Comemora-se o centenário do nascimenro de Raimundo Mourão e Mello.
      
      Mergulho na minha memória para descrever  a trajetória deste homem que durante noventa e dois anos viveu para semear o amor. Na busca de uma imagem, fecho os olho e vejo as serras do Ceará. Vejo-as com os olhos de alguém que se encantou com uma árvore centenária que ali nasceu e ali se imortalizou. Serra Grande, Serra da Ibiapaba, Serra do Ararendá…  imagens que me chegam com a força de sua beleza e abrem  portas dentro de meu coração para falar de Raimundo Mourão e Mello.

      Um homem, que do alto das serras do sertão do Ceará, soube como ninguém honrar sua família e o seu povo.
      
      Com Dona Adélia Mourão, seu grande amor, sua companheira inseparável, construiu o seu patrimônio mais valioso. Raimundo Mourão fez da sua vida a edificação de um ideal – A família. E diante de uma ação tão nobre fica impossível descrevê-lo plenamente.
      
      Raimundo Mourão fez da política a arte para servir seu povo, foi Prefeito da Ipueiras, Vereador por dezesseis anos e assumiu a Presidência da Câmara Municipal por muitos anos. Cargos que ele exerceu com a dignidade dos nobres. A condição de chefe político de seu munícipio por várias décadas não mudaram seu modo de vida. A utilização da política para promoção pessoal não teve espaço na sua conduta. A política sempre foi uma ferramenta de trabalho a serviço do bem-estar da população. O que explica a paixão e o respeito que sempre recebeu do seu povo. Sua vida pública foi marcada pela competência do administrador dinâmico, do líder político capaz de defender aspirações populares. Verdadeiramente, Raimundo Mourão foi uma grande liderança política.
      
      Um homem com a grandeza de Raimundo Mourão, quis deixar um legado muito maior ao seu povo. Dedicou sua vida à família, esposa, filhos e netos. E cada Mourão desta linhagem, carrega a semente de uma árvore secular, que se enraizou profundamente, garantindo a sua imortalidade. Árvore que tombou com a certeza de renascer. E os brotos já começam a florescer: Ana Luiza e Giovana, suas bisnetas. É a chegada da primavera – nova geração que desabrocha com a suavidade do perfume doce do alvorecer.
      
      Grandes homens deixam exemplos. Por mais que a política tenha sido importante na sua vida, não é como prefeito ou vereador que ele será sempre lembrado. Raimundo Mourão será lembrado como o cidadão – grande homem: referência para a família, para os amigos e para o seu povo. Todos os seu atos e ações o fizeram responsável por esta família maravilhosa. E este, sem nenhuma dúvida foi o maior exemplo que Raimundo Mourão fez questão de deixar – A família Mourão. 
      
      Mergulho mais uma vez nas minhas lembranças e sou abraçada pela magia do tempo. Recordações de uma viagem inesquecível que fiz aos grossos na minha infância. A nossa família viveu dias para nunca esquecer. Um encontro de família e a emoção de cristalizar amizades. Momentos de amor e respeito suficientes para alimentar uma vida inteira.  Seus gestos amorosos marcaram todas as horas. Sua presença tinha o perfume do conforto. Suas palavras expressavam a beleza da certeza. Sua voz realçava um sentimento de aconchego.
      
      O trabalho no sítio, o engenho, a cachaça São Gonçalo…  Grossos, o seu castelo – e a imagem de um homem destemido, de personalidade forte, um homem aparentemente distante, pelo seu porte altivo. As vezes que cheguei mais perto para uma conversa, troca de poucas palavras, me encantei com aquela fortaleza que se transformava em canto de felicidade.
      
      Raimundo Mourão me arranca um sentimento de gratidão. Com ele tudo era possível. Sabia quebrar barreiras e ultrapassar limites. Tinha uma visão de mundo que lhe permitia enxergar muito além de sua pequena Ipueiras. Não foi prisioneiro de seu espaço físico. A sua inteligência lhe abria caminhos para além do seu tempo.
      
      Um homem que se entregou ao mundo. A sua felicidade foi esta verdade que lhe vestiu a vida.
           
      Raimundo Mourão era aquela companhia que abria espaço para o sol brilhar… Um pássaro cantar… Sabia ouvir.
      
      No início da década de oitenta, recém-formada,  fui aos grossos com Dulcilene, sua filha mais nova, estávamos de férias, e ali minhas idéias de revolucionária falavam mais alto do que eu: a luta pela redemocratização do país, a luta pela Anistia ampla, geral e irrestrita, a luta por uma Constituinte livre e soberana, movimentos que ganhavam as ruas e tinham o apoio de um povo ávido de liberdades… O silêncio do respeito acompanhado de palavras cobertas pela sabedoria da maturidade, demostrava uma admiração pela a coragem dos desejos de mudança. Por mais que sua fala fosse cheia de cuidados, cercada pela sensatez da proteção, não me impediu de ver que naquele coração ainda pulsava fortemente o vigor da juventude. Sai dali fortalecida nos meus ideais.
      
      Anos depois voltei aos Grossos, para participar da festa de suas Bodas de Ouro e nesse momento descobri o poder da sua juventude permanente: viver intensamente.
      
      Hoje, enquanto escrevo , sinto o meu coração em festa – é uma dança com a emoção vestida de brilho. – Como  é maravilhoso abrir meu coração para falar deste amor imenso, desta admiração tão grande. Mas, tudo fica muito pequeno para homenagear Raimundo Mourão, qualquer palavra ainda falta um complemento… Quero simplesmente revelar que a alegria de fazer parte desta história me faz maior.
      
      E agora penso ser fácil compreender porque os grandes homens são imortais – suas ações perpetuam valores, seus exemplos fazem a história.
      
      Empresto-me do talento de Gerardo Mello Mourão, grande poeta brasileiro, também nascido na Ipueiras, para terminar minha homenagem, com o final de um de seus mais belos poemas: "A Ronda da Pátria".
      

" Sempre existi e sempre existirei.
Sou o gênio da Pátria, – a eterna mocidade,
– E nunca morrerei! "