Mariana chegou à quitanda procurando Nelson e repolhos. Dos vegetais, não encontrou cabeça que prestasse. De Nelson, nem rastro.

      Mariana morava com a tia – senhora gorda, enérgica, dona de uma capacidade desmedida para o trabalho. Acolheu a sobrinha por conta da morte da irmã e do cunhado em acidente de carro na Via Dutra. Voltavam de um feriado em São Paulo.

      Mariana, dois anos completos, sofreu um pequeno corte na testa, nada mais.
 
      Passados os anos, o corte transformou-se em uma fina linha a tocar os limites do couro cabeludo. Virou marca distintiva. Um certo charme que ela fingia não ostentar.
 
      Aos 22 anos, moça bem feita de corpo, rosto moreno de olhos castanhos, sereno, conheceu Nelson, filho da quitandeira que acabara de se instalar no bairro. O rapaz, despachado, logo que a viu, comentou da cicatriz. Ela sorriu, explicou e ficou ali olhando para aqueles olhos verdes na face salpicada de sardas. Nelson devolveu o sorriso e foi terminar de carregar as caixas do caminhão.
 
      Desde esse dia, Mariana virou freqüentadora assídua da quitanda. Todavia, raramente via Nelson. Na última semana, não havia posto os olhos no moço. Hoje, tomou coragem, e perguntou sobre seu paradeiro à sua mãe.
 
      – Casou, minha filha. Não sabia? Conheceu uma moça em Belo Horizonte, numa dessas viagens de visita ao pai, e resolveu ficar por lá.
 
      Mariana não demonstrou seu abalo. Arranjou o melhor sorriso que podia e fingiu, com certa competência, alguma felicidade pelo destino de Nelson. Despediu-se e se encaminhou para a saída.
 
      – Não vai levar nada hoje, minha filha? – perguntou a quitandeira.
 
      Mariana se aproximou dos repolhos, escolheu o menor, de um verde esmaecido, pagou, e foi pela rua, rumo ao quarto e cozinha que dividia com a tia, esforçando-se para não esquecer do sal e da pimenta-do-reino para o refogado.