1 (MUXURANA histórica:)
– Os primeiros fizeram
As escravas de nós;
Nossas filhas roubavam,
 Logravam
E vendiam após.

2 (TECUNA a s'embalar na rede e querendo sua independência:)
– Carimbavam as faces
Bocetadas em flor,
Altos seios carnudos,
Pontudos,
Onde há sestas de amor.

3 (MURA comprada escrava a onze tostões:)
– Por gentil mocetona,
Boa prata de lei.
Ou saia de chita
 Bonita,
dava pro-rata el-rei.

4 (TUPINAMBÁ ansiando por um lustro nos maus PORTUGUESES:)
– Currupiras os cansem
No caminho ao calor,
Paritins orelhudos,
 Trombudos,
Dos desertos horror!

5 (Coro dos Índios:)
– Mas os tempos mudaram,
Já não se anda mais nu:
Hoje o padre que folga,
 Que empolga,
vem conosco ao tatu.

6 (TAGUAIBUNUÇU conciliador; coro em desordem:)
– Eram dias de estanco,
Das conquistas da Fé
Por salvar tanto impio
 Gentio…
– Maranduba, abaré!…

7 Do agudo ao grave, mêmîchió destoa,
Entrando frei Neptunus ventania:
Siu! macaca veloz, Macu-Sofia,
Medindo-lhe o capuz, de um salto

8 E lá vão! e lá vão! pernas e braços
A revirar Macu, que solavancos
Que o frade leva, aos trancos e barrancos,
Entre aplausos gerais, palmas, fracassos!

9 Olha o vigário! a face da Tecuna
Com que mãos carinhosas afagando!
Guai! como a véstia santa abre-se e enfuna
Lasciva evolução, se desfraldando!

10 Um torceu o pé, junto à candeia
Sentada está, cantando ao seu profeta;
Outra ao Guesa arrebata, enlaça, enleia
Em voltas cintilantes qual a seta!

11 (NEPTUNUS SANCTORUM entrando pestilente:)
– Introibo, senhoras,
Templos meus, flor em flor
São-vos olhos quebrados,
Danados
Nesta noite de horror!

12 (Padre EXCELSIOR, respondendo:)
– Indorum libertate
Salva, ferva cauim
Que nas veias titila
Cintila
No prazer do festim!

13 (Coro das Índias:)
– A grinalda teçamos
Às cabeças de lua:
Oaca! yaci-tatá!
Tatá-yrá,
Glórias da carne crua!

14 (Velho UMÁUA, prudente:)
– Senhor padre coroado,
Faça roda com todas…
A catinga já fede!
De sede
Suçuaranas 'stão doudas!

15 (ABREU-LIMA murmurando o voe victis romano:)
– São sagradas as fontes,
Lede as leis, dom Vital:
Vinte milhões de lebres
Com febres
Causa dum pantanal.

16 (Coro cínico dos vigários:)
– Macaxera! Oucha! Quaqua!
Coraci! que perder
Nestes tons tão noturnos!
Alburnos
Do olho morto sem ver!

17 (Perulera sacerdotisa matando reis de França:)
– Cum espírito tuo
São Coatis sacristãos,
Dea Elisa é vigária
Yankária
Das… magnetizaçãos!

18 (Vigários, ébrios saindo do tatuturema, insultam sagrados túmulos, a VOZ:)
– Escarremos imundos
Nestas trevas!
 – Jeová
Daí, o negro vampiro,
Ao delírio
Teu em luzes fará!

 

Esta página traz as 18 primeiras estrofes do “Tatuturema”, fragmento do canto 2 de “O Guesa”.
Folha de S. Paulo – Mais!
Edição de 21 de abril de 2002