Abandonado
Vale à pena acrescentar que não morri, a despeito de crer em deuses e padres nada poderosos, que não criaram nem céus, nem terras, nem a culpa de existir.
Também é forçoso que se diga o quanto andei até esse agora em que me faço inocente, apesar de todo o crime de querer seus lábios e suas coxas recendendo a incenso e mirra, a húmus e asfalto, a decepcionado futuro: não foram mais de vinte serras, nem vim descalço – antes, pus-me a galopar veredas e vim dar aqui, nesse charco de mim para além dos prados de nós. Ao chegar, topei com a perpétua memoração de seus olhos e nunca mais me procurei, na certeza de que jamais quis encontrar o que fosse, foi ou viesse a ser.
Sendo você a senhora das rotas de meu querer, quais seriam mesmo os sentidos das caravanas? Melhor é quedar-me aqui, encostado aos muros, vigilante, no aguardo de que, nos festejos, abram-se os portões e eu possa recolher um mínimo resíduo de flor ou de sossego.