A comilança do pobre
Sem grandes esperanças, mas também sem desespero de causa, ou de coisa, sem viver a tocar demandas no foro, não passa mal de boca, pois a isto todo seu ganhame destina? sem falar que em tempos de governança populista não faltam cartões e filantropias que dão de um tudo, desde salário miséria até cesta básica, auxílio natalidade e outros adjutórios que, juntados, fazem o carente viver com mais folga do que muito classe média espremido e açoitado por cascatas de impostos e taxas enrabichados nos rabos uns dos outros, feito rabiola de papagaio.
Assim, o pouco que o pobre ganha ele gasta, de pronto. Alguns se permitem até o direito de serem perdulários, uma vez sabendo que “bem sucedidos” serão chamados a pagar a conta do desbronco. As estatísticas dão conta de que a chamada classe C e D estão a consumir como nunca, movimentando os shopping centers onde a classe média só vai para ver vitrine e fingir que não está afim. O pobre age assim, perdulariamente, por saber que de nada adianta economizar merreca. Sabe que sua magra poupança não poderá leva-lo às estranjas, nem terá moeda sonante para financiar cruzeiros marítimos.
Nas tardes solarengas de sábado e domingo sempre pego a minha byke e saio, a pedalar pelos bairros baldios da periferia da city goianiense e folgo de ver as cadeiras colocadas nas calçadas, os bares e campinhos de futebol botando gente pelo ladrão, as churrasqueiras a todo vapor, cachaça e cerveja descendo pelas goelas, com muita música breganeja para alegrar o ambiente. Isto mesmo em tempos de crise econômica, em que muito ex-abonado metido a besta está latindo para economizar cachorro. Assim deve ser pelo interiorzão, ou pelos gerais do Brasil profundo.
Na sabedoria popular, a que tem acesso, sabe que tudo tem seu tempo nesta vida: tempo de comer e de passar fome, tempo de gastar e de economizar, tempo de ter saúde e de adoecer. Nas quermesses e festanças populares vejo, e me alivia: como o povão se diverte, e se permite ser alegre! Em chão batido com teto de lona, ao som de um pandeiro, triângulo e sanfona, faz muita gente levantar poeira, dançando e bebendo a noite inteira. Na gritaria do truco ele é capaz de varar a noite inteira. Por isto rasga gerais, sobretudo se no pagode não faltar cachaça de cabeceira. Jabá e mugunzá, buchada de bode e mocotó como Deus seja servido.
Mas do que o pobre gosta mesmo é de tirar retrato ao lado dos políticos. Como estufa o peito e capricha um aberto sorriso banguelo. Nem é preciso que o retratista peça para olhar o passarinho, ou brinque: “Diga: Uísque!”. O passarinho da sua felicidade é a ilusão da igualdade, a foto ao lado do candidato, que haverá de mostrar aos vizinhos, alardeando seu compadrio e amizade com o novo campeão de votos.
Brasigóis Felício, é goiano, nasceu em 1950. Poeta, contista, romancista, crítico literário e crítico de arte. Tem 36 livros publicados entre obras de poesia, contos, romances, crônicas e críticas literárias.