No cerrado ser certo
É ser torto.
Aleijado é ser ereto.
É uma questão de gosto.
Em vez da reta, do traçado masculino,
Ele tem as curvas
Do corpo feminino.

O cerrado não inveja as garbosas florestas.
Por que árvores altas se em vez de girafas
Ele tem tamanduás, antas e pebas?

No Japão,
Para explicar o que é o cerrado,
Basta dizer na palestra:
— É uma floresta… de bonzais.
 
Para se ver longe
Não é preciso ser alto
Já se nasceu no Planalto.
 
O cerrado bebe água e fogo.
Suas raízes sugam as pedras.
O cerrado é forte nada teme,
Exceto o câncer das motos-serra.

O cerrado é a casa das águas,
É onde os rios escolheram para nascer.
Ele está sendo morto.
E se ele morre, as águas falecem,
E a vida perece.

No cume do Planalto
As estrelas são uvas
Colhidas com as mãos.
 
— Pegue um balde, suba a Chapada
E ordenhe a Via-Láctea.

As delícias do amargo & uma homenagem: poemas
Adalberto Monteiro
Editora Anita Garibaldi – edição 2005

Adalberto Monteiro, Jornalista e poeta. É da direção nacional do PCdoB. Presidente da Fundação Maurício Grabois. Editor da Revista Princípios. Publicou três livros de poemas: Os Sonhos e os Séculos(1991); Os Verbos do Amor &outros versos(1997) e As delícias do amargo & uma homenagem(2007).