Mais de 500 pessoas prestigiaram o seminário “A crise do capitalismo e a nova luta pelo socialismo”, realizado na manhã da quinta-feira (29) no Centro de Convenções Hangar, no âmbito do Fórum Social Mundial (FSM), em Belém (PA). O evento contou com a participação de institutos de pesquisa, fundações e publicações de orientação marxista e progressista de vários países e continentes, e teve como eixo a luta pela libertação do mundo do domínio imperialista.

A mesa, coordenada pelo presidente da Fundação Maurício Grabois Adalberto Monteiro e por Ronaldo Carmona, integrante da Secretária de Relações internacionais do PCdoB, foi composta por Lautaro Carmona, secretário-geral do Partido Comunista do Chile; Mario Alderete, da Revista Cuadernos Marxistas e do Partido Comunista da Argentina; Enrique Santiago, do Partido Comunista da Espanha (PCE); Gilles Garnier, membro da direção do Partido Comunista Francês (PCF); Athanasios Pafilis, da direção do Partido Comunista da Grécia; Fabio Amato, da direção do Partido da Refundação Comunista da Itália; Giorgio Riolo, da Associação Rumo Rosso (Itália); Maurício Miguel, do Partido Comunista Português (PCP); Fernando Sosa, da União de Jovens Comunistas do Uruguai; e Tran Duc Luong, do Partido Comunista do Vietnã.

Na abertura dos trabalhos, o presidente da Fundação Maurício Grabois, o jornalista e poeta Adalberto Monteiro, disse que a Fundação se sentia honrada em realizar aquele evento por quatro motivos. Primeiro, pela atualidade do tema. Segundo ele, se o início dos anos 90 foi marcado pela crise do socialismo e o auge do neoliberalismo, o final da primeira década do século XXI é sacudido por uma crise econômica, financeira e ideológica que desnuda os limites históricos do capitalismo e realça o socialismo como uma alternativa rejuvenescida e viável. No âmbito desse cenário, enfatizou, emerge a revalorização do marxismo.

Palco da Guerrilha do Araguaia

O segundo motivo indicado por Adalberto Monteiro, eram os parceiros do seminário: prestigiados periódicos e institutos da esquerda marxista, de 11 países. O terceiro motivo destacado pelo presidente da Fundação Maurício Grabois era o local do evento – a Amazônia brasileira, símbolo a um só tempo da pujança do país e da dimensão de seus desafios e desigualdades.

O quarto motivo, disse Adalberto Monteiro, foi o fato de o seminário ser realizar no Pará, Estado natal de João Amazonas, destacado brasileiro e histórico dirigente e ideólogo do Partido Comunista do Brasil (PCdoB). O presidente da Fundação Maurício Grabois também lembrou que o Estado do Pará foi palco, nas selvas da Amazônia, da principal resistência armada à ditadura militar, a Guerrilha do Araguaia.

Nas matas do sul do Pará, destacou, morreu em combate Maurício Grabois, o patrono da Fundação por ele presidida. Embora não tenha participado da mesa, a República Popular da China marcou presença com uma delegação de uma instituição de estudos composta por dez integrantes e que acompanhou atentamente o debate.

Foi distribuído aos presentes o pronunciamento que o presidente do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), Renato Rabelo, faria no seminário – ele não chegou a tempo por atraso do vôo. O seminário foi encerrado com a visita e o pronunciamento do embaixador da Palestina, Ibrahim Al Zeben, que recebeu uma viva manifestação de solidariedade do público e dos palestrantes.

Oradores destacam socialismo de nossos dias

No âmbito de um evento marcado pela multiplicidade de temas, variedade de protestos e um exercício comum de buscas de caminhos e alternativas, a esquerda revolucionária e marxista difundiu suas idéias e convicções no âmbito do Fórum. Os conferencistas tiveram uma visão convergente de que a crise capitalista é uma das mais graves da história do capitalismo e que seus efeitos destrutivos mais uma vez evidenciam os limites históricos desse sistema.

Compareceu neste diagnóstico que o capitalismo com suas características de hoje tem golpeado as conquistadas civilizatórias da humanidade. No geral, os oradores procuraram analisar o impacto da crise tanto no mundo quanto da realidade de seus países. Vários oradores, sobretudo os europeus, destacaram que o ciclo virtuoso da luta antiimperialista, democrática e progressista da América Latina é o vetor positivo no contexto da crise.

Muitos oradores também sublinharam que o socialismo de nossos dias rejeita modelos e refuta uma receita única de caminhos. Em outras palavras: o socialismo há que refletir a realidade de cada país, a história e a cultura de cada povo. E os caminhos para alcançá-lo serão os mais diversos. Em termos de mensagem, o seminário agregou ao lema do FSM de “outro mundo é possível” a convicção de que “Outro mundo socialista é possível”.

Superação revolucionária

José Reinaldo Carvalho, secretário de Relações Internacionais do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), abriu as intervenções citando um discurso do ex-presidente norte-americano George Bush pai, pronunciado em 1992 — no auge da histeria pós-queda do Muro de Berlim —, no qual ele proclamou uma nova era de domínio mundial pelos Estados Unidos.

Para José Reinaldo de Carvalho, nascia, na ocasião, um era de “terror infinito” contra os povos, traduzida pelo slogan de “guerra infinita contra o terrorismo” – ou “guerra preventiva” -, que se vulgarizou na administração de George W Bush. O secretário de Relações Internacionais do PCdoB destacou que a viragem ocorrida no mundo com a emergência dos Estados Unidos como superpotência unipolar trouxe também ilusões sobre uma suposta revogação das teses de Karl Marx, que contagiou até setores da esquerda.

Ele fez uma rápida digressão histórica para situar a crise atual, que ocorre num cenário de contraste em relação àquele do pronunciamento de George Bush pai. Segundo José Reinaldo Carvalho, desde os tempos de Vladimir Lênin o marxismo enfatiza dois fenômenos intrínsecos ao sistema capitalista: crises e guerras. Para ele, agora os mesmos que proclamaram o neoliberalismo como a última palavra da história se converteram em “neokeinesianos” para justificar os saques aos Estados nacionais e às finanças públicas a fim de salvar empresas e banqueiros atingidos pela crise.

O secretário de Relações Internacionais do PCdoB disse ainda que a crise mostra que, se os capitalistas não sabem gerir a economia, os socialistas, os trabalhadores, sabem. Ou seja: o caráter estrutural da crise exige uma superação revolucionária do capitalismo. E explicou que o epicentro do desabamento do neoliberalismo são os Estados Unidos — mas seus efeitos se espalham rapidamente pelo mundo. Poucas nações estão conseguindo manobrar temporariamente o repique da crise, mas isso não esconde o seu sentido estrutural, explicou.

Contradições inter-imperialistas

Para José Reinaldo Carvalho, crises como essa fazem parte da natureza do capitalismo. E a sua superação só será possível por meio da luta dos povos. Ele lembrou que as forças de esquerda e progressistas vinham alertando para os efeitos que chegam agora há muito tempo. Era, segundo o secretário e Relações Internacionais do PCdoB, uma crise em gestação pela realidade objetiva do capitalismo. E a atual sinalização de fraqueza do sistema faz surgir a possibilidade de um novo ordenamento internacional. Segundo ele, há na crise um fator novo: a erosão do dólar como moeda-padrão internacional.

Tudo isso, destacou, faz parte das contradições que opõem o imperialismo aos povos. E cria contradições inter-imperialistas que geram conflitos políticos, diplomáticos e militares. É a lei do desenvolvimento desigual apontada por Lênin, explicou. Nesse cenário emergem novos pólos — particularmente a China, que, com sua peculiaridades, vai construindo o socialismo e se firmando como potência, afirmou.

Curso nefasto dos acontecimentos

José Reinaldo Carvalho disse também que a possibilidade de um período novo para o mundo com a posse de Barack Obama na Presidência da República nos Estados Unidos passa pela contenção da mão assassina de Israel, pela retirada das tropas de ocupação do Iraque e do Afeganistão, pela desativação da Quarta Frota e pela criação de uma ordem internacional multipolar. Seria ilusão, no entanto, segundo ele, acreditar em mudança desse porte sem a luta dos povos.

Para o secretário de Relações Internacionais do PCdoB, só as palavras são insuficientes para inverter o curso nefasto dos acontecimentos mundiais decorrente da política intervencionista norte-americana. É preciso, afirmou, levar adiante a resistência dos povos — uma tendência verificada na América Latina onde os povos avançam em suas conquistas por meio de governos progressistas constituídos pela via eleitoral.

Experiência do povo

José Reinaldo Carvalho enfatizou que o PCdoB enfrenta a crise estrutural do capitalismo com a perspectiva socialista. E ressaltou que esta perspectiva deve ser para toda a humanidade. No Brasil, há uma situação nova, com Lula na Presidência da Republica, mas a dominação de classe não se alterou, explicou. José Reinaldo Carvalho também comentou a vitalidade do movimento comunista, demonstrada pelo recente encontro de partidos comunistas e operários em São Paulo e pela resistência dos países que seguram a bandeira do socialismo com altivez.

O secretário de Relações Internacionais do PCdoB explicou ainda que o caminho para o socialismo não é uma linha reta. São necessárias várias etapas e muitas experiências, afirmou. O povo precisa fazer a sua experiência até chegar à conclusão de que é necessário romper com o sistema capitalista. São essas, segundo José Reinaldo de Carvalho, as tarefas da atual etapa da luta pelo socialismo no Brasil. E destacou a importância de aproveitar este momento especial para unir o povo em torno de bandeiras democráticas e progressistas.

José Reinaldo Carvalho explicou que a união do povo é a mais poderosa arma para enfrentar o poder do inimigo. Mais que isso, segundo ele: o momento atual é propício para a união dos povos em toda a América Latina. E citou uma formulação do presidente do PCdoB, Renato Rabelo, segundo a qual o mundo está em uma encruzilhada que exige uma decisão clara sobre qual caminho tomar. Para ele, o caminho dos povos é o da justiça social, da consolidação da tendência progressista que vai se firmando na América Latina.

O seminário teve como entidades co-promotoras, além da Fundação Maurício Grabois, várias publicações marxistas e progressistas e entidades que lutam contra a dominação imperialista em diferentes regiões do planeta.

Colaborou Adalberto Monteiro