Por Mary Stassinákis

Por Mary Stassinákis, da sucursal da União Européia, no Monitor Mercantil

Raras são as revistas políticas no mundo com a história e a importância da Monthly Review, fundada em 1949 pelo grande marxista norte-americano Paul Sweezy, professor de Sociologia na Universidade de Harvard, que dirigiu a publicação até sua morte em 2004

O editorial do primeiro número da Monthly Review foi escrito por Albert Einstein e tinha o título “Por que Socialismo?”.

Em continuação, outras personalidades de destaque foram autores de editoriais da revista, como Jean-Paul Sartre, Noam Chomsky e Ernesto “Che” Guevara.

O atual diretor da Monthly Review é John Bellamy Foster, professor de Sociologia na Universidade de Oregon (EUA).

Seus estudos versam sobre Economia Política, Marxismo e Meio Ambiente.

Paralelamente, Foster é presidente da Monthly Review Foundation.

O texto a seguir constitui parte de sua longa entrevista, concluída na primeira semana deste mês.
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Após 25 anos, o “neoliberalismo existente” parece estar às portas da derrocada total. A que o senhor atribui a atual e grave crise do capitalismo?

A queda do neoliberalismo está clara. Mas como eu e Fred Magdoff sustentamos em nosso livro The great financial crisis: causes and consequences (A grande crise financeira: causas e consequências), que acaba de ser publicado pela editora da Monthly Review, é melhor enfrentarmos o neoliberalismo como a ideologia do sistema de aprofundamento da inércia e do capital monetário que predominou nas últimas três décadas.

Consequentemente, a verdadeira resposta à sua pergunta está mais no nível das mudanças no acúmulo do capital neste espaço de tempo, o que temos chamado de “capital financeiro monopolista”. No pensamento econômico ortodoxo, supõe-se que o crescimento galopante é uma tendência física do sistema. Assim, se houver um atraso, será devido à alguma intervenção externa sobre o processo de acumulação do capital pelo Estado e pelos trabalhadores, que impulsionam os custos para cima e impedem a acumulação.

Contudo, existe um outro ponto de vista, inovador na tradição marxista — de Harry Magdoff e Paul Sweezy — desenvolvido entre as décadas de 1970 e 1990, que diz: A tendência regular da economia monopolista capitalista é a inércia. Isto é, aquilo que Keynes denominou “equilíbrio de subocupação”, ao invés do pleno emprego, e que se caracteriza por um crescimento lento aliado a um alto desemprego.

A razão desta situação pode ser encontrada no percentual elevado de exploração e desigualdade. Dada a desigualdade, assim como outras distorções na economia, o capital é incapaz de encontrar soluções satisfatórias para investimento a fim conseguir o percentual de desempenho exigível. Dessa forma, se torna incapaz de absorver o gigantesco superávit econômico que tem à sua disposição. O resultado, então, é que surge a tendência de redução do ritmo de crescimento nas economias capitalistas desenvolvidas.

Durante este espaço de tempo denominado era neoliberal, sucessora à “Era de Ouro” da década de 1960, a única alavanca do crescimento foi um processo de sucessão de bolhas financeiras, que se tornaram cada vez maiores. Todo este processo criou uma onda de especulação sem precedentes na história, seja sob o ponto de vista da extensão, seja sob o da duração.

Há alguns anos, Fred Magdoff e eu havíamos sustentado que, no final, este processo se chocaria em seus próprios limites. Estamos, então, diante de uma profunda depressão, a primeira após a década de 1930, e quando a recuperação retornar, daqui há alguns anos, a expectativa é que tenhamos aquilo que se chama “recuperação em L”, com crescimento extremamente lento e com todos os problemas da inércia predominando no futuro previsível.

A propósito, como o senhor compara a crise atual com aquela dos anos 1930?

Creio que estamos diante de uma outra crise. Aliás, até o Fundo Monetário Internacional acabou de anunciar que “as economias desenvolvidas já estão em recessão”. A queda no Japão é aterrorizante, com as exportações despencando 1/3 em dezembro e sua produção industrial registrando o pior desempenho de toda a sua história. Ao mesmo tempo, os EUA perdem 500 mil postos de trabalho a cada mês.

Sob vários pontos de vista, esta é uma situação sui generis. A pergunta é se a atual crise gerará fundamentos piores que os da Grande Depressão. Mas ninguém conhece a resposta. A única previsão clara é que quando o processo de crise do capital estiver concluído, o da recuperação da economia ainda não estará.

Julga que as políticas keynesianas podem funcionar, sem a reestruturação dos aspectos fundamentais do capitalismo?

Os aspectos econômicos do keynesianismo não tiveram nenhuma influência real sobre o governo do New Deal nos EUA até novembro de 1938. Então, foi publicado o livro Um programa econômico para a democracia dos EUA, escrito por Paul Sweezy em parceria com outros jovens economistas da Universidade de Harvard e Tafts.

O programa econômico foi rapidamente adotado pelo governo para legalizar as medidas que haviam sido tomadas para enfrentar a queda de 1937. O keynesianismo, então, provocou mudanças durante o período recessivo.

Além disso, naquela época o pacote de ajuda econômica era muito pequeno para ter influência no nível da atividade. A economia dos EUA jamais saiu da Grande Depressão de 1929. Simplesmente se fundiu com a Segunda Guerra Mundial, que elevou a produção às alturas quando começaram a surgir as grandes encomendas bélicas.

Agora somos testemunhas da concessão de um gigantesco pacote de ajuda, de acordo com os padrões do keynesianismo. Mas é extremamente improvável que este consiga deter a crise.

Não acho que a interdependência econômica mundial seja o fator que restringe a eficácia destas medidas. O problema é o próprio keynesianismo! No melhor dos casos, aliás, aquilo que hoje torna-se compreensível como keynesianismo é o que Joan Robinson, a jovem colega de Keynes, chamou de “keynesianismo abastardado”.

O próprio Keynes limitou-se a um caso específico, aquele em torno dos aspectos econômicos da recessão.

É importante compreender que mesmo as personalidades importantes do setor chamado de “keynesiano”, como Paul Krugman, sustentam que Keynes equivocou-se em suas avaliações mais importantes.

Isto é, no fato de que a economia capitalista possui certos defeitos em destaque, relacionados com a tendência ao desemprego elevado, desigualdade, inércia e insuficiência financeira.

Neste sentido não são keynesianos, ou pelo menos ainda não. O keynesianismo verdadeiro mostraria a necessidade de uma mudança estrutural, embora o próprio Keynes tenha se preocupado principalmente com a manutenção do sistema.

Na fase atual, estamos em uma situação que Schumpeter, em certa época, chamou de “o capitalismo na tenda de oxigênio”. Foi seu termo para o capitalismo com forte intervenção estatal como resultado de crises.

A pergunta é se desejamos conservar o sistema como está ou arrastá-lo para o fundo. Acho que é necessário conhecermos as mais profundas abordagens críticas de Marx sobre o capitalismo. Somente ali encontramos uma teoria geral da crise. O que precisamos é de uma espécie completamente diferente de economia e sociedade, um socialismo para o Século XXI.

O senhor tem escrito extensamente sobre a “oposição ecológica” que está incorporada nas relações econômicas capitalistas, mas alguns discordam. Afirmam que o sistema do socialismo existente provou-se catastrófico para o meio ambiente…

Ninguém pode negar que o sistema soviético, o “socialismo existente”, foi tremendamente catastrófico para o meio ambiente, em nível por mim descrito como “ecosuicídio”, em meu livro O planeta vulnerável.

Uma forma de vermos o complexo problema do capitalismo, do socialismo e do meio ambiente, por completo, é reconhecermos que a percepção convincente para “progresso” está enraizada no compromisso do capitalismo com uma acumulação interminável.

Consequentemente, interminável também é a expansão até o único alvo da sociedade econômica. Esta percepção contaminou os movimentos socialistas das segunda e terceira internacionais, que caíram vítimas de seus próprios pontos de vista equivocados sobre a produção.

Na sociedade exploradora que finalmente emergiu na União Soviética, a produção pela produção se tornou a razão da existência do sistema, e de uma forma que imitava a inovação capitalista.

Esta tendência estava totalmente desencontrada do marxismo. Marx foi, em essência, o primeiro pensador a dar ênfase à relação transformadora da humanidade com a natureza por intermédio do trabalho como uma “situação eterna” da existência humana.

O socialismo, em qualquer sentido autêntico, é um sistema que visa principalmente enfrentar a desigualdade e as necessidades sociais por intermédio do planejamento comum, entre produtores parceiros.

Portanto, é necessário que criemos algo novo sob o sol. Um socialismo para uma sociedade ecológica. Qualquer outra “criação” levará à derrocada da civilização e à destruição dos ecossistemas do nosso planeta.

Hoje temos indícios palpáveis de renovação do socialismo na América Latina. No mesmo momento, o capitalismo tornou-se uma catástrofe imperialista econômica e ecológica que ameaça não só o bem estar dos seres humanos pelo mundo como também sua sobrevivência.

O que mudou, e é muito preocupante, é o fato de que é muito mais difícil nos referirmos à “grande marcha da história rumo à uma classe social mais humanizada”, porque o tempo está acabando.

Devemos renovar o socialismo agora, em escala mundial e com as formas mais amplas de consonância com uma sociedade perpétua. Isso se queremos que a humanidade sobreviva.