A crise do capitalismo e a luta anti-imperialista
A atual crise é a mais global e a mais grave da história do capitalismo no período posterior à Segunda Grande Guerra, provavelmente a mais grave desde a grande depressão da década de 1930. Uma crise que, tendo como epicentro os Estados Unidos, irradia-se para todo o mundo. São evidentes os sinais de recessão econômica nos Estados Unidos e em países europeus, com tendência a aprofundar-se e estender-se por longo tempo. Já se fazem sentir as duras consequências para os trabalhadores e os povos, com as demissões em massa e o anúncio de medidas antioperárias pelos governos que, em momentos como este, atuam como verdadeiros comitês de salvação do grande capital.
A crise agrava as contradições de classes e geopolíticas fundamentais do sistema capitalista, põe a descoberto os limites históricos do sistema e as suas mazelas estruturais. Põe em questão o modelo de “desenvolvimento” protagonizado durante o último quarto de século, o neoliberalismo, traduzido na região da América Latina como o “Consenso de Washington”.
A eclosão da crise do capitalismo a partir do estouro das bolhas financeira e imobiliária em 2007 e
2008 fez soar também o dobre de finados das ilusões há muito tempo semeadas pelo dogmatismo oficialista, com sede em governos, academias e meios de comunicação, quanto às virtudes e à durabilidade do “ciclo de expansão” do capitalismo e sua vocação a regenerar-se e abrir uma nova era desenvolvimentista. Ilusões que conviveram com críticas de supostos renovadores que tiveram a veleidade de desqualificar o Partido Comunista. Este, segundo os “renovadores”, numa recidiva de “dogmatismo” marxista-leninista, teria sido acometido também de catastrofismo e leitura terminalista sobre o sistema capitalista, quando o que fizeram na verdade os comunistas – em seu 11º Congresso de 2005 e num Seminário político-teórico em 2007 – foi chamar a atenção para as tendências profundas do desenvolvimento econômico e político da sociedade burguês-imperialista, denunciar as suas iniquidades e chamar os trabalhadores e os povos à luta pelo socialismo, única alternativa para resolver os impasses da época.
Definir os fenômenos econômicos atuais apenas como uma crise da “financeirização” é incorrer em unilateralismo, pois a crise não é só financeira, apesar da relevância dos problemas nesta esfera. É uma crise do processo global de produção capitalista, caracterizada por uma solução de continuidade na circulação de capitais nas esferas produtiva (D-M-D´) e financeira (D-D´). No primeiro caso, a interrupção do processo de circulação do capital ocorre com a paralisação da venda de mercadorias e, consequentemente, a não conversão do capital-mercadoria (M) em dinheiro acrescido de mais-valia (D´). Na esfera financeira a circulação do capital é bloqueada com a interrupção do crédito. Ambos os fenômenos – superprodução e crise do crédito – que o pensamento econômico burguês enxerga como uma crise psicológica, uma “crise de confiança”, podem ser observados na crise atual. Os problemas começam a surgir depois que a produção no ramo imobiliário (construção civil) atingiu o pico, em 2005, e as vendas começaram a cair em 2006, revelando a crescente dificuldade de transformar o capital-mercadoria (M), expresso nos imóveis, em D´ como capital-dinheiro acrescido de lucro.
Assim, a crise tem todas as características de uma crise clássica do capitalismo, uma crise cíclica decorrente da superprodução de mercadorias, que sucede num ciclo de curta e frágil expansão da economia americana, entre 2001 e 2007, se comparado com os dois ciclos anteriores (1982-1990 e 1991-2000), mais longos e com maiores taxas de expansão do PIB.
A crise tem a ver com a “Superprodução fomentada pelo crédito e pela concomitante inflação geral dos preços”, de que já falava Marx em O Capital, livro 3, volume 5.
Contexto de declínio histórico
É preciso enxergar a crise no contexto histórico e em sua interligação com a crise da hegemonia dos EUA. O processo de reprodução do capitalismo nos EUA e em âmbito internacional é fortemente marcado pelo parasitismo. A dívida e o déficit comercial norte-americanos cumprem papel destacado no processo de reprodução ampliada do capital em todo o mundo, daí a irradiação da crise, que transpõe as fronteiras estadunidenses e se propaga pelos cinco continentes.
Uma das características mais relevantes do atual contexto geopolítico mundial é o progressivo deslocamento do eixo dinâmico da industrialização e do poder econômico mundial dos Estados Unidos e da Europa para a Ásia, cabendo destacar, no interior desta, a extraordinária ascensão da China. Este movimento da história foi realçado pela crise econômica internacional, irradiada dos EUA, e tende a ser acelerado por ela na medida em que desperta a consciência da necessidade de uma nova ordem mundial.
O declínio da hegemonia norte-americana, nos planos econômico e político, é um fato hoje amplamente reconhecido, o que confirma a análise sobre o tema aprovada pelo 11º Congresso do PCdoB, à época objeto de forte polêmica. O fenômeno é o resultado histórico concreto e “natural” de uma lei objetiva que preside o processo de reprodução do sistema imperialista: o desenvolvimento desigual das nações.
Ao longo dos anos, o crescimento desigual das economias nacionais (indicado pela evolução dos PIBs, comércio exterior e exportação de capitais) promove uma subversão silenciosa da correlação de forças entre as nações, primariamente na esfera econômica, resultando na ascensão e queda das potências e erodindo as bases objetivas em que se assenta a ordem imperialista.
Associado a outros fenômenos, como o parasitismo, o desenvolvimento desigual, conforme notou Lênin, é caracterizado pela decomposição mais ou menos lenta da potência hegemônica.
Os dois principais aspectos do desenvolvimento desigual em nossa época são, de um lado, o declínio dos EUA e, de outro, a vertiginosa ascensão da China. Não é um quadro ainda estratificado. Vivemos uma época de transição em que não se descarta que outras potências possam emergir como
contendoras de peso no cenário mundial.
A decadência relativa do poderio econômico dos Estados Unidos é um processo histórico que não foi desencadeado pela atual crise econômica. Tampouco estará resolvido quando o ciclo da reprodução capitalista se inverter e a economia americana se recuperar da severa recessão que a perturba neste momento. O declínio transcorre há mais tempo. Ganhou impulso a partir dos anos 1970, após o fim do lastro do dólar em ouro.
Na verdade, o sistema imperialista internacional funcionou sem muitas perturbações, do ponto de vista econômico, no período compreendido entre o pós-Segunda Guerra e os anos 1970, à base do acordo monetário assinado em Bretton Woods em 1944, que estabeleceu o padrão dólar-ouro e o câmbio fixo no comércio exterior – o que permitiu notável estabilidade financeira, a amenização das crises cíclicas, o “pleno emprego” na Europa e índices robustos de crescimento econômico. Época em que, na Europa, floresceu o chamado Estado de bem-estar social, anos de crescentes conquistas para a classe trabalhadora no velho continente. Foram, conforme definiu o historiador E. Hobsbawn, “os anos dourados” do capitalismo.
O clima mudou a partir dos anos 1970 – o desenvolvimento desigual (recuperação do Japão, da Alemanha e França, principalmente, refletida na exportação e no acúmulo de superávits comerciais em dólares cuja troca por ouro passou a ser exigida) – e os gastos da guerra no Vietnã inviabilizaram o padrão monetário estabelecido em Bretton Woods e levaram o presidente Richard Nixon a decretar unilateralmente o fim do lastro do dólar em ouro para preservar as reservas de Fort Knox (consumidas pela guerra do Vietnã e o déficit comercial).
Com o fim do padrão dólar-ouro (1971) e a substituição do câmbio fixo pelo câmbio flexível ou flutuante (a partir de 1973) os países capitalistas mais desenvolvidos (e o sistema capitalista internacional) ingressaram numa fase crítica de desenvolvimento, caracterizada pelo progressivo declínio das taxas de crescimento dos PIBs, configurando uma tendência à estagnação (que não foi superada), bem como por um aumento substancial das taxas de desemprego, especialmente na Europa. A crescente desregula- mentação financeira, a liberalização dos fluxos de capitais e das taxas de câmbio sepultaram o período de estabilidade financeira. A partir daí o sistema ingressou numa zona de forte instabilidade monetária, que não só atravessou a década de 1970 (exigindo em 1979 uma forte alta das taxas de juros nos EUA para salvar o chamado padrão dólar-flexível), mas vem evoluindo e se agravando desde então, desembocando na crise atual. As crises cíclicas de superprodução tornaram-se mais agudas e radicais a partir da crise de 1974-75 (que não se resumiu à crise do petróleo). A eficácia das intervenções anticíclicas do Estado capitalista foi significativamente reduzida ou mesmo anu lada. No final da década, as políticas keynesianas, desmoralizadas pelos fatos, foram abandonadas e substituídas pelo neoliberalismo – nos go vernos da dama de ferro Margareth Thatcher na Inglaterra, e Ronald Reagan, nos EUA –, que também não se mostrou eficiente e acrescentou novos problemas ao sistema. Observou-se desde o início da década de 1970 a mudança no padrão e no modelo de desenvolvimento do capitalismo nos países mais industrializados. O fim dos anos dourados, de notável prosperidade, crises brandas, intervencionismo estatal e pleno emprego, cedeu lugar a baixo crescimento, altas taxas de desemprego, fortes crises e Estado mínimo. Como pano-de fundo deste movimento histórico projeta-se a decadência econômica do imperialismo estadunidense. A força-motriz desta decadência foi o acúmulo de déficits comerciais, refltindo uma crescente perda de competitividade e mercado por parte da indústria norte-americana, que se desdobrou num endivida mento excessivo e numa crescente necessidade de financiamento externo, estimada em quase 1 trilhão de dólares por ano.
Se aprofundarmos a análise, perceberemos que o déficit comercial, assim como o déficit em conta-corrente que resulta daquele, reflete uma carência de poupança interna que traduz uma baixa taxa de acumulação doméstica de capital. A nova condição dos EUA, de maior devedor do mundo, arvorada pelo imperialismo como um sinal de força e por economistas de pouca imaginação como um privilégio originado da supremacia do dólar, na realidade transformou o país num importador líquido de capitais, traduzindo sua relativa decadência como investidor global. Conforme assinalou o historiador marxista inglês Eric Hobsbawn, o “declínio relativo” da economia estadunidense, um processo histórico que em sua opinião começou logo após a Segunda Grande Guerra, “continua”. Não é mais o gigante industrial global. “O centro do mundo industrializado está rapidamente mudando para a parte mais oriental da Ásia”. Há vários indicadores desta decadência, que se expressa no plano industrial, comercial e mesmo monetário. O sintoma mais agudo e significativo, destacado por Hobsbawn, consiste no fato de que os EUA deixaram de ser um exportador líquido de capitais e dependem a cada dia mais da boa vontade dos investidores estrangeiros para rolar suas dívidas. “Diferentemente dos antigos países imperialistas e da maioria dos países industriais desenvolvidos”, observa, “os EUA deixaram de ser um exportador líquido de capital ou o maior ator no jogo internacional de aquisição ou criação de empresas em outros países e a força financeira do Estado repousa na constante disposição de outros, na maioria asiáticos, a sustentar um déficit fiscal que de outro modo seria intolerável” (“A sombra que nos protege”, texto de Eric Hobsbawn publicado pelo jornal Folha de São Paulo (caderno “Mais”, 06-11-2005). Aqui convém observar que a exportação de capitais é a forma, por excelência, da expansão do capital no exterior e, portanto, do domínio e influência econômica das potências imperialistas. Fornece, por isto, o critério fundamental para medir a ascensão ou queda relativa das potências capitalistas. Outro sinal que podemos classificar entre os mais relevantes do processo de decadência é a queda dos EUA no ranking mundial da exportação de mercadorias, tendo sido ultrapassado pela Alemanha em 2005 e pela China a partir de 2007, deslocando-se para a terceira posição. Conforme Marx já assinalava, a exportação de mercadorias é parte integrante da circulação do capital industrial, sendo de fato uma condição para a realização do capital destinado à exportação. A exportação de mercadorias constitui, em certo sentido, exportação de capital, embora também se diferencie desta. Por outro lado, a ascensão da China é indicada pelo PIB, o segundo maior do mundo no critério de paridade de poder de compra, pela crescente participação no comércio exterior e as reservas de quase 2 trilhões de dólares, que conferem ao país a condição de credor e grande investidor internacional. As reservas e o comércio exterior ancoram e impulsionam a expansão da influência econômica da China na Ásia, na África, na Europa, América Latina e nos próprios EUA.
Luta anti-imperialista, por uma nova ordem
Naturalmente, a mudança da correlação de forças no plano econômico provocada pelo desenvolvimento desigual tem implicações no plano geopolítico, pois a diplomacia, como os canhões, costuma trilhar as mesmas rotas da produção e do comércio. A política segue os passos da economia, embora o compasso e o andamento dessas duas esferas das relações sociais nem sempre sejam coincidentes. Depois de ganhar a chamada guerra fria, com a queda do Muro de Berlim (1989) e o colapso da União Soviética (1991), os EUA pareciam no auge do domínio político no mundo, com seus governantes incorrendo num radical unilateralismo e proclamando que também o século XXI seria um novo século americano. Daí o anúncio (1991) da “nova ordem mundial” de Bush pai. Num momento como o que estamos vivendo, de crise em toda a linha, vale lembrar as palavras de George Bush, pai, em discurso sobre o estado da União, pronunciado em 1992: “Pela graça de deus, a América venceu a guerra fria. (…) Um mundo uma vez dividido em dois campos armados, hoje reconhece apenas uma só potência proeminente, os Estados Unidos da América. (…) Somos os Estados Unidos da América, o líder do Ocidente que se tornou o líder do mundo”. A embriaguez de uma vitória que se revelaria efêmera uma década e meia depois, já encerrava um paradoxo, pois desde aquela altura a decadência econômica já estava em curso e o parasitismo da sociedade, traduzido na capacidade de viver à custa alheia, se agigantava.
A experiência histórica sugere que, cedo ou tarde, o declínio econômico é acompanhado, objetivamente, pelo declínio político. Isto pode ser percebido na América Latina, onde o peso relativo da economia americana caiu, perdendo espaço para a União Europeia e a China. A dependência econômica do Brasil e de outras nações em relação ao império diminuiu significativamente, respaldando movimentos políticos que buscam um caminho autônomo e soberano de desenvolvimento, a diversificação do comércio e a integração regional. A derrota da Alca é um claro indicador do que estamos falando, e para além dos fatores políticos relacionados com a emergência de governos progressistas também reflete o enfraquecimento dos EUA como protagonistas econômicos na região.
A partir do final dos anos 1990, com o esgotamento das políticas ditadas pelo chamado Consenso de Washington, presenciamos a ascensão de governos progressistas com diferentes matizes em importantes países da América Latina e a mudança do cenário político, cada vez mais caracterizado pela contestação da hegemonia dos EUA na região. A rejeição da Alca foi certamente um marco neste movimento, no qual cabe também ressaltar a criação da Unasul, da Alba, as iniciativas por um Conselho de Defesa da América do Sul e pela ampliação do Mercosul. A expressão mais significativa desse movimento foi a realização em dezembro passado na Costa do Sauípe, Bahia, da primeira cúpula da verdadeira América, a nossa América, sem a presença de forças imperialistas, seja o imperialismo estadunidense ou as antigas potências coloniais. Uma cúpula que consagrou Cuba como integrante de fato e de direito do sistema interamericano, ao arrepio dos interesses dos Estados Unidos e dos seus aliados.
A guerra contra o Iraque, desencadeada de forma unilateral pelos EUA, com apoio da Inglaterra, também contribuiu para o desgaste político do império e ensejou protestos na Europa (Alemanha e França), China e Rússia, estimulando um movimento de realinhamento político que, em meio aos vaivéns próprios das alterações de conjuntura, permanece em curso.
A correlação de forças entre as nações na atualidade difere radicalmente da que sobreveio do pós-Segunda Guerra e mesmo da que sucedeu o fim da guerra fria. O declínio relativo dos Estados Unidos inviabiliza a manutenção da ordem internacional fundada no pós-guerra, sustentada na diplomacia do dólar, e lança o mundo num período de transição.
Também significa claramente a decadência das instituições supostamente multilaterais fundadas no pós-Segunda Guerra, especialmente as de Bretton Woods e derivadas: FMI, BIRD, OMC (sucessora do GATT), G-7 (que, em função do desenvolvimento desigual, já não reúne as sete maiores economias do mundo como na época em que foi fundado, em 1975). Também a ONU passa por processo de erosão, proclamada como irrelevante por George W. Bush e impotente para deter a mão assassina de Israel no genocídio que perpetra contra a Palestina.
Generaliza-se a constatação de que tais instituições estão em vias de esgotamento, o que dá lugar a uma viva polêmica sobre as alternativas de configuração de uma nova ordem mundial. Fala-se em reforma do FMI, do BIRD e da própria OMC e aposta-se no G-20 financeiro, com a expectativa de abrir espaço aos “emergentes”. Mas, serão tais instituições reformáveis? Tal reforma mereceria o apoio dos comunistas e demais forças anti-imperialistas? De outro lado, os EUA e outras potências estão dispostos a abrir-mão pacificamente de suas posições, resignando-se a uma posição secundária em relação ao papel que desempenham hoje ou à redistribuição do poder? Os fatos apontam noutra direção. Em primeiro lugar, sobram sinais e evidências de que os Estados Unidos reagem à sua própria decadência fortalecendo a supremacia militar, aumentando a agressividade contra os povos e fomentando a militarização e a corrida armamentista. As guerras contra o Iraque e o Afeganistão – cujo custo, de acordo com estudos do economista J. Stiglitz, sobe a mais de 3 trilhões de dólares – pros seguem. Os planos para a retirada do Iraque são vagos. Depois de empossado Obama, o Pentágono anunciou que necessita de 23 meses. Quanto ao Afeganistão, elevado à categoria de palco principal da “guerra ao terrorismo”, segundo o novo ocupante da Casa Branca, continuará recebendo tropas norte-americanas e da OTAN. Na América Latina a reativação da 4ª Frota é uma demonstração das opções militaristas do imperialismo norte-americano e de que este reage duramente à contestação da sua hegemonia pelos governos progressistas da região. É fato que o desenvolvimento objetivo das economias provoca mudanças no sentido da multipolaridade, ao promover a ascensão de novos países à condição de potências econômicas. Mas isto não significa necessariamente que esteja naturalmente em curso uma transformação democrática das relações internacionais, porquanto permanece intacto o poder do imperialismo e não há sinais de que os EUA este jam dispostos a ceder poder seja aos povos e nações que lutam por soberania e progresso social, seja às potências concorrentes. É ilusão supor que o mundo avança espontaneamente no rumo de uma transição da unipolaridade estadunidense para a multipolaridade e do unilateralismo ao multilateralismo. As iniciativas concretas do imperialismo vão noutra direção e aqui cabe lembrar o pensamento de Lênin que, a nosso ver, não perdeu atualidade: o imperialismo tende em política à reação e à guerra que, sob este prisma, ainda segundo Lênin, é inevitável. O que está sendo preparado não é um cenário de transição pacífica para a multipolaridade e o multilateralismo, o que seria desejável, mas o ambiente e as condições para novos conflitos bélicos visando à redivisão de áreas de influência em todo o mundo.
A paz não é uma vocação do impe rialismo. A agressividade do imperialismo ganhou novo impulso com o governo Bush. Independentemente da boa vontade do novo presidente, Barak Obama, é estreitíssima a margem de manobra e nula a vontade de quem realmente decide para alterar esta situação. Para os que fazem leitura apressa da e interesseira do que sai publicado, vale o alerta de que Obama tanto na campanha eleitoral como depois da posse já deu várias declarações de que pretende agir para recompor a hegemonia dos EUA e não trabalhar para uma situação de multipolaridade em que Washington teria de se conformar em redistribuir poder. De um ponto de vista de classe, traduzindo os interesses e objetivos imediatos e futuros da classe trabalhado ra, é indispensável combater as ilusões neste sentido. O caminho da paz, da construção de uma ordem internacional democrática e do predomínio do direito internacional passa pela luta sem tréguas contra o sistema imperialista, luta que é em essência, anticapitalista. O agravamento da crise estrutural e sistêmica do capitalismo e as mudanças políticas que implica põem na ordem-do-dia a luta pelo socialismo, o que instiga e desafia a inteligência coletiva das forças comunistas e anti-imperialistas a desvendar os caminhos concretos da acumulação de forças para atingir este elevado objetivo que corresponde à emancipação da humanidade.
José Reinaldo Carvalho é jornalista, especialista em Política e Relações Internacionais, diretor do Cebrapaz e secretário de Relações Internacionais do Partido Comunista do Brasil.
Umberto Martins é jornalista, membro da equipe de análise da CTB (Central dos Trabalhadores do Brasil), diretor do Cebrapaz e colaborador do Departamento de Relações Internacionais do Partido Comunista do Brasil.
EDIÇÃO 100, MAR/ABR, 2009, PÁGINAS 52, 53, 54, 55, 56, 57