1981. Um alvoroço. A anistia fora conquistada dois anos antes e, embora a ditadura militar ainda vigorasse, o cheiro forte de liberdade já irrompia. As ruas eram retomadas por trabalhadores e estudantes. A frente oposicionista começava a preparar a “ofensiva final” pela democracia. Havia uma gestação de novos partidos, e o histórico Partido Comunista do Brasil (PCdoB), semiclandestino, logo ganharia as praças pela sua legalidade.

Nesse ambiente entrava também, em ebulição, a vida intelectual do país. Florescia o debate de ideias. E afloravam as divergências sobre os caminhos… João Amazonas, ex-deputado constituinte de 1946, destacado líder do PCdoB, estava no olho desse redemoinho. Entremeio a essa azáfama – quando já eram tantas as tarefas – ele diz a seus companheiros: a jornada do movimento revolucionário é de longo curso. É preciso uma revista que à luz do marxismo perscrute os dilemas da luta presente, investigue a realidade brasileira e internacional e fundamente o futuro de nosso movimento.

Assim, sob essas circunstâncias e com esses propósitos, em março de 1981, nasce a revista Princípios. Hoje, comemoramos o seu número 100 e 28 anos de circulação ininterrupta. Essa longevidade de Princípios vem de sua fidelidade àqueles propósitos que a fizeram nascer e, obviamente, da fertilidade das ideias que propaga. Seu índice remissivo demonstra o precioso rol de intelectuais, jornalistas, cientistas, artistas, lideranças políticas e sociais que, ao longo do tempo, voluntariamente ofereceram suas contribuições. Seu êxito vem, ainda, do fato de ser uma obra coletiva à qual, ao longo do tempo, se dedicaram várias equipes de trabalho.

Percorrer mais de sete mil e quinhentas páginas de sua coleção é fazer uma viagem ao itinerário da elaboração teórica e política de uma destacada corrente do movimento marxista brasileiro. Sua evolução registra os aportes analíticos e teóricos que ofereceu ao movimento transformador e, obviamente, os dilemas, equívocos e crises por que passou. Este rico acervo, agora, é disponibilizado, na sua coleção de 100 edições, disponível em DVD, com 1584 textos, produzidos por 455 colaboradores, abordando os mais diversos temas.

100% em defesa do Brasil e do socialismo!

Em seu percurso, a revista buscou interpretar o Brasil. Sua história, pujança e desigualdades. Deformações e potencialidades. Seu povo, sua cultura. A luta pela afirmação de sua soberania e vida democrática. O combate às desigualdades sociais.
Nos anos 1980 empenhou-se pela consolidação da redemocratização do país. Procurou influenciar os debates da Assembleia Constituinte.

No início da década de 1990, diante da crise do socialismo, enfrentou o vendaval anticomunista e participou ativamente do labor que sublinhou o legado da União Soviética à humanidade e, simultaneamente, examinou os erros e os condicionantes que levaram à sua derrocada. Nesta luta de ideias, contribuiu para reafirmar o socialismo em bases novas. Neste mesmo período, também se dedicou a desvendar do ponto de vista teórico e político o caráter nefasto do neoliberalismo, bem como os caminhos para seu enfrentamento e superação.

A revista, hoje, participa da elaboração de um novo projeto nacional de desenvolvimento cuja realização passa pelo êxito do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Nesse sentido, critica a corrente “continuísta” que freia o ritmo da concretização do programa com o qual o presidente foi eleito e apresenta ideias, propostas que contribuam para o avanço das mudanças. Defende a soberania nacional e a integração solidária da América Latina.

Ante a guerra imperialista suas páginas têm publicado libelos em defesa da paz e dos direitos dos países ao desenvolvimento e à soberania. Princípios se dedica, com especial interesse, a debater e divulgar a nova luta pelo socialismo que brota dos paradoxos do capitalismo contemporâneo e da consciência e luta dos povos.

Os artigos, entrevistas, resenhas, estudos, pesquisas que publica se vinculam ao seu objetivo de enriquecer e desenvolver o marxismo, sem o que não se vai ao longe.
A cultura e a ciência também comparecem às suas páginas. Sobretudo agora quando as contradições do capitalismo trazem a barbárie à cena da história, realça-se o papel da cultura e da arte na jornada libertária dos trabalhadores e dos povos. Por outro lado, o pensamento marxista sempre que se conectou com a evolução das ciências conheceu avanços, além de seu papel e da inovação tecnológica no projeto nacional.

A temática ecológica e a concepção de um projeto de desenvolvimento que harmoniza o crescimento econômico com a preservação ambiental – em contraposição à lógica do lucro máximo que destrói o meio ambiente – fazem parte de sua linha editorial.

Princípios número 100, uma conquista da corrente marxista e progressista do nosso país! Homenageamos a todos os que contribuíram para este feito, destacando o legado de seu fundador, João Amazonas.

Com este número 100, aumenta a responsabilidade de Princípios de oferecer à sua comunidade de leitores uma revista cada vez mais à altura dos desafios teóricos e políticos de nosso tempo.
Nossos agradecimentos a todos os que contribuíram com esta jornada e que nos incentivam a seguir adiante.

Com a crise capitalista, para onde vamos?

O mundo segue sob os efeitos destrutivos da maior crise capitalista desde a depressão de 1929. Já se sabe que a economia mundial sofrerá uma contração em 2009, resta ver, em que dimensão. Nova crise, velha receita. Os prejuízos são empurrados sobre os povos e os trabalhadores. Mês a mês, centenas de milhares de postos trabalho são eliminados. As estimativas variam de 18 milhões a 50 milhões de novos desempregados só neste ano. Os países em desenvolvimento recebem os impactos tanto da recessão quanto do protecionismo dos países ricos.

Uma lista – da qual fazem parte Índia, Rússia e, principalmente, a China – absorve com menos danos os efeitos da crise. A China, por exemplo, com investimento público em infraestrutura e estímulo ao mercado interno, atua para que haja um crescimento de 8% em meio à tormenta. Com isto, se credencia a insurgir-se com mais relevo na arena internacional.

O governo Lula, com base nas suas conquistas e num conjunto de medidas positivas anticrise que adotou, busca minorar os prejuízos sobre a economia e manter o crescimento. Todavia, o Brasil se ressente da orientação ortodoxa e monetarista que regeu e rege o Banco Central. Enquanto isso, a oposição neoliberal roga pragas e torce pelo pior. É preciso do governo mais audácia para garantir a defesa da economia nacional e os direitos dos trabalhadores. Questão-chave à sucessão presidencial.

Que mundo resultará desta crise? Mesmo em declínio, os EUA com seus oligopólios não irão abdicar pacificamente de suas ambições e posições. Por isso há riscos e ameaças. Na Europa, embora cresça a luta dos trabalhadores, a direita e mesmo a vertente herdeira do fascismo se fortalecem. A crise incide sobre uma transição mundial em que uma das tendências é a construção de uma ordem multipolar, distinta da atual, marcada pela regência unipolar do imperialismo estadunidense. Ela acelera as transformações pelos quais o mundo passa e cabe ao campo democrático e progressista atuar localmente e mundialmente para que a resultante seja favorável aos povos.

Os estragos da crise desmascaram os dogmas neoliberais. E o capitalismo revela com mais agudeza os seus limites históricos, ao golpear as conquistas civilizatórias que a luta dos povos conquistou. É claro que o capitalismo não está com a vela na mão e nem sairá da cena da história por morte natural. Ele precisa ser confrontado mundialmente e vencido no âmbito de cada país pelo movimento revolucionário. Objetivo que demanda acumulação de forças e movimentos táticos apropriados a cada país. Mas o fato é que diante de tal crise, o socialismo emerge como uma alternativa rejuvenescida e viável e o marxismo é novamente valorizado.

Adalberto Monteiro
Editor

EDIÇÃO 100, MAR/ABR, 2009, PÁGINAS 3, 4