Um dia para a consciência
Nossos vereadores continuam legislando sobre o vazio. Se saírem de seus gabinetes refrigerados, do meio da chusma de aduladores assalariados pelo contribuinte, poderão ver que a cidade geme, chora e sangra em muitos lugares. Este início do segundo governo do Prefeito Íris Resende tem sido um embarque na Arca de Noé. Para manter em exposição suas insólitas figuras, conseguir embarcar afilhados nos cargos comissionados, alimentar projetos de sobrevivência política e negociações para dois mil e dez, movem céus e terras. Os aguerridos legisladores querem criar mais um feriado, a pretexto de homenagear a consciência negra. Mais um dia de ócio, como se a consciência negra, branca, vermelha ou amarela, se existem tais categorias, necessitasse de descanso. Não é novidade que negros, índios, brancos pobres e migrantes despossuídos têm sido tratados com pouco respeito e justiça na nossa história. Mas não se pode, em nome de motivos humanitários, desconhecer a originalidade do processo formador de nossa gente. Não venham transformar nossa pluralidade étnica, nossa rica e criativa diversidade em aldeias, guetos e quilombos para oportunistas. Convido os senhores vereadores para examinar a violência que escandaliza a cidade. Vamos ver a meninada solta na rua, cheirando cola, iniciando-se na criminalidade. Que tal, ver as agressões ao patrimônio ambiental, como o descalabro do desmatamento do Jóquei Clube, sobre que nossos legisladores guardam esotérico silêncio? Que tal, dar uma voltinha de ônibus, no horário de pico, principalmente nas linhas da periferia? E situação desconfortável dos currais de integração? Já se pensou em um projeto para recuperar os regatos que atravessavam Goiânia? E as invasões milionárias de praças, vales, margens de nossos córregos? Quem der uma olhada no rio Meia-Ponte poderá ver que a cidade não aprendeu a tratar seus dejetos. A situação caótica do trânsito alimentado com repressão e multa? A destruição da feição original da cidade, o desapreço pelos poucos monumentos existentes? Na exuberância do crescimento desordenado, na especulação imobiliária? Há muitos débitos que rosnam subterrâneos. E Goiânia, que acolhe gente do mundo inteiro, pelas oportunidades que oferece, não merece assistir a sessões circenses de seu legislativo. Sugiro aos senhores edis que esqueçam um pouco a briga por cargos comissionados, por sinecuras, pela sanha de aumentar seus patrimônios e olhem para a cidade e a gente que os elegeu. Que bom seria um dia para a consciência branca? Outro para a consciência índia. Um para a consciência nipônica, italiana, gay? Não abro mão do dia da consciência mestiça. Tudo com direito a ócio, passeatas, shows e, se possível com boas cervejadas. Também tenho outras reivindicações: um dia para os artistas, principalmente para os poetas. Esses, pelo menos vão cantando suas utopias, seu serôdio amor pelas árvores, pelos pássaros, pela lua e por esquecidos sentimentos humanos. Homenagens merecidas. Distrairiam os legisladores das suadas lutas por cargos e outros afazeres, sobre os quais a cidade vem fechando os olhos.