Cerca de 150 pessoas lotaram o auditório Rio Solimões da Universidade Federal do Amazonas na noite do dia 14 de julho de 2009 para um dos mais concorridos eventos da 61º Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Cientistas, professores, estudantes e autoridades políticas e acadêmicas prestigiaram o debate “Amazônia: Ciência e Cultura”, que reuniu personalidades como o célebre poeta amazonense Thiago de Mello; o presidente de honra da SBPC e coordenador do projeto Museu da Amazônia Ennio Candotti; o deputado estadual licenciado e atual secretário da Produção Rural do governo do Amazonas Eron Bezerra, e o presidente da Associação Nacional de Pós-Graduandos Hugo Valadares.

Coordenada pelo historiador Augusto Buonicore, a mesa – promovida pela Fundação Maurício Grabois com o apoio da Associação Nacional de Pós-Graduandos – fez parte da programação oficial da 61º SBPC. A ocasião serviu

Cerca de 150 pessoas lotaram o auditório Rio Solimões da Universidade Federal do Amazonas na noite do dia 14 de julho de 2009 para um dos mais concorridos eventos da 61º Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Cientistas, professores, estudantes e autoridades políticas e acadêmicas prestigiaram o debate “Amazônia: Ciência e Cultura”, que reuniu personalidades como o célebre poeta amazonense Thiago de Mello; o presidente de honra da SBPC e coordenador do projeto Museu da Amazônia Ennio Candotti; o deputado estadual licenciado e atual secretário da Produção Rural do governo do Amazonas Eron Bezerra, e o presidente da Associação Nacional de Pós-Graduandos Hugo Valadares.

Coordenada pelo historiador Augusto Buonicore, a mesa – promovida pela Fundação Maurício Grabois com o apoio da Associação Nacional de Pós-Graduandos – fez parte da programação oficial da 61º SBPC. A ocasião serviu também de palco para o lançamento das duas últimas edições da revista Princípios (nºs 100 e 101) e para a apresentação da nova diretoria estadual da Fundação Maurício Grabois.

Os desafios do desenvolvimento na Amazônia

O debate teve início com a intervenção do presidente da ANPG, Hugo Valadares. Ele destacou a necessidade de desenvolver o Norte do país e ocupar a Amazônia, região que, por sua biodiversidade e suas riquezas hídricas e minerais, tem sido cada vez mais cobiçada pelas grandes potências. Para enfrentar os desafios relacionados à Amazônia é necessário multiplicar investimentos na formação de recursos humanos de alta qualificação, fortalecendo em particular os núcleos de pós-graduação da Amazônia. Essas medidas, conforme afirmou Valadares, são imprescindíveis para a promoção do desenvolvimento sustentável, evitando a biopirataria e a degradação ambiental.

Para Eron Bezerra, que fez uso da palavra em seguida, é papel da ciência encontrar os meios adequados para assegurar, de forma sustentável, a existência humana sobre a face da Terra. Seria “anticientífico e reacionário”, nas palavras do deputado amazonense, imaginar, por um lado, que possa existir uma ação econômica sem qualquer tipo de impacto ambiental, e, por outro, que a sociedade e a natureza possam permanecer para sempre inalteradas, sem quaisquer intervenções visando ao desenvolvimento sócio-econômico. Na visão de Eron Bezerra, entre os principais desafios relacionados à Amazônia estão a ampliação do conhecimento sobre essa área estratégica; a promoção do respeito à cultura e aos direitos das minorias étnicas; a luta pela soberania dos brasileiros sobre a região – repudiando o título, supostamente “honroso”, de “patrimônio da humanidade” –, e a necessidade de promover o desenvolvimento da Amazônia através de alternativas econômicas sustentáveis.

Ennio Candotti centrou sua intervenção na necessidade de um modelo de desenvolvimento que respeite as especificidades sócio-econômicas e culturais da Amazônia. A construção desse modelo é, segundo ele, tarefa que requer investimentos maciços em educação, ciência e tecnologia. “A Suframa possui algum programa de pesquisas relacionado à produção de hidroaviões? Não. E por quê? Por que não temos ainda um programa voltado para soluções desse tipo, adequadas à realidade da Amazônia?”, perguntou o cientista.

Candotti destacou a existência de sítios arqueológicos inexplorados na região amazônica, com vasos e outras peças repletas de grafismos. “É preciso enviar para lá jovens antropólogos, arqueólogos, linguistas e semiólogos que se dediquem a decifrar tudo aquilo. Isso é uma grande contribuição da ciência para o resgate cultural da civilização amazônica: isso é ciência e cultura, e também sociedade e história”, afirmou Candotti. Para ele, é inaceitável que, em um dos lugares com maior diversidade linguística do mundo, não haja um único instituto dedicado à pesquisa nessa área.

O presidente de honra da SBPC encerrou sua intervenção afirmando que conhecer mais e melhor a Amazônia é necessário inclusive para que possamos estabelecer um novo olhar sobre a floresta e os povos que nela vivem. “Devemos valorizar as culturas indígenas, inclusive porque os índios têm respostas para todos nós que desejamos viver na floresta. Não haverá paz enquanto não construirmos uma civilização a favor, e não de costas para a realidade da floresta”, finalizou Candotti.

Ciência e poesia

Sob aplausos, o poeta Thiago de Mello abriu sua fala recitando o famoso poema Volto armado do amor, que afirma: “Volto armado de amor / para trabalhar cantando / na construção da manhã. / Amor dá tudo o que tem./ Reparto a minha esperança / e planto a clara certeza / da vida nova que vem”.

Thiago mesclou em sua intervenção assuntos diversos, relacionados à sua vida e à sua convivência com a floresta. Falou de sua convivência com Pablo Neruda, de seus cinco livros que versam sobre a temática da Amazônia e, também, das conexões, nem sempre óbvias, entre ciência e cultura. “Como a poesia, também a ciência é uma espécie de dom. O (telescópio) Hubble é pura poesia, assim como inúmeras descobertas arqueológicas que têm sido feitas, envolvendo a existência de antigas civilizações amazônicas tão avançadas quanto Grécia ou Roma.”

O poeta falou também sobre a questão de um modelo de desenvolvimento para a Amazônia, tema abordado pelos palestrantes anteriores: “Como digo no livro que escrevi sobre a região de Mamirauá, preservar a floresta é elevar a qualidade de vida do homem que nela vive. Depois desse livro ouvi dizerem que eu, além de poeta, tinha me revelado um grande cientista, ao que respondi: nem cientista nem poeta, humanista”.

Narrando sua experiência de vida, Thiago de Mello afirmou ainda que desde pequeno aprendeu a prestar atenção às desigualdades sociais e regionais. “Sou socialista. Creio que é sim possível a construção da nova sociedade, uma sociedade justa, fraterna. O capitalismo não tem alma, ele só existe para o lucro.” Sobre sua amizade com a militância do Partido Comunista do Brasil, o poeta contou um curioso episódio: “Algumas pessoas supostamente de esquerda me perguntam: como você pode apoiar o PCdoB, que faz aquelas alianças esquisitas? E eu respondi: quem tem ideologia e confia na sua estratégia não tem medo de alianças táticas. Taí a China que não nos deixa mentir”.

Universidade itinerante

A 61º Reunião Anual da SBPC foi aberta no último domingo (12/07) no Largo de São Sebastião, onde se localiza o Teatro Amazonas, um dos símbolos da cidade de Manaus. Cerca de 10 mil pessoas entre locais e visitantes participam do evento, que se estende até a próxima sexta (17/07). Verdadeira “universidade itinerante”, a Reunião Anual deste ano oferece cerca de 160 atividades entre conferências, simpósios, mesas-redondas, grupos de trabalho e encontros, além de uma exposição com 2.290 pôsteres científicos de 50 universidades e fundações de pesquisas de 20 estados do país e do Distrito Federal. No âmbito da Reunião Anual ocorre ainda a SBPC Jovem, que reúne 3.500 jovens do ensino fundamental e médio de escolas públicas, com os objetivos de despertar o interesse dos jovens pela ciência e de aproximar pesquisadores renomados e estudantes.

Participam da programação científica importantes pesquisadores de todo o Brasil. Entre os temas mais discutidos estão a questão amazônica sob a ótica da ciência e da tecnologia, o bicentenário de Charles Darwin e o aniversário de 400 anos do primeiro uso científico de um telescópio, evento levado a cabo em 1609 por Galileu Galilei.

De Manaus, Fábio Palacio