Professor Darc Costa debate estratégias de desenvolvimento
A série “Conversando com Princípios”, mediada pelo diretor de Estudos e Pesquisa da Fundação Maurício Grabois, Sérgio Barroso, recebeu, na noite da quarta-feira (31), o professor Darc Costa, no âmbito das consultas sobre o Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento do Partido Comunista do Brasil (PCdoB). Com base em temas do seu livro “Fundamentos para o Estudo da Estratégia Nacional”, ele abordou aspectos da concepção de estratégia nacional e do Estado nacional.
Darc Costa iniciou a exposição apresentando uma visão histórica sobre geopolítica para constatar que o Brasil possui condições singulares para a coesão social em torno de um projeto estratégico. “Se analisarmos os últimos cinco séculos, vemos três grandes crises — a crise da separação entre fé e ciência, no século 16, a crise da fé, nos séculos XVII e XVIII, e a crise da ciência, que vem dos séculos XIX e XX”, explicou. "A crise da fé deu origem a um mundo antropocêntrico, com o Renascimento, levou ao mercantilismo, aos descobrimentos, à descoberta da América e do Brasil, à criação do conceito de nação, de Estado nacional. A crise da fé, nos séculos XVII e VXIII, trouxe a gênese da revolução industrial e o surgimento do capitalismo. Nela surge também o moderno Estado nacional", disse Darc Costa.
Para ele, só Estados constituídos em torno da idéia de nação conseguem êxitos na estratégia de ser um país relevante no cenário mundial. “Toda periferia quer ser centro; toda barbárie quer ser culta”, explicou. “Eis o caminho que conduz toda a existência racional — o projeto de Estado, qualquer que seja, é tornar o Estado centro”, afirmou. "O moderno Estado nacional surge da crise do absolutismo, segundo o professor. “Com a Revolução Francesa, o rei deixa de ter o poder, passamos ao poder da cidadania. Assim, cada cidadão tem que ver no projeto do Estado seu próprio projeto, de forma a legitimar o Estado. Aí está a gênese do projeto nacional. O Brasil surgiu na primeira crise, e se tornou independente durante a segunda crise”, destacou Darc Costa.
Segundo o professor, o Brasil é parte da América portuguesa, afastada dos grandes centros de comércio, quase um continente, dotado de grandes recursos. “E temos um grande ativo, nosso povo. Somos um mundo posto num espaço novo. O Brasil é detentor de um povo especial. Temos características que nos fazem capazes de construir a mundialização até o final, que é o grande sonho da existência racional — um mundo que seja uma só nação. Somos antropofágicos, sincréticos, mestiços. E somos tolerantes. É sobre essa tolerância que deve surgir nossa estratégia nacional”, enfatizou.
O Brasil, disse Darc Costa, tem grande potencial para um projeto nacional. Além do território vasto, do qual apenas 30% são conhecidos, segundo ele, o país tem uma população jovem e um povo glorioso, a América portuguesa herdeira dos grandes feitos de Portugal. Ele explicou o processo de independência do Brasil, que explorou bem as contradições geopolíticas da época, e concluiu o raciocínio dizendo que o país teve um projeto nacional, na vertente interna, após 1929.
Esse projeto durou 50 anos, com Getúlio Vargas, sem Vargas, e contra Vargas, no pós-64. Ele apoiava-se em três pilares: a industrialização, a urbanização e a integração nacional. “Por trás de tudo, estava a idéia de que o Estado deve intervir toda vez que for necessário avançar — construindo o que é relevante na indústria, se a iniciativa privada não o faz, na urbanização, se a iniciativa privada não o faz, na integração nacional, se a iniciativa privada não o faz”, explicou.
Segundo o professor, agora temos outra vertente — a ação social. “Pois urbanizar não é encher cidades, é dar educação, emprego, saúde, habitação, saneamento. Um projeto nacional deve a componente social maximizada”, disse. Para Darc Costa, o projeto de Estado precisa ser articulado com a vontade nacional. Um projeto nacional, disse, precisa estar centrado na idéia de um planejamento de longo prazo — alicerçado no triângulo o que fazer, como fazer e com quais meios fazer. O determinante, disse, é o que fazer. Ou seja: as decisões políticas. Para essa finalidade, segundo o professor, é preciso criar uma “mitologia” nacional — uma vontade coletiva sintetizada no projeto nacional, que transforme o potencial do país em poder.
Outra constatação de Darc Costa foi a de que a mola do desenvolvimento é a indústria. Segundo ele, o modelo político e econômico manteve o país preso aos limites de uma modernização periférica e nunca se aproximou, de fato, de uma posição central no sistema mundial. “Conseguimos internalizar progressivamente atividades produtivas, de tipo industrial, que, em algum momento da história, sustentaram a liderança dos países centrais. Mas o problema é que tais atividades perdiam essa característica de maior acumulação justamente quando conseguíamos internalizá-las, pois elas já se encontravam sujeitas a uma intensa competição internacional que diminuía sua importância e sua rentabilidade”, explicou.
Em síntese, para Darc Costa o projeto nacional brasileiro deve ser capaz de tornar o país um centro que não seja um império; uma nação solidária, fraterna e justa. Segundo ele, o Estado é o que nos separa das hordas selvagens, é um pacto silencioso entre os homens. Ele se dá em torno de princípios comuns expressos numa constituição. "Um projeto nacional deve ter duas vertentes. A vertente externa do projeto explica como devemos nos inserir no mundo. A vertente interna deve construir nosso próprio mundo", definiu.
Para Sérgio Barroso, a presença de Darc Costa foi de grande importância para a acumulação de conhecimentos e ampliação do debate sobre o Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento. “A série ‘Conversando com Princípios’ tem trazido para este debate importantes personalidades que pensa o Brasil e o professor Darc Costa foi um reforço significativo para a formação dessa idéia de que o Brasil precisa pensar o seu futuro, o seu projeto de ser uma nação próspera, independente, democrática e fraterna”, destacou Barroso.