Bancos do mundo todo, inclusive os cinco maiores brasileiros, vão responder a um estudo de impacto quantitativo (QIS), elaborado pelo Comitê de Supervisão Bancária do BIS, que dimensionará o efeito que as novas regras terão no sistema financeiro internacional.

A expectativa é que haverá choro e ranger de dentes. As instituições internacionais estão em polvorosa com as regras propostas; dizem que elas vão cortar os lucros para níveis insustentáveis – cerca de 5% -; e reduzirão drasticamente a oferta de crédito para a economia. Para os reguladores, há muito blefe nas reclamações e é necessário reformular as regras para reduzir a alavancagem e reforçar o colchão de liquidez do sistema financeiro.

Um dos pontos mais criticados pelos bancos é o tratamento a ser dado a créditos fiscais diferidos contabilizados como capital, questão particularmente importante para os japoneses.

Mas há requisitos que afetam os bancos indiscriminadamente, como a proposta de reforçar a parcela de ações ordinárias do capital e reduzir a importância dos instrumentos híbridos e ações preferenciais, que falharam em respaldar o sistema no auge da crise. O chamado capital de nível um – o "core capital" ou "tier one capital" – pode incluir apenas ações, no futuro.

O BIS também deve mudar o índice mínimo de capitalização dos bancos, atualmente de 8% dos ativos ponderados pelo risco. O novo percentual deve ser definido no fim do ano.

O Brasil já exige um índice de capitalização maior, de 11%; e, em vários pontos, o Banco Central (BC) brasileiro é mais conservador, característica que ajudou o país a ser menos atingido pela crise financeira internacional. Agora mesmo o BC acaba de revogar a possibilidade de os bancos engordarem o capital com as provisões excedentes para inadimplência. Por causa da crise, em 2008, o BC havia autorizado esse engenhoso recurso contábil. Os bancos chegaram a aumentar o capital em R$ 13 bilhões com as provisões excedentes, o que beneficiou especialmente os grandes. Expurgar esse valor agora implica um corte de R$ 100 bilhões na oferta de crédito.

Para compensar o ajuste, os bancos brasileiros estão reforçando o capital com a emissão de dívida subordinada e de ações. Nos últimos meses, bancos grandes e médios emitiram pouco mais de US$ 4 bilhões em dívida subordinada. As instituições estão prevendo a necessidade de mais reforços para se adaptarem às novas regras do BIS, que ampliou o leque de riscos a serem cobertos.

O BIS também apresentou novas exigências de liquidez. Uma delas é a chamada regra Bear Stearns, que exige que os bancos tenham ativos líquidos suficientes para sobreviver a uma crise de 30 dias; a outra é a regra Northern Rock, que recomenda às instituições cultivar fundos mais estáveis, de longo prazo, preferencialmente pulverizados. Não foi abandonada a ideia de se criar uma taxação global sobre os ativos bancários, para formar um fundo para salvamentos bancários.

Já prevendo a reação desfavorável do mercado, o Fundo Monetário Internacional (FMI) saiu em reforço do BIS e dedicou um capítulo inteiro do Relatório de Estabilidade Financeira, divulgado nesta semana, ao redesenho da regulação financeira e risco sistêmico. As propostas são ainda mais severas. O FMI diz que os reguladores deveriam criar um ranking de bancos de acordo com a probabilidade de quebra. A classificação seria confidencial, mas serviria para estabelecer requisitos de capital extra de cada instituição. O FMI também insiste na criação das famosas provisões anticíclicas.

Apesar da gritaria, os bancos terão pouca moral para escapar das novas exigências. Acaba de ser revelado que vários maquiaram balanços recentes para apresentar resultados melhores; e bancos de investimentos, conhecidos pela inventividade, já estariam bolando novos produtos para mitigar o aperto de capital que virá. Uma das ideias é vender créditos fiscais com desconto, inclusive na forma de derivativos, sinal de que as lições do passado são rapidamente esquecidas.

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Editorial do jornal Valor Econômico