XXII Congresso Nacional de Pós-Graduandos debate “Ciência, Tecnologia & Inovação para o desenvolvimento nacional”
Em sua saudação ao plenário do Congresso, Carlos Alberto Aragão listou um conjunto de desafios nacionais na área de C&T. Na visão do presidente do CNPq, o país avançou e tem, hoje, um parque científico e tecnológico consolidado. “No entanto, a nível internacional nossa ciência não pode ser apenas participante; devemos projetá-la para uma posição de liderança internacional”. Segundo Aragão, a posição de liderança da ciência e dos cientistas brasileiros já é reconhecida em algumas áreas. Ele citou como exemplo artigo de Hillary Clinton publicado hoje no jornal O Globo em que a secretária de Estado norte-americana reconhece a liderança mundial do Brasil nas áreas de pesquisa e produção de biocombustíveis.
Aragão citou ainda a necessidade de que as empresas brasileiras invistam mais em C&T. Isso seria importante, na visão dele, não apenas para o aumento da competitividade das empresas, mas também para a geração de empregos de alta qualificação. “É necessário que as empresas invistam mais em pesquisa e desenvolvimento inclusive para empregar vocês todos aqui presentes”, afirmou.
No que diz respeito ao sistema de formação de recursos humanos para pesquisa, Aragão lembrou os avanços recentes, como o reajuste concedido para diversas modalidades de bolsas no último mês de fevereiro, e a ampliação das bolsas de iniciação científica e pós-graduação do CNPq. “O sistema ganhou mais 1200 bolsas de mestrado e doutorado, e mais 14 mil de iniciação científica. É ainda insuficiente, mas desejamos avançar mais”.
Representando o reitor da UFF, a coordenadora de pós-graduação da instituição, Suzana Moss, lembrou diversos problemas do sistema de pós-graduação que precisam ser discutidos pelos pós-graduandos. Entre eles, o comércio de teses e dissertações, hoje disseminado pela internet; o caráter excessivamente produtivista do atual sistema de avaliação adotado pela Capes, e a proibição de exercício de atividade profissional pelos bolsistas de pós-graduação. “É cruel ter de escolher entre continuar trabalhando ou dedicar-se exclusivamente às pesquisas, embora com uma bolsa irrisória”, disse Suzana.
Após calorosa saudação aos delegados presentes ao Congresso, o presidente da UNE, Augusto Chagas, afirmou que a tradição dos estudantes brasileiros sempre foi a de extrapolar suas lutas específicas, lutando por um país melhor e por uma educação de qualidade para todos. Na visão de Chagas, educação, ciência e tecnologia sempre foram fatores determinantes de desenvolvimento e bem-estar social. “E, no momento em que ganha peso em nossa sociedade o clamor pelo desenvolvimento nacional, devemos pautar com força as bandeiras relacionadas à educação e à ciência. O povo brasileiro tem conquistado uma série de avanços, mas é preciso mais. Podemos vir a nos tornar, em breve, a 5° economia do mundo, mas ainda somos um país extremamente desigual”. Em função disso, na visão de Chagas, os movimentos e entidades da sociedade brasileira precisam estar atentos à criação do Fundo Social do Pré-sal, que poderá destinar 50% de seus recursos à educação e à ciência.
O presidente da Ubes, Yann Evanovick, voltou a tocar no tema do pré-sal: “Não podemos deixar que aconteça com o nosso petróleo do pré-sal a mesma coisa que aconteceu com nosso ouro e com nosso pau-brasil, que foram esgotados sem melhorar a situação do povo brasileiro”, afirmou.
Ciência para o desenvolvimento nacional
Logo após o ato de abertura, os delegados participaram do primeiro debate do Congresso, intitulado “Ciência, tecnologia e inovação para o desenvolvimento nacional – desafio na construção de uma política de Estado”. A mesa contou com apresentações do presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, Marco Antônio Raupp; do representante do Ministério da Ciência & Tecnologia, José Montserrat, e do diretor do Sindicato dos Trabalhadores em Pesquisa em Ciência & Tecnologia de Campinas, São Paulo e região (SINTPQ), Mateus Santos.
Para Raupp, há ainda em nosso país um grande gap entre os centros de pesquisa nacionais e o setor produtivo, em particular o privado. Para o presidente da SBPC, embora tenha contribuído para o avanço da industrialização nacional, o modelo de desenvolvimento baseado em substituição de importações viciou nosso país na cópia de tecnologias e na compra de caixas pretas. “Esse fator dificultou, historicamente, os investimentos nacionais em inovação”, afirmou.
Raupp lembrou, ainda, a natureza especial das atividades de ciência e tecnologia, destacando que devem ser objeto de legislação específica. “A pesquisa científica e tecnológica não pode ser regulada pela (lei) 8666” (que regula o funcionamento das autarquias). É necessário adotar, na visão de Raupp, um marco legal adequado às atividades de ciência e tecnologia, atividades estas que lidam com a criatividade e requerem a máxima desburocratização.
O presidente da SBPC defendeu ainda a necessidade de mais investimentos em C&T na região amazônica. E, como síntese de sua intervenção, falou da necessidade de uma ciência comprometida com a sustentabilidade ambiental, econômica, social e política.
Representando o ministro da Ciência e Tecnologia, José Montserrat discorreu sobre a importância histórica de instituições como a SBPC, a qual, segundo ele, teve papel fundamental na criação do próprio MCT. Montserrat citou ainda grandes sucessos do Brasil na área científica e tecnológica, como o Programa Cbers (Satélite Sino-Brasileiro de Recursos Terrestres), considerado um dos mais importantes programas de cooperação científica entre países em desenvolvimento.
“Nosso país vive hoje um momento de grande otimismo, só comparável aos períodos de Jango e de JK. Resgatamos a atividade de planejamento da vida nacional, que estava emperrada e desmoralizada. Pela primeira vez temos um plano quadrienal de C&T”, afirmou o representante do MCT, para emendar logo em seguida: “Quando a Economist critica o Brasil por defender um Estado forte, se esquece de que esse Estado não é um Estado autoritário e patrimonialista. Não é nada disso. É um Estado democrático, aberto, transparente e criativo. O Estado é a instituição que defende o interesse público, o interesse nacional, então um Estado fraco significa o enfraquecimento do interesse público”, asseverou.
Montserrat lamentou que nossa sociedade ainda não se tenha dado conta do valor do conhecimento. “Recentemente foi inaugurado no Rio Grande do Sul um importante centro de microeletrônica. É um enorme avanço, capaz de mostrar que, mesmo lentamente, estamos avançando. Mas quem viu isso na televisão? Quem viu? Por isso costumo dizer: tomem cuidado com a nossa mídia; nem sempre ela está a favor dos interesses do país”, completou Montserrat, sob aplausos.
O representante do MCT falou ainda sobre a importância da participação dos estudantes na 4. Conferência Nacional de C,T&I, que acontece em Brasília no mês de maio. “O evento debaterá diversos temas importantes, e vocês precisam participar. É preciso debater, por exemplo, a questão da pesquisa nas empresas. Outro tema é a popularização da ciência no Brasil, que não é mais uma questão da classe média, que precisa ser levada para as classes menos favorecidas, até para ganhá-las para as causas da ciência. Hoje, pela primeira vez temos um departamento de popularização da ciência no MCT”.
Montserrat encerrou seu discurso pedindo garra aos jovens presentes. “Iniciativa, criatividade, pró-atividade. Essas são as palavras que deixaria para vocês. Corram atrás, montem grupos de pesquisa, preparem projetos, tomem a iniciativa. Nossa juventude é alegre, criativa e pró-ativa. É uma Juventude politizada, que a seu modo vem encontrando formas de participar”.
A mesa foi encerrada com fala de Mateus Santos, diretor do SINTPQ. Ele falou das conseqüências da recente crise internacional, que ocasionou corte de empregos em atividades científicas e tecnológicas. “Na Europa, o maior número de desempregados foi na área de Tecnologias da Informação (TI)”, pontuou Santos.
O sindicalista pediu mais verbas para C&T e criticou a política de incentivos fiscais às empresas privadas. “Elas precisam investir em pesquisa e desenvolvimento com o dinheiro oriundo de seu faturamento, e não com verbas públicas. A Samsung recentemente desmontou seu centro de pesquisa e desenvolvimento e montou uma fundação para fazer pesquisa com verbas oriundas de renúncia fiscal. Ora, por que não usar esse mesmo dinheiro para estatizar o Iuperj, histórico centro de pesquisas aqui do Rio que vem passando por uma grande crise?”, questionou Santos.
O CNPG é o fórum máximo do movimento nacional de pós-graduandos. Durante três dias, até o próximo domingo (18/04), os representantes de associações de pós-graduandos (APGs) e de comissões pró-APG de todas as regiões do país participarão de debates, mostras científicas e atividades culturais. Além disso, no próximo domingo os delegados aprovarão propostas para as áreas de educação, ciência e tecnologia, e elegerão a nova diretoria da Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG).
Do Rio de Janeiro, Fábio Palácio.