Com a revolução industrial, desde meados do Século XVIII, foram rompidos os limites da jornada de trabalho de 12 horas. Até aí, esta seguia o dia natural (de sol a sol), mas também a regulamentação estabelecida pelas corporações de artesãos. Mas nas fábricas os operários — homens, mulheres e crianças — passam a cumprir horários extenuantes, que chegam às 16 horas por dia, durante seis dias por semana.

A injustiça da exploração é denunciada e combatida, por revoltas operárias ainda esporádicas e “selvagens”, e por alguns escritores, líderes políticos, médicos de tendências humanistas e liberais. A organização operária é muito incipiente e severamente perseguida. Na Inglaterra, os sindicatos (trade-unions) só seriam legalmente admitidos em 1871. O poder do capital impunha-se e a regulação legal surgiu muito lentamente — em âmbito muito limitado e com uma aplicação extremamente reduzida.

Em 1802, a Câmara dos Comuns britânica aprovaria a primeira lei laboral, mas sem instrumentos para ser posta em prática. A saída foi apontada por Karl Marx e Friedrich Engels: a emancipação da classe operária tem de ser obra da própria classe operária. A idéia era tão ameaçadora para o sistema capitalista em ascensão que o próprio Manifesto do Partido Comunista, em 1848, assinalava, logo na abertura: “Um espectro ronda a Europa ― o espectro do comunismo.”

A essa altura, “poucas vozes responderam” ao apelo que fechava o Manifesto: “Proletários de todos os países, uni-vos!”, como Engels recordou no prefácio para a edição alemã de 1890. Ao redigi-lo, em 1° de Maio desse ano, regozijava-se: “Mas que está ainda viva a eterna união dos proletários de todos os países por ela fundada, e mais pujante do que nunca, disso não há melhor testemunho do que precisamente o dia de hoje. Porque hoje, dia em que escrevo estas linhas, o proletariado europeu e americano passa em revista às suas forças de combate mobilizadas pela primeira vez, mobilizadas em um único exército, sob uma única bandeira e para um objetivo próximo: o dia normal de oito horas de trabalho, a ser estabelecer por lei” (…). “E o espetáculo do dia de hoje abrirá os olhos dos capitalistas e dos senhores latifundiários de todos os países para que hoje os proletários de todos os países estão de fato unidos. Pudesse Marx estar ainda ao meu lado, para ver isto com os próprios olhos!”

Internacionalismo desde a origem

Há registros de lutas operárias, reclamando a redução do horário de trabalho, em 1825, nos Estados Unidos; em 1856, na Austrália; em 1863, na Inglaterra; em 1866, na França. Na “Mensagem Inaugural” da Associação Internacional dos Trabalhadores, fundada em 28 de Setembro de 1864, em Londres, Karl Marx já escrevia que “conquistar poder político tornou-se, portanto, o grande dever das classes operárias”, pois estas “possuem um elemento de sucesso ― o número; mas o número só pesa na balança se unido pela combinação e guiado pelo conhecimento”. “A experiência passada mostrou como a falta de cuidado por este laço de fraternidade, que deve existir entre os operários de diferentes países e incitá-los a permanecer firmemente ao lado uns dos outros em toda a sua luta pela emancipação, será castigada pela derrota comum dos seus esforços incoerentes”, assinalava o fundador da I Internacional.

“Uma condição preliminar, sem a qual todas as ulteriores tentativas para o melhoramento e emancipação terão de se revelar abortivas, é a limitação do dia de trabalho”, salientava Marx, em Agosto de 1866, nas “Instruções para os Delegados do Conselho Geral Provisório” ao 1.º Congresso da AIT (que iria reuni-se em Genebra de 3 a 8 de setembro desse ano).

Explicava que tal limitação “é necessária para restaurar a saúde e as energias físicas da classe operária, isto é, o grande corpo de cada nação, assim como para assegurar-lhe a possibilidade de desenvolvimento intelectual, relações sociais, ação social e política”. Marx assinalava que o limite legal de oito horas de trabalho por dia tinha sido exigido de um modo geral pelos operários dos Estados Unidos e previa que a aprovação desta reivindicação no Congresso iria fazer dela “plataforma comum das classes operárias em todo o mundo”.

A luta intensa desencadeada no seguimento do Congresso dos Trabalhadores de Baltimore, em agosto de 1866, levou a que, ao fim de dois anos, fosse consagrada em lei daquele Estado norte-americano a jornada de oito horas. Em 1884, a Federação dos Trabalhadores dos EUA e Canadá fez um apelo determinado: em 1º de Maio de 1886 devia ser cumprido o limite das oito horas. A determinação alastrou-se e o vazio da lei foi sendo preenchido com a luta de milhares de trabalhadores, convergindo em uma greve geral.

O 1.º de Maio de 1886 foi o primeiro de alguns dias consecutivos de greves e manifestações nos centros industriais americanos. Em um dos maiores, na cidade de Chicago, onde estavam em greve mais de cem mil operários, a repressão policial foi especialmente violenta e, no dia 3 de maio, foram assassinados seis trabalhadores em frente à fábrica McCormick — o que leva à convocação de novas ações de protesto, em âmbito nível nacional, para o dia seguinte.

É no dia 4 de maio que, na Praça Haymarket, já no final de um grande comício operário, convocado pela anarquista IWPA, a Polícia intervém para dispersar os manifestantes que restavam. Entre os quase 200 polícias explode uma bomba. Em seguida, as forças repressivas abrem fogo contra os trabalhadores desarmados. Oito líderes são presos e condenados. Em novembro de 1887, quatro deles são executados e um suicida-se. A decisão do tribunal é muito contestada — os protestos ecoam em âmbito internacional.

A exigência da jornada de oito horas, que igualmente mobilizava milhares de trabalhadores na Europa, esteve no centro das atenções dos 400 delegados ao Congresso Operário Socialista Internacional (Paris, 14 a 20 de Junho de 1889). O francês Raymond Lavigne avançou com uma proposta: organizar uma grande manifestação internacional, em uma data fixa, de modo a que os trabalhadores em todos os países e em todas as cidades, simultaneamente, em um determinado dia, exigissem dos órgãos de poder que fixassem a jornada de trabalho em oito horas e que pusessem em prática as outras decisões do Congresso Internacional de Paris.

Tendo em conta que uma manifestação semelhante fora já decidida para 1º de Maio de 1890 pela Federação Americana do Trabalho, na sua convenção de dezembro de 1888, em St. Louis, aceita-se que essa seja a data para a ação internacional que seria organizada pelos trabalhadores segundo as condições de cada país.

Da luta à festa

Rosa Luxemburgo, quatro anos depois, contava (artigo em 1894, no jornal polonês Sprawa Robotnicza) que apenas se tinha pensado numa ação única. O Congresso decidira que os trabalhadores de todos os países iriam manifestar-se em conjunto pela jornada de oito horas em 1º de maio de 1890. Ninguém falara de uma repetição nos anos seguintes. Naturalmente, não se podia prever que a idéia tivesse sucesso com a rapidez de um relâmpago e que fosse tão depressa adotada pelas classes trabalhadoras. Mas bastou celebrar o 1.º de Maio uma vez para que todos entendessem e sentissem que devia ter lugar anualmente e ser como tal institucionalizado.

O 1.º de Maio exigiu a introdução da jornada de oito horas. Mas, salientava a histórica dirigente, “mesmo após essa meta alcançada não vamos desistir do 1.º de Maio, pois enquanto a luta dos trabalhadores contra a burguesia e a classe dominante continuar, enquanto todas as exigências não forem cumpridas, ele será a expressão anual dessas exigências”. E, antecipava Rosa Luxemburgo, que quando melhores dias viessem, quando a classe trabalhadora do mundo conquistar a sua libertação, nessa altura também, muito provavelmente, a humanidade celebrará o 1.º de Maio para honrar as amargas lutas e os muitos sofrimentos do passado.

A jornada de oito horas foi proclamada num dos primeiros decretos do poder soviético, passados apenas quatro dias da vitória da Revolução de Outubro. O 1.º de Maio seguinte, em 1918, foi celebrado com a primeira parada do Exército Vermelho, em Petrogrado. “Sim, a comemoração do 1.º de Maio tornou-se verdadeiramente oficial, foi comemorado pelo Estado”, escreveria Anatoli Lunatcharski no seu diário.

“O poder do Estado tornou-se evidente de muitas maneiras. Mas não é inebriante pensar que o Estado, até recentemente o nosso pior inimigo, agora nos pertence e celebrou o 1.º de Maio como a sua maior festa? E, no entanto, acreditem em mim, se esta festa só tivesse sido oficial, nada teria produzido senão frio e vazio. Mas não, as massas populares, a Marinha, o Exército Vermelho e todos os verdadeiros trabalhadores dedicaram-lhe os seus esforços. E podemos dizer, portanto, que esta festa do trabalho nunca foi tão bonita”, escreveu.

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As informações são do jornal Avante!