O Manifesto de Stack narra a história de vida que o levou àquele ato final de desespero. A história começa na adolescência, estudante, vivendo de migalhas em Harrisburg, PA, próximo do que fora um grande centro industrial. Tinha, como vizinha, uma mulher de 80 anos, que se alimentava com ração para gatos, “viúva de um metalúrgico aposentado. O marido trabalhou toda a vida nas metalúrgicas do centro da Pennsylvania, vivendo das promessas de grandes comerciantes e do sindicato de que, em troca dos seus 30 anos de serviço, receberia pensão e cuidados médicos dos quais viveria quando se aposentasse. Em vez disso, acabou por morrer como um dos milhares que nada receberam por culpa de um gerente desonesto e um sindicato corrupto (para não falar do governo), que rasparam os fundos de pensão e assaltaram sua aposentadoria. Ela só tinha, para viver, a seguridade social”. Stack poderia ter acrescentado que houve também esforços combinados e continuados dos super-ricos e respectivos aliados políticos que até a seguridade roubaram dela, por razões as mais espúrias.

Stack então decidiu que não poderia confiar em grandes empresas e que faria greve por conta própria. Até descobrir que tampouco podia confiar no governo que nenhuma atenção dava a gente como ele, mas só aos ricos e privilegiados; nem num sistema legal no qual, nas palavras do próprio Stack, “há duas ‘interpretações’ para cada lei, uma para os muito ricos, outra para nós.” Um governo que nos deixa entregues “à piada que chamamos de sistema de saúde dos EUA, que inclui as indústrias farmacêuticas e as empresas de seguro [que] estão assassinando dezenas de milhares de pessoas por ano”, e que só cuidam de enriquecer, não de tratar de doentes ou das necessidades dos outros.

Tudo numa ordem social na qual “um punhado de ladrões e bandidos podem cometer crimes inimagináveis e, quando chega a hora de a onça beber água, e ficam próximos de morrer envenenados pela própria descomunal ambição e espantosa imbecilidade, nada há que impeça o governo federal, em peso, de acorrer para salvá-los em questão de dias, quando não de horas”. E muito mais.

Stack diz que seu suicídio foi tentativa de juntar-se aos que se oferecem para morrer pela liberdade, na esperança de arrancar outros do torpor em que vivem. Não me surpreenderia se tivesse em mente a morte prematura do metalúrgico que lhe ensinara sobre o mundo real, na adolescência.

Aquele metalúrgico não cometeu suicídio em sentido estrito, depois de descartado como lixo, e está longe de ser caso isolado; podemos somar esse e outros casos similares à lista colossal de crimes institucionais cometidos pelo capitalismo de Estado.

Há estudos pungentes sobre a indignação e a ira dos que foram postos à margem, quando programas de privatização, de financialização e de desindustrialização fecharam fábricas, destruíram empregos e famílias e comunidades. Revelam o sentimento agudo dos que se sentem traídos, trabalhadores que cumpriram todos os seus deveres sociais, conforme um compactado moral dos negócios e do governo, e que, adiante, descobriram que foram apenas instrumento para gerar lucros e poder – truísmos dos quais viveram cuidadosamente protegidos pelas instituições de doutrinamento.

Há espantosas semelhanças entre isso e o que se vê acontecer na segunda maior economia do mundo, estudada por Ching Kwan Lee, em penetrante pesquisa sobre o trabalho na China. (…) Há entre 30 e 40 milhões de trabalhadores na China que foram demitidos de unidades de trabalho, e que hoje padecem “profunda sensação de insegurança”, o que desperta neles “ira e desespero”, nas palavras de Lee. A autora espera ainda por coisa pior, à medida que se aprofunde a crise da falta de terra no interior, onde não há sequer qualquer coisa que se assemelhe a sindicatos independentes. (…) Tanto o estudo de Lee quanto os estudos norte-americanos sobre as áreas periurbanas onde se concentram as decadentes indústrias do aço e têxtil nos EUA [orig. “US rustbelt�€ ] demonstram que não se deve subestimar a profundidade da indignação moral que há por trás dos discursos furiosos, muitas vezes autodestrutivos, sempre contra “o governo” e o poder das empresas e das finanças.

Acontece também na Índia rural, onde o consumo de alimentos reduziu-se muito para a grande maioria da população, depois das reformas neoliberais, mesmo que só parcialmente implementadas; e aumenta o número de suicídios entre os camponeses, praticamente ao mesmo ritmo em que cresce o número de bilionários e de elogios ao fabuloso crescimento da Índia. Crescimento fabuloso para uns – que nada tem de fabuloso para os trabalhadores transferidos dos EUA para a Índia para diminuir os custos trabalhistas da IBM, empresa cujos ¾ da força de trabalho está hoje fora dos EUA. A revista Business Week diz, com bastante razão, que a IBM é “quintessência das empresas norte-americanas”: é hoje o gigante global da computação, graças ao exaurimento não voluntà ¡rio do contribuinte norte-americano, que também financiou em imensa escala a revolução da “tecnologia da informação” da qual hoje a IBM depende, como o resto da economia high tech. – E tudo isso foi feito sob o pretexto de que “os russos estão chegando!”

Tem havido muitos discursos excitados, nos últimos tempos, sobre uma mudança do centro do poder global, com especulação sobre se (ou quando) a China substituirá os EUA no trono de poder global dominante; ou a Índia – nesse caso, se acontecer, o sistema global terá conseguido voltar a algo que já foi antes das conquistas europeias! O crescimento do PIB de China e Índia foi, sim, espetacular. Mas isso não é tudo.

Quanto ao Índice de Desenvolvimento Humano, a Índia permanece num dos últimos lugares, precisamente em 134º. Lugar, pouco melhor que Cambodia e pouco pior que o Laos e o Tadjiquistão. A China está em 92º. Lugar, pouco pior que a Jordânia e pouco melhor que a República Dominicana e o Irã.

Em comparação, Cuba – que vive sob feroz ataque dos EUA há 50 anos – ocupa honroso 52º lugar, o melhor IDH da América Central e Caribe, perdendo por pouco para Argentina e Uruguai. Mas Índia e China também exibem terrível desigualdade, com mais de um bilhão de pessoas vivendo bem abaixo dos padrões aferidos naquela escala. E ainda faltam contabilizar vários custos que China e Índia não podem continuar a ignorar: ecológicos, consumo de recursos não renováveis e outros.

Os que especulam sobre mudanças no centro do poder global escamoteiam algo que todos sabemos: as nações que não consideram as questões da distribuição interna do poder não são os atores reais dos negócios internacionais – truísmo que foi trazido à nossa atenção obrigatória por esse incorrigível pensador radical, Adam Smith.

Foi Adam Smith quem descobriu que os protagonistas principais, os verdadeiros arquitetos do poder na Inglaterra eram os donos da sociedade; naquele momento, os mercadores e donos de manufaturas; os que asseguravam que toda a política seria feita para atender escrupulosamente os interesses deles, por mais “lutuoso” [orig. “grievous”] que fosse o impacto daquelas políticas sobre o povo inglês e, pior, por mais que houvesse vítimas “da selvagem injustiça dos europeus” no resto do mundo. Os crimes dos britânicos na Índia já eram preocupação de um conservador à moda antiga, inspirado por valores morais.

Hoje, os truísmos de Smith são ridicularizados como “elaboradas teorias de como a história do mundo seria manipulada por redes fantasmas corporativo-imperialistas”; ou trágico legados dos anos 60s, para citar David Brooks, intelectual do New York Times. Não dos 60s, mas, de fato, dos 70s. Para sermos exatos: 1776! Uma das inúmeras provas que se pode encontrar de como não há comparação possível entre os padrões intelectuais e morais dos “conservadores” de hoje e o que pensavam, em seu tempo, os ‘pais fundadores’ dos atuais conservadores.

Para não deixar dúvidas, devo declarar que me identifico com os ‘do mal’ que abraçam a heresia de Adam Smith.

Mantendo em mente o truísmo radical de Smith, vê-se que está em curso, sim, uma mudança no comando do poder global, embora não seja a mudança de que hoje todos falam: o poder global está saindo das mãos da força de trabalho global e está indo para o colo do capital transnacional, em rápida escalada durante os anos neoliberais. O custo dessa mudança é considerável, incluindo a vida dos Joe Stacks dos EUA, dos camponeses famintos da Índia, de milhões de desempregados na China, onde a parte correspondente ao trabalho na renda nacional cai hoje em ritmo muito mais rápido que em qualquer outra parte do mundo.

Em trabalho sob todos os títulos brilhante, Martin Hart-Landsberg observa que a China desempenha papel protagonista na real mudança no plano do poder global, tendo-se convertido, em larga medida, numa linha de montagem do sistema regional de poder. Japão, Taiwan, outras economias asiáticas exportam partes e componentes para a China, e oferecem parte significativa da tecnologia avançada. Muitos se têm preocupado com o crescente déficit comercial dos EUA com a China, mas poucos têm considerado o fato de que o déficit com Japão e o resto da Ásia declinou bruscamente, ao ritmo em que o novo sistema regional de produção vai tomando forma. Os fabricantes norte-americanos estão seguindo o mesmo caminho, fornecendo partes e componentes para montagem na China, que exporta os produtos, sobretudo de volta para o s EUA. Para as instituições financeiras, os gigantes do varejo, proprietários e executivos da indústria de manufatura e setores intimamente correlacionados nesse nexo de poder, é o paraíso. Mas não para Joe Stack e muitos outros como ele.

Para compreender o que sente o público, vale relembrar que é extremamente arriscado usar o PIB convencional para aferir crescimento econômico. Há esforços para construir parâmetros mais realistas, como o General Progress Indicator [Índice Geral de Progresso], que subtrai do PIB os custos sociais [gastos contra o benefício geral] (crime, poluição etc.) e soma o valor estimado de benefícios autênticos (trabalho voluntário, lazer etc.). Nos EUA, o PIB estagnou desde os anos 70s: embora o PIB tenha aumentado, o crescimento acontece só em pequeno número de setores. Esse resultado correlaciona-se com estudos de indicadores sociais, medida padrão da saúde de uma sociedade. Esses indicadores acompanham o crescimento econômico até meados dos anos 70s e, então, começam a cair e, em 2000, voltaram ao nív el de 1960 (primeiros dados disponíveis). Impossível não ver a correlação com a financeirização da economia e com as medidas socioeconômicas neoliberais – e não aconteceu só nos EUA.

É verdade que nada há de novidade no processo de desindustrialização. Donos e executivos sempre procuram os menores custos trabalhistas; esforços para andar na contracorrente (os mais famosos, de Henry Ford) foram derrubados nos tribunais e, portanto, gastar o menos possível com o trabalho é hoje lei. Um dos meios para isso é alterar a produção. Nos primeiros tempos, as alterações eram sobretudo internas, sobretudo nos estados do sul, onde o trabalho podia ser mais duramente reprimido. Grandes corporações, como a do aço nos EUA, do santificado filantropo Andrew Carnegie, também aferiram lucros do novo trabalho escravo criado pela criminalização da vida dos negros, depois do fim da Reconstrução em 1877, parte essencial da revolução industrial norte-americana, que se prolongou até depois da II Guerra Mundial. Voltou a ser reproduzida em parte durante os recentes anos neoliberais, com a guerra às drogas usada como pretexto para empurrar a população supérflua, sobretudo negros, de volta às prisões; e criando nova oferta de trabalho escravo, nas prisões estatais ou privadas, quase sempre em flagrante violação das convenções internacionais sobre o trabalho.

Para muitos afro-americanos, exportados para as colônias, a vida praticamente se manteve igual à que viviam sob a escravatura, muitas vezes foi pior.

Lê-se, no ultra respeitável Bulletin of the American Academy of Arts and Sciences, que “o sistema prisional nos EUA converteu-se em leviatã incomparável a qualquer outro na história humana”, e converteu os EUA “em lar da maior infraestrutura custodial para a destruição em massa da liberdade que o mundo jamais conheceu”, de massas sobretudo de negros, produto dos últimos 30 anos. Os EUA “lideram o ranking mundial, não só de porcentagem de encarcerados, mas também de compensação executiva”, fatos que, reconhecidamente, estão associados, como observa um professor da Harvard Business School, como também está conectado a tudo isso o fato de os EUA estarem em posição de desvantagem no mundo, não só em relação à China, mas também em relação à Europa, no desenvolvimento de tecnologias verdes.

É muito fácil ridicularizar o modo como Joe Stack e outros como ele articulam suas muito genuínas preocupações. Mas o melhor a fazer é entender o que subjaz àquelas percepções e àquelas ações.

Temos sobretudo de perguntar a nós mesmos por que a imaginação radical não consegue oferecer àqueles homens e mulheres uma via construtiva, em momentos em que o centro visivelmente não se mantém e estilhaça-se, e os que padecem sofrimento real começam a ser mobilizados em formas de mobilização que implicam perigo considerável, para eles mesmos e para todos.

O Manifesto de Stack conclui com duas sentenças evocativas: “O credo comunista: de cada um, conforme a habilidade; para cada um, conforme a necessidade. O credo capitalista: de cada um, conforme a credulidade; para cada um, conforme a avareza.”

Stack não poupa palavras sobre o credo capitalista. E só se pode especular sobre o que quisesse dizer com o credo comunista que lhe contrapôs. É provável que o manifeste como ideal, com genuína força moral. Não seria surpresa. Muitos de vocês lembrarão uma pesquisa, em 1976, no bicentenário, na qual as pessoas recebiam uma lista de frases, para dizer quais delas “estão na Constituição”. Naquele momento, ninguém tinha nem ideia do que havia na Constituição; e a expressão “estar na Constituição” significava, para muitos: “algo tão obviamente correto que tem de estar na Constituição”. Uma das frases que foi indicada por sólida maioria de norte-americanos, como “frase que está na Constituição” foi o “credo comunista” de Joe Stack.

Deve-se considerar, no meu comentário, a expressão qualificativa “naquele momento”. Hoje, muitos memorizam e cultuam a Constituição, ou só as palavras, pelo menos.

A recente convenção “Tea Party” [aprox. Festa do Chá] produziu seu catecismo para os candidatos: é obrigatório dispor-se a rasgar o Código de Impostos e Tributos e substituí-lo por qualquer coisa que empregue no máximo 4.543 palavras – para que tenha o mesmo número de palavras que tem a Constituição menos emendas. Só algumas emendas satisfazem essa lei sagrada, especialmente a Segunda, como interpretada pelos reacionários da Suprema Corte; mas a Primeira Emenda é mais questionável, porque se pode entender que se aplique à separação entre Estado e Igreja. No mesmo dia, o Texas anunciou novo manual de exigências, que se aplica a todo o país, considerado o tamanho do mercado texano. Jefferson foi excluído da lista dos que inspiraram as revoluções dos séculos 18 e 19, substituído por Tomà ¡s de Aquino, Calvino e Blackstone. A decisão reflete o desgosto por Jefferson porque, dentre outras heresias, é dele a sentença “separação entre igreja e Estado.” Na versão corrente do conservadorismo, os EUA é país cristão, como a República Islâmica do Irã ou o Estado Judeu de Israel.

Nessa conexão, Golda Meir aparece na lista de pessoas cujas vidas devem ser ensinadas como exemplo às crianças, mas nessa lista não há hispânicos. Ao lado do racismo normal, vê-se aí um curioso amálgama de extremo antissemitismo e apoio a Israel, nos setores religiosos de direita. Todos esses são sinais aos quais é preciso prestar muita atenção, se queremos andar adiante.

O extremismo anti-impostos do movimento “Tea Party” não é tão diretamente suicidário quanto a ação desesperada de Joe Stack mas nem por isso é menos suicidário, por razões autoevidentes. Exemplo dramático desse suicidarismo é hoje a California. Ali, o maior sistema público de educação superior de todo o planeta está sendo desmantelado.

O governador Schwarzenegger diz que tem de cortar os programas públicos de saúde e bem-estar, a menos que o governo federal compareça com cerca de 7 bilhões de dólares – e outros governadores têm-se juntado a ele. Ao mesmo tempo, está tomando corpo um poderoso movimento por direitos em estados fortes, exigindo que o governo federal não se intrometa em nossos negócios – ilustração interessante do que Orwell chamou de “duplipensar”: a capacidade para aproximar mentalmente duas ideias contraditórias, nas quais se crê simultaneamente – expressão que pode ser adotada como motto dos tempos que. O movimento na Califórnia é resultado, em larga medida, do fanatismo anti-impostos. E vê-se praticamente o mesmo fanatismo também nos bairros e as áreas pe riurbanas afluentes.

Alimentar os sentimentos anti-impostos tem sido recurso da propaganda comercial que domina o aparelho-sistema doutrinário. As pessoas têm de ser doutrinadas para que odeiem e temam o governo, e por boas razões: dos poderes existentes, o governo é o único que em princípio, e às vezes de fato, têm de dar satisfações ao público e pode impor alguns impedimentos à depredação do poder privado. Corolário de “o governo não se intrometa nos nossos negócios” é o peso, maior a cada dia, de incontáveis tiranias privadas.

Mas a propaganda comercial anti-governo tem de ser nuançada: o business, é claro, sempre favorece Estados poderosos que trabalham para os arquitetos principais de Adam Smith, os quais, hoje, não são mercadores e manufaturas, mas multinacionais e instituições financeiras.

Construir essa propaganda que abriga uma contradição interna não é tarefa simples. Então, as pessoas têm de ser adestradas para odiar e temer o déficit, recurso necessário para estimular a economia depois de ela ser destruída pelas mãos das instituições financeiras dominantes e seus asseclas em Washington. Mas ao mesmo tempo as pessoas têm de aceitar que o aumento do déficit – nos EUA atribuível, em quase a metade, pelo crescimento incontido do orçamento militar, que não para de superar os recordes; quanto ao restante do déficit, prevê-se que estourará o orçamento por culpa do inapelavelmente ineficiente e cruel sistema privatizado de saúde, presente caído do céu para as empresas de seguros e a “big Pharma”.

Apesar dessas dificuldades, a tarefa da propaganda têm sido cumprida com impressionante sucesso. Exemplo disso é a atitude pública em relação ao 15 de abril, data em que se tem de pagar os impostos.

Esqueçamos, por um momento, a ideia de uma sociedade mais livre e mais justa. Em qualquer democracia funcional do tipo que existe formalmente, o dia de pagar impostos deveria ser dia de celebrar a democracia! Juntos, todos os cidadãos declarariam que, sim, estão cooperando para implantar os programas que aprovamos, por maioria, para serem implementados pelos candidatos que se elegeram.

Nada disso! Dia de pagar impostos é dia de luto! É como se um poder alienígena descesse sobre nossas vidas, para roubar nosso dinheiro que tanto nos custou ganhar!

Aí está exemplo dramático do sucesso dos esforços intensos da comunidade dos negócios, que tem consciência muito clara da divisão de classes – e que assim comprova que venceu o que os documentos daquela mesma comunidade de negócios chama de “eterna disputa pela mente dos homens”[3] ; e que, como até na propaganda mais vulgar, aí também há grãos de verdade que os Joe Stacks percebem.

Outra espantosa ilustração do sucesso da propaganda, com influência considerável sobre o futuro, é o culto ao assassino e torturador Ronald Reagan – dos super criminosos da era moderna, com especial e infalível instinto para favorecer os terroristas e assassinos mais brutais em todo o mundo, de Zia ul-Haq e Gulbuddin Hekmatyar no atualmente chamado “Afpak”, aos mais aplicados assassinos na América Central ou racistas sul-africanos que mataram cerca de 1,5 milhão de seres humanos, mas tinham de ser apoiados porque estavam sendo atacados pela Aliança Nacional Africana de Nelson Mandela (“dos mais conhecidos terroristas” do mundo, como os Reaganitas diziam em 1988). E a lista é longa, sem qualquer variação.

Esse vergonhoso recorde é muito facilmente apagado e substituído por construtos míticos, que impressionariam Kim il-Sung. Dentre outros feitos, Reagan é elogiado como apóstolo do livre mercado, apesar de ter criado mais barreiras protecionistas que qualquer outro presidente do mundo no pós-guerra – mais, provavelmente, que todos os demais, somados – e implementado massiva intervenção governamental na economia. É endeusado como grande expoente do governo mínimo e da lei e ordem. O governo cresceu em relação ao PIB durante seu governo, mas ele discursava ao mundo do business e dizia que as leis trabalhistas não seriam aplicadas; resultado, foi que o número de demissões ilegais de organizadores sindicais triplicou sob sua atenta supervisão. O ódio que lhe inspiravam os trabalhadores só perdia para o desprezo que lhe inspiravam negras ricas cujos motoristas estacionavam as limousines e as acompanhavam aos guichês para receber o cheque do seguro social.

Desnecessário prosseguir nessa lista, mas o resultado nos ensina muito sobre a cultura intelectual e moral de Reagan. Para o presidente Obama, essa criatura monstruosa seria “figura da transformação”. Na prestigiosa Hoover Institution da Universidade Stanford, Reagan é reverenciado como figura colossal, cuja “alma parece pairar sobre a nação, cuidando de nós como espírito caloroso e amigo.”

Quem chega a Washington chega ao Aeroporto Internacional Reagan – ou, como preferimos, ao Aeroporto Internacional John Foster Dulles, homenagem, nesse caso, a outro importante comandante terrorista.

Dentre outros feitos, coube a Reagan o trabalho de concluir a implantação no poder do regime de torturadores, do Xá; e o reinado dos mais viciosos terroristas que a América Central conheceu, cujos ataques alcançaram números de verdadeiro genocídio, enquanto Reagan elogiava um dos campeões do assassinato em massa, Rioss Montt, como “homem de grande integridade pessoal”, “totalmente dedicado à democracia”, que estaria sendo “atormentado” por organizações de direitos humanos.

Dói relembrar, mas muitos dos Joe Stacks cujas vidas esse “espírito caloroso e amigo” estava arruinando, uniam-se na mesma adulação, e corriam a abrigar-se sob o guarda-chuva do poder e da violência que Reagan simbolizou. Tudo isso evoca lembranças de outros dias, quando o centro não sessegurou.

Exemplo que também não se pode esquecer é a República de Weimar: auge da civilização ocidental nas ciências e nas artes, também considerada modelo de democracia. Ao longo dos anos 1920s, os partidos tradicionais liberal e conservador que sempre haviam governado o Reich entraram em declínio inexorável, bem antes de o processo ter sido acelerado pela Grande Depressão. A coalizão que elegeu o general Hindenburg em 1925 não era muito diferente da base de massa que levou Hitler ao poder oito anos mais tarde, compelindo o aristocrático Hindenburg a escolher, como Chanceler, o “soldadinho raso” que ele desprezava. Até 1928, os nazistas tinham menos de 3% dos votos. Dois anos depois, a imprensa mais respeitável de Berlin lamentava ver que muitos milhões nes se “país altamente civilizado” haviam dado seu voto “ao mais charlatanismo mais vulgar, raso e oco”. O centro estava entrando em colapso. O público começava a desprezar o incessante bate-boca da política de Weimar, os partidos tradicionais rendidos a interesses poderosos e o fracasso dos mesmos partidos, incapazes de responder ao sofrimento do povo. Foram arrastados na direção das forças dedicadas a cultivar a grandeza da nação e a defendê-la contra ameaças, num Estado revitalizado, armado e unificado, a caminho de um futuro grandioso, conduzido pela figura carismática que levava avante “o desejo da eterna Providência, Criador do universo”, como ele próprio discursava frente a massas mesmerizadas. Em maio de 1933, os nazistas já haviam destruído em larga medida não só os partidos tradicionais, mas também os enormes partidos da classe trabalhadora, o Social Democrata e o Comunista, além de suas muito poderosas organizações. Os nazistas declar aram feriado dos trabalhadores o dia 1º de maio de 1933, o que os partidos de esquerda jamais antes haviam conseguido. Muitos trabalhadores participaram de gigantescas manifestações patrióticas, com mais de um milhão de pessoas no centro de Berlim Vermelha, além de agricultores, artesãos, pequenos comerciantes, forças paramilitares, organizações cristã, clubes de atletismo e de tiro, e o resto da coalizão que ia tomando forma enquanto o centro ia entrando em total colapso. No início da guerra, é provável que 90% dos alemães já marchassem com os nazistas.

O mundo é complexo demais para que a história se repita, mas mesmo assim há lições a aprender do passado, sobretudo lembranças. Tenho idade suficiente para lembrar daqueles dias terríveis, quando a Alemanha decaiu, da decência até a barbárie nazista, nas palavras do importante historiador alemão Fritz Stern, o qual tem em mente o futuro dos EUA quando revisita “um processo histórico no qual o ressentimento contra um mundo secular desencantado encontra via de escape na fuga extática para a desrazão.”

Esse é um resultado possível do colapso do centro, quando a imaginação radical, por poderosa que ainda fosse naquele momento, ainda assim foi insuficiente.

O humor popular hoje é complexo, por vias que geram ao mesmo tempo esperança e preocupação. Ilustração disso são as atitudes em relação aos gastos sociais, daqueles que se definem nas pesquisas como “oposição ao governo”. Estudo acadêmico recente descobriu que, por grande maioria, essas vozes apóiam “a manutenção ou a expansão [dos gastos] na Seguridade Social, atenção à criança e ajuda aos pobres” e outras medidas de bem-estar, embora o apoio diminua significativamente “no caso de medidas de apoio a negros e a beneficiários de pensões públicas e aposentadorias”. Metade daquelas maiorias que advogam a redução do papel do governo acreditam que “o gasto [na assistência aos mais pobres] é muito pequeno”.

No conjunto da população total, as maiorias, em alguns casos muito significativas, sentem que o governo gasta menos do que deveria para melhorar e proteger a saúde nacional e em Segurança Social, na atenção aos dependentes de drogas e em programas de assistência à criança – embora também aqui haja importante exceção no caso da ajuda a negros e beneficiários de pensões e aposentadorias públicas, o que, suspeito eu, seja tributo à bandidagem dos Reaganitas.

Esses resultados dão indicações do que se pode obter pelo engajamento, mesmo que sem forçar os limites da imaginação radical, e de alguns dos impedimentos que terão de ser superados, para que se alcancem esses e outros objetivos ainda mais ambiciosos.

A eleição em janeiro, em Massachusetts, que modificou a maioria no Senado, dá indicação também do que pode acontecer quando o centro não se mantém coeso e nem os que pregam medidas limitadas de reforma conseguem chegar ao coração e mente da população.

Nas eleições para preencher a vaga no Senado do “leão liberal” Ted Kennedy, Scott Brown concorreu como o 41º voto contra a reforma da saúde, pela qual Kennedy lutou ao longo de toda sua vida política. Uma maioria opunha-se às reformas de Obama, mas sobretudo porque as reformas faziam excessivas concessões à indústria dos planos privados de saúde. O mesmo se pode dizer da opinião pública no plano nacional.

Traço interessante foi também o padrão de voto entre os membros de sindicatos, eleitorado natural de Obama. Líderes sindicais e ativistas relataram que os trabalhadores estavam em geral irados com o governo Obama, mas particularmente irados em relação à posição de Obama na questão da saúde pública. Nas palavras de um deles, “[Obama] não insistiu numa alternativa pública, nem, sequer, em algum modo de obrigar os patrões a garantirem o seguro-saúde. Foi difícil não ver que a única questão na qual [Obama] fez pé firme foi a taxação dos benefícios”, luta histórica dos sindicatos, e o oposto do que disse na campanha.

Houve massiva doação de dinheiro, por executivos das financeiras, nos últimos dias da campanha. Aí se vê apenas uma parte do fenômeno muito mais amplo, que revela dramaticamente o quando Joe Stack e outros têm muitas razões para desagrado, ante a farsa que foram ensinados a respeitar como se fosse ‘a democracia’.

O principal bloco de eleitores que elegeu Obama foram as instituições financeiras, que obtiveram tal dominância na economia, que sua parte nos lucros corporativos subiu, de baixíssima porcentagem, nos anos 70s, até os mais de 30% de hoje. Preferiram Obama a McCain, e praticamente compraram a eleição para o seu candidato. Contavam com ser recompensados, e foram. Mas há poucos meses, respondendo à ira crescente dos Joe Stacks, Obama começou a criticar os “banqueiros gananciosos” que foram resgatados por dinheiro público; e até propôs algumas medidas para restringir aqueles excessos. O castigo pelo desvio veio rápido. Os grandes bancos anunciaram com alarido que passariam a financiar os Republicanos se Obama insistisse na retórica ofensiva.

Obama captou a mensagem. Em poucos dias, estava dizendo a mídia comercial que os banqueiros eram ótimos “caras”. Reservou elogios especiais aos presidentes de dois dos principais beneficiários da prodigalidade pública, JP Morgan Chase e Goldman Sachs, e assegurou ao mundo do business que “Eu, como a maioria dos norte-americanos nada temos contra gente que consegue sucesso e riqueza”, nem no caso dos descomunais bônus e lucros que enfureciam as pessoas. “São parte do sistema de livres mercados”, Obama continuou; não sem razão, uma vez que “livres mercados” são apreciados na doutrina do capitalismo de Estado. Mas o recuo veio tarde, e não consegui alterar o fluxo do dinheiro que ajudou a conquistar o 41º voto no Senado.

A bem da justiça, temos de conceder que os banqueiros gananciosos tem alguma razão. É tarefa deles maximizar o lucro e sua fatia do mercado; de fato, é obrigação deles, determinada por lei. Se não o fazem, são substituídos por quem faça. São fatos institucionais, tanto quanto são ineficiências inerentes ao mercado, que os obrigam a ignorar o risco sistêmico. Todos sabem, é claro, perfeitamente, que a supervisão pode blindar a economia, mas essas externalidades não são problema dos banqueiros, nem podem ser, por razões institucionais. Também é injusto acusá-los de “exuberância irracional”, tomando emprestadas as palavras de Alan Greenspan, num rápido movimento de curvar-se à realidade, em plena bolha tecnológica do final dos anos 90s. Aquela exuberância nada tinha de irracional: foi ab solutamente racional, dado que todos eles sabem que, quando tudo desmorona, eles podem correr e refugiar-se no Estado-anão, agarrados aos volumes de Hayek, Friedman e Rand. O mesmo se aplica à Câmara de Comércio, ao American Petroleum Institute e a todos os demais líderes dos negócios que distribuem massiva campanha de propaganda para convencer o público a descartar qualquer preocupação quanto à responsabilidade humana no aquecimento global – com estrondoso sucesso; quase 1/3 da população crê que tudo, aí, não passe de boato liberal. Os executivos dedicados à tarefa sabem, tanto quanto o resto da população, que o boato liberal é real e as perspectivas, sombrias. Mas cumprem seu papel institucional. O destino da espécie é uma externalidade que eles têm de ignorar, o suficiente para que os sistemas de mercados continuem a dominar.

Voltando àquelas muito instrutivas eleições de Massachusetts, o principal fator foram os padrões de votação. Nos bairros afluentes, o comparecimento às urnas foi alto e entusiasmado. Nas áreas centrais urbanas, caracteristicamente de maioria Democrata, a votação correu lenta e apática. As manchetes acertaram: os eleitores estavam, sim, enviando mensagens a Obama. A mensagem dos ricos foi “queremos mais do que você está fazendo por nós.” Dos demais, a mensagem foi idêntica à de Joe Stack: segundo suas palavras, os políticos “não estão nem um pouco interessado em mim ou no que eu tenha a dizer”, e só se interessam pelo que digam os patrões. Claro que houve algum impacto da imagem populista produzida pela máquina de propaganda dos Republicanos (“Meu nome é Scott Brown, esse é o meu ca minhão”, “sujeito comum”, modelos nuas etc.). Mas parece ter sido impacto apenas secundário.

As pessoas estão realmente e muito compreensivelmente, com medo, vendo os bancos sempre bem-sucedidos na caça aos ‘resgates’ e outros presentes do Estado-anão, enquanto a população enfrenta profunda recessão. Até as taxas oficiais de desemprego já chegaram a 10%; e na indústria manufatureira já alcançou o nível da Grande Depressão, com um desempregado em cada seis empregáveis, e com baixas possibilidades de recuperação, dados os tipos de emprego que deixam de existir na remodelagem da economia.

As pesquisas nacionais mostram o mesmo fenômeno. A mais recente, há alguns dias, mostra diferença de 21 pontos no entusiasmo pelos partidos; 67% dos Republicanos se dizem muito interessados nas eleições de novembro, para 46% dos Democratas. Em acentuada mudança em relação ao padrão tradicional, 10% a mais, dos eleitores registrados e com o mais alto interesse nas eleições de novembro, disseram que acreditam que os Republicanos são melhores, para lidar com a economia – fatia em que se combinam um sólido setor Republicano (sobretudo os afluentes) e os Democratas desiludidos. Metade dos norte-americanos gostariam que nenhum dos atuais deputados e senadores fosse reeleito, inclusive aqueles em que cada eleitor votou.

O público tem, da democracia, ideia quase tão negativa quanto do mundo dos negócios – cujo lobby trabalha hoje furiosamente para garantir que nenhum acionista possa palpitar na escolha dos administradores, nem, muito menos, dos parceiros financeiros, dos contratados e das comunidades; embora alguns liberais estejam em busca de “uma ‘posição justa’ que supere a distância que separa entre empresas e acionistas”, nas palavras do Wall Street Journal, e reconhecendo implicitamente a decisão das cortes, de há um século, de que não há diferença entre corporação e administração.

É verdade que houve um estímulo, microscópico, mas que, mesmo assim, teve algum efeito – conseguindo salvar mais de 2 milhões de empregos, segundo o Departamento de Orçamento do Congresso. Mas nem por isso a percepção dos Joe Stacks é completamente sem sentido. Mais de 1/3 dos gastos do governo é feito pelos estados, e a queda no gasto do estado é praticamente igual ao estímulo federal; o impacto do estímulo no gasto fiscal agregado, portanto, foi zero, segundo estudo do prestigioso National Bureau of Economic Research.

O centro está em processo visível de esfacelamento, e os que mais estão perdendo estão outra vez atirando contra o próprio pé. Em Massachusetts, a consequência imediata do resultado daquela eleição, foi bloquear a indicação de alguém favorável aos sindicatos para a presidência da NLRB [National Labor Relations Board, agência federal criada pelo Congresso em 1935 para administrar a aplicação do National Labor Relations Act (espécie de ‘consolidação das leis trabalhistas’)], organização virtualmente defunta desde a bem-sucedida guerra que Reagan moveu contra os trabalhadores. É o que se deve esperar que aconteça, quando não há alternativas construtivas.

E existirão alternativas construtivas? Consideremos o coração industrial do país, em Ohio, onde a GM continua a fechar fábricas. Há algumas semanas, Louis Uchitelle do New York Times, dos raros jornalistas a dar atenção a questões do trabalho, escreveu do cenário de umas dessas fábricas recém fechadas. Para ele, o presidente Obama “jamais cogitou de reabrir a fábrica, mesmo depois de o governo federal ter-se tornado acionista majoritário da GM, durante o ‘resgate’ das empresas automobilísticas. O presidente limitou-se a mandar um paliativo; mandou um embaixador, como unguento a ser aplicado nas feridas abertas da comunidade, oferecendo esperança e ajuda” – sendo que o item ajuda só incluía idéias e sugestões. Ao mesmo tempo, outro embaixado r, o secretário de Transportes Roy Lahood, estava na Espanha, oferecendo dinheiro federal de estímulo, para empresas espanholas que se interessassem por produzir as unidades ferroviárias de alta velocidade de que os EUA carecem desesperadamente, e que evidentemente poderiam ser produzidas pela força de trabalho altamente especializada e, hoje, condenada à miséria, de Ohio. Outra vez, a mesma experiência que Joe Stack viveu em Harrisburg.

Em 1999, como congressista Republicano, Lahood apresentou projeto de lei que asseguraria financiamento federal para a infraestrutura de transportes. Autorizaria o Tesouro a garantir 72 bilhões por ano, em empréstimos gratuitos a governos estaduais e locais para investimentos de capital, inclusive em infraestrutura de transportes, mediante emissão de bônus dos EUA, quase exatamente o que Lincoln fez para financiar a Guerra Civil, e F.D.Roosevelt, na Grande Recessão. Hoje, Lahood está usando o dinheiro do estímulo federal destinado a quase a mesma finalidade, para contratar empresas na Espanha. Mais um sinal de o quanto o centro, há 40 anos, está caminhando na direção da direita.

Cabe à imaginação radical sugerir alternativa. A fábrica poderia ser ocupada pelos operários, com apoio das comunidades deixadas abandonadas, e convertida para produzir veículos ferroviários de alta velocidade e outros bens dos quais o país desesperadamente carece. Nem chega a ser ideia particularmente radical.

No século 19, era intuitivamente óbvio para os operários da Nova Inglaterra que “os que operam as fábricas devem ser proprietários das fábricas”; e a ideia de que o trabalho assalariado só difere do trabalho escravo por que esse é temporário era tão comum que chegou a ser slogan do partido Republicano de Lincoln. Nos recentes anos de financeirização e de desindustrialização houve repetidos esforços para implementar a tomada de fábricas em vias de fechar, pelos trabalhadores e comunidades. São ideias que, além do imediato apelo moral à força de trabalho e às comunidades afetadas, pode ser rapidamente implementadas com adequado apoio público. Com consequências de longo impacto e longo alcance.

Para reacender a imaginação radical e abrir a marcha para longe do deserto em que os EUA vivem hoje, é preciso gente que trabalhe para espantar os miasmas de ilusões cuidadosamente implantadas, e exponha a realidade como está aí.

É preciso engajar-se diretamente nas lutas populares, que tantos, tantas vezes, souberam galvanizar.

Precisamos, em resumo do falecido Howard Zinn, perda inestimável.

Não haverá outro Howard Zinn, mas podemos tomar a peito, no fundo do coração, o orgulho que Zinn sentia das “incontáveis pequenas ações da gente pequena, dos desconhecidos” – que são a raiz de todos os grandes momentos da história. Olhar e ver os incontáveis Joe Stacks que se matam, que talvez destruam o mundo… quando poderiam estar liderando a marcha rumo a melhor futuro.

“The center cannot hold” é verso de The Second Coming, [William Butler] Yeats, de 1919. É verso ‘apocalíptico’, do pós-guerra na Europa, acima traduzido livremente. A primeira estrofe diz “Turning and turning in the widening gyre / The falcon cannot hear the falconer; / Things fall apart; the centre cannot hold; / Mere anarchy is loosed upon the world, / The blood-dimmed tide is loosed, and everywhere / The ceremony of innocence is drowned; / The best lack all conviction, while the worst / Are full of passionate intensity” (em http://www.potw.org/archive/potw351.html).

[1] Dia 18/2/2010.

[2] Pode ser lido, em inglês, em http://mashable.com/2010/02/18/austin-plane-crash/ [3] Sobre o tema, ver “Fighting the Battle For Our Minds”, entrevista de Noam Chomsky a Susan Bryce, Journal of Cognitive Liberties, vol. 1, n. 1, pp. 23-33 (Inverno 1999/2000), em http://www.cognitiveliberty.org/1jcl/1jcl23.htm [em inglês].< /span>

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Madison, EUA, Left Forum

http://www.zcommunications.org/the-center-cannot-hold-rekindling-the-radical-imagination-by-noam-chomsky

“The best lack all conviction, while the worst

Are full of passionate intensity”

[Yeats, 1919, The Second Coming]

Tradução: Caia Fittipaldi