Pedra fundamental da democracia
Há 244 anos, a Suécia apresentava ao mundo o primeiro marco legal de garantia de um direito a ter acesso às informações produzidas pelo Estado.
Uma revolução! O caráter inovador sueco foi mais além: o direito à informação estava inserido, já naquela época, em uma regulamentação que também tratava da liberdade de expressão e de imprensa, em um reconhecimento claro da interdependência desses conceitos.
Quase dois séculos depois, em 1948, as Nações Unidas reconheciam o direito à informação no artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos: “Toda pessoa tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras”.
Desde então, dezenas de países começaram a criar as regras do jogo para garantia, proteção e promoção do direito à informação. Hoje, são cerca de 80 nações que estabelecem que seus cidadãos e cidadãs detêm o direito de ter acesso às informações produzidas pelo Estado.
Vale lembrar que, não raro, há grande distância entre a garantia formal do direito e sua execução cotidiana.
O Brasil decidiu incluir o direito à informação entre as garantias fundamentais previstas na Constituição: “Todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado”.
A despeito da central decisão da Assembleia Constituinte, foi apenas no ano passado que o Poder Executivo enviou ao Congresso projeto de lei geral regulamentando o tema. A proposta de uma lei geral de acesso à informação (projeto de lei nº 5.228/2009) foi recentemente aprovada pela Câmara e aguarda apreciação pelo Senado Federal.
Sua sanção pelo presidente e sua efetiva implementação representarão avanço de grandes proporções para a democracia brasileira. A informação, entendida como um bem público, e o acesso a ela como um direito humano inalienável e universal estão, portanto, no centro de debates fundamentais que acompanham a própria consolidação das democracias. O direito à informação é componente fundamental de uma série de reflexões-chave para a boa governança democrática.
Entre essas relevantes reflexões estão mecanismos para garantir a responsabilidade dos governos; ferramentas, procedimentos e modelos para elevar a qualidade da gestão pública; regimes que contribuem para o aumento da transparência no exercício das atividades estatais e para a diminuição da corrupção.
Outros mecanismos são as estruturas de garantia e promoção dos direitos humanos, com especial atenção para o chamado direito à verdade, e elementos institucionais que conduzam a um desenvolvimento econômico, social e humano mais pujante, célere e diversificado. Nesse sentido, muitos são os atores que se beneficiam de um adequado sistema de garantia de acesso à informação: cidadãos e cidadãs, jornalistas, pesquisadores, servidores públicos, dentre outros.
O tema é especialmente relevante para os jornalistas, dado o seu significativo papel na vigilância saudável dos poderes públicos e no aprofundamento do debate público acerca das ações desenvolvidas pelos governos.
Como recorda a diretora-geral da Unesco, Irina Bokova, em sua mensagem por ocasião do Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, celebrado em todo o mundo hoje, “é possível que nós não exerçamos, de maneira consciente, o nosso direito à informação.
Mas, cada vez que lemos um jornal, ligamos a TV ou o rádio para ver ou ouvir o noticiário, ou acessamos a internet, a qualidade daquilo que vemos ou ouvimos depende do acesso que esses meios tiveram a informações atualizadas, críveis e precisas”.
A Unesco no Brasil entende que temos muito a celebrar com o avanço da tramitação do projeto de lei de acesso à informação no Congresso. Esperamos que a lei saia do papel e tenha aplicação adequada, pois, sem dúvida, é peça fundamental para o aprofundamento da democracia brasileira. Para isso, a Unesco oferece à sociedade seu conhecimento na área e sua cooperação internacional.
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VINCENT DEFOURNY, 50, doutor em comunicação, é representante da Unesco no Brasil.
GUILHERME CANELA, 30, cientista político, é coordenador de comunicação e informação da Unesco no Brasil.
Fonte: jornal Folha de S. Paulo