O evento foi aberto pelo ministro da Ciência e Tecnologia, Sérgio Rezende. Após saudar os presentes, Rezende lembrou que a Conferência – intitulada “Ciência, tecnologia e inovação para o desenvolvimento sustentável” – tem como objetivo principal colher sugestões da sociedade para a elaboração do Plano da Ação em Ciência, Tecnologia e Inovação (PACTI) 2011-2014. Por meio do Plano, que sucede o PACTI 2007-2010, as autoridades do MCT buscam consolidar a política de C&T como assunto de Estado, com permanência para além do atual governo e maior enraizamento na sociedade.

Após a fala do ministro, ainda pela manhã, foram realizadas duas sessões plenárias, uma delas destinada à apresentação das sugestões colhidas nas cinco etapas regionais da Conferência. A outra teve por tema “Desenvolvimento sustentável: novos padrões de desenvolvimento via inovação”. Coordenada pelo professor Luiz Gonzaga Belluzzo (Unicamp), a sessão teve como palestrantes a cientista Berta Becker (UFRJ) e o representante da indústria e diretor do Instituto de Estudos do Desenvolvimento Industrial (Iedi) Pedro Passos, além de representante do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) responsável por suprir a ausência do presidente do órgão, Márcio Pochmann. José Geraldo Eugênio de França, da Embrapa, relatou os trabalhos.

A sessão destacou, entre outros assuntos, a inexistência de uma cultura de inovação no meio empresarial, fato que tem contribuído historicamente para a baixa densidade tecnológica dos produtos da indústria brasileira. Foram registradas áreas nas quais o Brasil pode avançar mais, como nanotecnologia e novos materiais; outras, como biotecnologia e biocombustíveis, foram lembradas como campos do conhecimento nos quais o país precisa consolidar sua liderança.

A Ciência & Tecnologia foi colocada ainda, pelos membros da mesa, como elemento fundamental para o alcance de um novo “padrão civilizatório” no País, capaz de garantir o desenvolvimento sustentado, evitando experiências frustrantes do passado como os chamados “vôos de galinha” (períodos curtos de crescimento seguidos de retrações) que marcaram a economia brasileira nas décadas de 80 e 90.

Luís Fernandes: ambiente econômico precisa favorecer a inovação

A tarde do primeiro dia da 4º Conferência foi reservada à realização simultânea de painéis temáticos. O presidente da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e membro do Comitê Central do Partido Comunista do Brasil, Luís Fernandes, coordenou sessão intitulada “Ambientes econômicos propícios à inovação”.

Buscando apresentar os grandes nós que entravam o pleno desenvolvimento da ciência brasileira, Fernandes destacou três pontos em sua fala de apresentação. Em primeiro lugar, a contradição ainda existente entre a atual política macroeconômica e a política de ciência, tecnologia e inovação. Para o presidente da Finep, com as atuais taxas de juros praticadas no país não é dado ao empresariado investir maciçamente em inovação. Outro ponto levantado diz respeito à necessidade de grandes projetos nacionais estruturantes na área de C&T, como forma de vincular o setor científico ao esforço de retomada do desenvolvimento.

Por fim, Fernandes destacou a insegurança jurídica que ainda cerca os atores centrais do sistema de ciência, tecnologia e inovação. Para ele essa insegurança é fruto da atitude contraditória do Estado em relação à inovação: “Uma parte do Estado trabalha a favor, enquanto outra trabalha contra. A cultura que cerca a inovação é a da descoberta, e ela exige uma atitude diferente por parte de órgãos do Estado como a Receita e os tribunais.” Nessa perspectiva, seria necessário empreender uma profunda reforma do aparato legal, visando a favorecer a inovação.

As palavras de Luís Fernandes ganharam eco através de outros expositores do mesmo painel, como o representante do BNDES Ernani Torres Filho, para quem o ambiente macroeconômico brasileiro ainda se encontra estruturado para dar conta do controle dos preços, em uma situação de inflação alta. O mesmo pode ser dito do sistema financeiro nacional, montado para lidar com situações de crise. O problema, para Torres, é que essa situação inibe os empreendimentos de risco e, portanto, os investimentos em inovação. “O Luís falou aqui dos juros, e eu gostaria de citar o câmbio, que também atrapalha. Mas não é fácil mexer no câmbio. Os chineses conseguem, mas eles têm o Partido Comunista e uma economia controlada”, lembrou.

Liderança em bioenergia

Titular do departamento de popularização da ciência do MCT, Ildeu de Castro Moreira apresentou dados coletados em pesquisa sobre a percepção pública da ciência no Brasil. Sua intervenção foi um dos destaques do painel “Construção da cultura científica”, que discutiu, dentre outros, temas como o das relações entre a cultura científica, o conhecimento popular, a memória e a tradição. Além de Moreira proferiram intervenções na sessão – uma das mais concorridas da 4º Conferência – Otávio Velho (coordenador), do Museu Nacional; Antônio Carlos Pavão, do Espaço Ciência (PE), e Cilene Victor da Silva, da Associação Brasileira de Jornalismo Científico.

Outra sessão temática da 4º CNCTI debateu o tema da bioenergia. Representando o Ministério das Minas e Energia, Ricardo Dornelles destacou a recente apresentação, pela Empresa de Pesquisa em Energia (EPE), do novo Plano Decenal de energia. Segundo ele, com as políticas de abertura e desregulamentação implementadas nos anos 90 o planejamento do setor energético deixou de existir. “Esse planejamento é hoje resgatado a partir de dois instrumentos principais: o Plano Nacional de Energia e o Plano Decenal. Esses documentos preveem a ampliação de nossa capacidade energética em 60% até 2019. Precisamos dessa oferta de energia para sustentar o crescimento econômico. Para isso, será decisiva a participação do setor de ciência, tecnologia e inovação”, completou.

Na visão de Dornelles, a comunidade científica e tecnológica nacional já foi responsável por grandes êxitos na área de energia. “Em virtude do Programa Brasileiro do Álcool, o Proálcool, nós recebemos aqui no Brasil cerca de 20 delegações estrangeiras por ano, que querem conhecer melhor essa história de sucesso.” Mas nem tudo são flores. “Nessa área, grande parte das publicações científicas que falam do Brasil são assinadas por cientistas estrangeiros.”, lamentou.

Participaram também do debate, coordenado por Luiz Augusto Horta Nogueira (Unifei), o representante da indústria automobilística Henry Joseph Jr e a pesquisadora Suani Teixeira Coelho, da USP. O primeiro apresentou um quadro da evolução tecnológica dos motores, projetando as tendências futuras do setor. Já a cientista buscou mostrar que, em havendo o zoneamento adequado, o Brasil tem, sim, plenas possibilidades de usar suas terras agricultáveis para a produção de energia sem que isso afete a produção de alimentos.

Debate amplo e diversificado

Como parte do amplo e diversificado debate que vem tendo lugar no processo da 4º CNCTI desde sua fase preparatória, outros temas foram discutidos no primeiro dia do evento. Entre eles, institucionalidade do Sistema de CT&I; ambiente regulatório; questão amazônica; propriedade intelectual; diplomacia científica; educação em ciências; biodiversidade; recursos hídricos e minerais, entre outros.

A Fundação Maurício Grabois marca presença no evento através de dirigentes seccionais de diversos estados, como Goiás e Pernambuco, dentre outros. Além disso, vem utilizando o evento com forma de divulgar o livro Ciência & Tecnologia para o desenvolvimento nacional, recém-lançado como resultado de dois seminários sobre o assunto, realizados em setembro de 2009 e fevereiro de 2010. A publicação vem tendo ótima aceitação entre os participantes da Conferência.

A 4º CNCTI se estende até o próximo dia 28. Ainda na noite de hoje (26) o presidente Luís Inácio Lula da Silva participa de ato solene como parte da programação do evento.

De Brasília, Fábio Palácio.