Incêndio no Butantan: tragédia anunciada
Incêndio no Butantan: tragédia anunciada
– Nota da Fundação Maurício Grabois –
O incêndio ocorrido no último sábado (15/05) no Instituto Butantan, localizado na Zona Oeste da cidade de São Paulo, representa prejuízo incomensurável à ciência nacional. Nele foi destruído o maior acervo de ofídios (serpentes) tropicais do mundo. Mais de 82 mil exemplares que faziam parte do laboratório de répteis, além de rica coleção de aracnídeos (aranhas e escorpiões), foram consumidos pelas chamas. O tamanho da tragédia pode ser ainda melhor aferido pelo registro de que lá se encontrava a coleção biológica iniciada pelo eminente cientista Vital Brazil, ampliada por várias gerações de pesquisadores ao longo dos últimos 109 anos.
Coleções biológicas com as do Butantan integram a infraestrutura científica que permitiu ao Brasil assumir a liderança em pesquisa taxonômica na América Latina. Nesse campo do conhecimento, pesquisadores brasileiros responderam, no século XX, por 45% de todas as publicações científicas em sistemática biológica sobre a biodiversidade neotropical, como bem afirma, em nota, o Ministério da Ciência e Tecnologia.
Vinculado à Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo, o Butantan sofre as consequências das políticas tucanas para o setor de pesquisa. A falta de investimentos – somada às concepções pragmáticas e enviesadas dos que enxergam falsas contradições entre ciência básica e ciência aplicada – resultou na completa ausência de reformas elementares no Instituto. Há oito anos não se verificavam investimentos na manutenção dos prédios que abrigam a pesquisa básica, dentro dos quais se encontrava o acervo destruído. Outras coleções de obras raras continuam ameaçadas.
Fato grave relacionado ao episódio é o êxodo de pesquisadores promovido nestes últimos quatros anos no Butantan. Durante o governo Serra, o Instituto perdeu exatamente 24% do quadro de cientistas. Isto é: um quarto de todos os pesquisadores migrou para universidades e outros institutos em busca de condições mais dignas de trabalho. Isso não tem ocorrido à toa. Enquanto o salário de um pesquisador do Butantan começa em R$ 2.700 (nível 1) e pode chegar a R$ 6.400 (nível 6), na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz, instituto federal ligado à mesma área) o teto é de R$ 14 mil, enquanto que na Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa, também federal), ele chega a R$ 12 mil.
Neste momento de grande consternação para os pesquisadores do Butantan e demais amigos da ciência em todo o Brasil, a Fundação Maurício Grabois vem a público solidarizar-se e reforçar seu brado contra as políticas neoliberais que tanto mal fizeram à ciência nacional em passado recente, e que ainda acometem o Estado de São Paulo.
Com o esforço de todos, e sob uma nova lógica política, fazemos votos para que o Butantan, tal qual a ave Fênix da mitologia grega, busque forças para superar este momento doloroso e consiga, afinal, ressurgir de suas próprias cinzas.
São Paulo, 21 de maio de 2010.
A diretoria da Fundação Maurício Grabois.