Mas não acho que esse argumento realmente funcione – ao menos, não de acordo com a maneira descrita. A hipotética guerra cambial na qual o Fed compraria euros e o Banco Central Europeu compraria dólares pode não provocar males, mas provavelmente não ajudaria em nada.

Por quê? Na década de 30, a desvalorização competitiva fez diferença principalmente porque alguns países ainda estavam presos ao padrão ouro, e mantinham os juros bem acima do limite inferior zero na tentativa de preservar suas reservas do metal precioso. A desvalorização relaxou essa restrição fazendo com que o ouro valesse mais em termos da moeda doméstica desses países, e teve assim um efeito de expansão.

Atualmente a situação é muito diferente, e os juros estão praticamente em zero. Neste caso, é difícil ver algum benefício na intervenção mútua. Suponhamos que o Fed compre um monte de euros e o BCE compre um monte de dólares. Suponhamos também que eles se comportem como sempre e mantenham as reservas recém adquiridas sob a forma de dívida de curto prazo – títulos do Tesouro. O efeito líquido disso equivale ao de uma operação convencional no mercado aberto feita nas próprias letras do Tesouro desses bancos centrais.

E o ponto central de toda a literatura a respeito da armadilha de liquidez reside no fato de, em condições como estas, as operações convencionais de mercado aberto não produzirem efeito – elas simplesmente promovem a substituição de um ativo de juro zero, a base monetária, por outro, títulos de curto prazo da dívida do governo. Assim, as intervenções cambiais não produzem efeito nenhum.

As coisas seriam diferentes se os bancos centrais adquirissem em vez disso ativos de longo prazo; neste caso estaríamos falando em um relaxamento quantitativo feito pela porta dos fundos. Mas não vejo motivo para crer que bancos centrais que relutam em comprar dívidas domésticas de longo prazo estejam mais dispostos a comprar títulos de uma dívida estrangeira de longo prazo.

Assim sendo, uma onda de compras mútuas de moeda estrangeira não produziria efeitos negativos, mas em nada ajudaria.

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Fonte: jornal O Estado de S. Paulo