Na USP, intelectuais manifestam apoio a Dilma e condenam Serra e voto nulo
Cerca de 2 mil pessoas superlotaram o prédio onde funcionam os cursos de História e Geografia para conferir declarações de renomadas personalidades do meio acadêmico paulistano. Discursaram na ocasião, entre outros, Alfredo Bosi, Celso Antônio Bandeira de Mello, Gilberto Bercovitch, Heloísa Fernandes, Laura de Mello e Souza, Lisete Arelaro, Marilena Chauí, Ricardo Musse e Vladimir Safatle.
Críticas ao voto nulo
O tom do ato foi de crítica à candidatura do presidenciável de direita, o tucano José Serra. O que não impediu os oradores de centrarem fogo em uma outra opção eleitoral, aparentemente expressiva entre a comunidade uspiana: o voto nulo. Foi o que fizeram acadêmicos como a professora Lisete Arelaro. Referindo-se a cartazes em defesa da anulação do voto, que desde há alguns dias disputam o prédio da FFLCH com outros, favoráveis a Dilma, a educadora disparou: “Só votamos nulo na ditadura militar porque não tínhamos alternativa. Convido os colegas que fizeram esses cartazes a refletirem melhor e votarem na Dilma, mesmo que a considerem apenas um mal menor”.
Manifestando-se em tom semelhante, a professora Heloísa Fernandes, filha do sociólogo Florestan Fernandes, leu carta em que afirma ter apoiado, no primeiro turno, o candidato Plínio Sampaio. “Mas agora, no segundo turno, discordo que não haja diferenças entre os dois candidatos e nem acho que eles sejam farinha do mesmo saco. Ao contrário, penso que Dilma e Serra representam dois projetos de governo, dois blocos de classes, duas concepções de mundo e, mais ainda, dois mundos de sentimentos.”
Dois projetos, duas concepções
A distinção entre os “dois projetos” e as “duas concepções de mundo” referidos por Heloísa Fernandes foi esmiuçada pelo jurista Gilberto Bercovitch. Para ele, há de um lado as privatizações, o desmonte do Estado e da educação pública. “O futuro que desejamos não é esse. Não podemos ceder ao obscurantismo que está sendo ressuscitado com Serra. Vamos mandá-los para a lata de lixo da história, que é o lugar deles”, convocou, sob aplausos.
Também Alfredo Bosi buscou tecer nítida demarcação entre os representantes “do retrocesso, de uma política econômica centrada só no capital”, de um lado, e “um projeto que abarca o desenvolvimento e respeita o trabalho e a natureza”, de outro. Para Bosi, esse último é o projeto de Dilma Rousseff, cuja candidatura estaria “penetrada de um sentido social, forte e dinâmico, que começou a ganhar consistência nos últimos anos do governo Lula, levando a uma entrada maciça de pessoas na classe média”. Bosi citou a diminuição da mortalidade infantil e do desemprego, além da elevação do nível da escolaridade básica e do índice de desenvolvimento humano como conquistas que orientam seu voto na candidata Dilma.
Filósofos em apoio a Dilma
Andréa Loparic, professora do Departamento de Filosofia da USP, leu trechos do manifesto dos filósofos em apoio a Dilma Rousseff. O texto é subscrito por 846 nomes, encimados por professores como João Quartim de Moraes, Marilena Chauí, Oswaldo Porchat, Scarlett Marton e Vladimir Safatle, dentre outros.
Em um de seus trechos, o manifesto dos filósofos afirma: “A história da democracia, desde seus primeiros momentos na pólis ateniense, é a história da progressiva incorporação à comunidade política dos que outrora se viam destituídos de voz (…). Que tal incorporação se mostre efetiva pressupõe que os cidadãos disponham das condições materiais básicas para seu reconhecimento como tais. (…) Os programas de transferência de renda implementados pelo governo (…) fortaleceram nossa democracia ao criar bases concretas para a cidadania de milhões de brasileiros. Se atentarmos ao seu formato institucional, veremos que eles proporcionam condições para a progressiva autonomia de seus beneficiários, ao invés de prendê-los em um círculo de dependência. Que mulheres e homens beneficiados por tais programas confiram seus votos às forças que lutaram por implementá-los não deve surpreender ninguém – trata-se, afinal, da lógica mesma da governança democrática.”
Disputa acirrada
Em sua intervenção no ato, a filósofa Marilena Chaui denunciou a intento da candidatura Serra de relacionar o PT e Dilma a atos de violência. Segundo Marilena, a articulação seria no sentido de simular baderna durante um comício de Serra. As cenas seriam usadas sem que a campanha petista tivesse tempo de responder. "Dois homens diziam: 'dia 29, nós vamos acertar tudo, vamos trazer o pessoal vestidos com camisetas do PT, carregando bandeiras do PT e vão atacar pra tirar sangue, no comício do Serra", reafirmou a filósofa, em entrevista à Rede Brasil Atual. "É preciso alertar a sociedade brasileira toda, alertar São Paulo e alertar os petistas", afirmou Marilena. A ação estaria em planejamento em um bar de São Paulo, no final de semana.
Interagindo com preocupações desse tipo manifestadas durante o ato, a filósofa Andréa Loparic alertou: “Não temos de nos surpreender com a violência que vem sendo praticada por eles. Isso é uma guerra, uma guerra em defesa do futuro do Brasil”.
Ao longo do ato, além dos intelectuais já citados fizeram uso da palavra o senador Eduardo Suplicy e o ex-prefeito de São Carlos, Newton Lima Neto. A professora Laura de Mello e Souza leu mensagem do pai, o sociólogo e escritor Antônio Cândido, para quem “votar em Dilma Rousseff é assegurar a continuidade e o futuro”. Também foram lidas declarações de voto do professor de Literatura Brasileira João Adolfo Hansen e do jurista Dalmo Dallari.