Iniciativa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) – fundação pública federal vinculada à Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República –, a atividade tem como objetivo constituir um espaço nacional de debates voltado à massificação do tema do desenvolvimento.

E a Conferência parece estar atingindo seu objetivo. Desde a manhã de ontem uma multidão estimada em 4500 pessoas circula pelas salas, auditórios e estandes abrigados no local do evento – espécie de “cidade do desenvolvimento” erigida em pleno canteiro central da Esplanada dos Ministérios em Brasília. O público é tão vasto quanto variado: são estudantes, professores, pesquisadores, reitores, militares, profissionais liberais, parlamentares e gestores públicos – todos aparentando grande sede de informações sobre um tema que hoje volta à tona, após praticamente desaparecer do debate público durante os anos neoliberais.

O temário do encontro é bastante amplo, abarcando praticamente todo tipo de questão que guarde paralelo com o desenvolvimento econômico-social. Para que se tenha uma ideia, no primeiro dia de seus trabalhos a Code debateu temas como “Heterogeneidade produtiva no Brasil”, “Por uma nova gestão pública”, “A mobilização da juventude na construção de alternativas de desenvolvimento do país”, “A importância da pesquisa e da pós-graduação no desenvolvimento”, “Judiciário e cidadania”, “Os direitos humanos e o desenvolvimento”, “Sustentabilidade ambiental”, “Evolução e estrutura das políticas sociais no Brasil”, “Comércio exterior e inovação”, “Comunicação e democracia”, “Políticas públicas de fomento ao setor de telecomunicações e banda larga” e “Inserção internacional soberana”, dentre muitos outros.


Barroso (esq) e Nilmário (dir) em debate protagonizado pelas fundações partidárias

Debate com as fundações partidárias

Revalorizar a política, tornando-a elemento fundamental do exercício da cidadania, e conceber um projeto de desenvolvimento capaz de incorporar, para além do crescimento econômico, o bem estar social. Esses foram os principais consensos delineados no debate “A política e a macroeconomia”, ocorrido na tarde de ontem no âmbito da 1º Code. Idealizado pela Diretoria de Estudos Macroeconômicos do Ipea, o evento reuniu representantes de diversas fundações partidárias.

Compuseram a mesa Aloísio Sérgio Barroso, diretor de Estudos e Pesquisas da Fundação Maurício Grabois; Nilmário Miranda, presidente da Fundação Perseu Abramo (PT), e Eliseu Padilha, presidente da Fundação Ulysses Guimarães (PMDB). Impossibilitado de comparecer à atividade, Carlos Siqueira, da Fundação João Mangabeira (PSB), enviou cópias de um paper contendo o conteúdo de sua exposição.

O presidente da Fundação Perseu Abramo, Nilmário Miranda, abriu o debate louvando a ideia de reunir em uma mesma mesa diversas fundações partidárias. “As fundações partidárias são uma das poucas originalidades deste país. Trata-se de algo criado quando das discussões que resultaram na Lei Orgânica dos Partidos Políticos, a qual prevê a destinação de 20% da quota do fundo partidário a essas instituições de pesquisa e formulação”, explicou Miranda.

Iniciando sua abordagem sobre o tema da mesa, o representante da fundação petista afirmou que um projeto de desenvolvimento com distribuição de renda requer a reformulação das políticas públicas e do próprio desenho institucional do Estado. “Foi o que buscamos fazer na política exterior e na política social, entre muitas outras áreas.” Nilmário listou uma série de tarefas que segundo ele permanecem como desafios no sentido do alcance pleno de um novo modelo de desenvolvimento para nosso país. Dentre elas deu relevo à reforma política, citando que o presidente Lula vem insistindo na tese de uma constituinte exclusiva sobre os temas relacionados à arquitetura das instituições políticas. Outro tema destacado foi o da sustentabilidade ambiental.

Além disso, o presidente da Fundação ligada ao PT centrou boa parte de sua exposição na importância da política para o alcance do desenvolvimento. Para ele, “se pensamos em mudanças profundas, capazes de colocar o país na rota do desenvolvimento econômico-social, o caminho é o da política. O próprio termo ‘economia política’ já traz em si a constatação de que as decisões econômicas não são neutras e impessoais. Elas dependem, na verdade, de opções políticas”.

Nilmário lamentou o que considera uma “grande campanha” orquestrada pelos meios de comunicação “contra a política e os políticos”, e concluiu sua fala afirmando ser necessário, diante dessa realidade, “lutar para recompatibilizar a política com a sociedade, porque o futuro depende das decisões políticas que tomamos hoje”.

Crescimento econômico com avanços sociais

Após agradecer ao Ipea pela oportunidade e parabenizá-lo pela importante iniciativa materializada na 1º Conferência do Desenvolvimento, Aloísio Barroso dividiu sua exposição em três constatações relacionadas ao cenário político-econômico contemporâneo.

O diretor da Fundação Maurício Grabois iniciou a primeira de suas três observações afirmando que “ainda vivemos estágios da crise econômico-financeira estabelecida desde 2007, tendo como marco a quebra do banco Lehman Brothers”. Barroso notou que a crise vem atingindo fortemente os países centrais, e que mesmo um país como os Estados Unidos encontra hoje fortes dificuldades para honrar seus compromissos.

Segundo Barroso, o pacote econômico americano anunciado às vésperas da reunião do G-20 – por meio do qual os Estados Unidos inundaram o mundo de dólares – foi fortemente recusado em todo o mundo, levando a uma enxurrada de críticas por parte de amplo leque de países, que reuniu desde as Filipinas (“praticamente uma semi-colônia americana”) até a Alemanha. Na visão de Barroso, esses acontecimentos revelam que, apesar de manter sua posição dominante no sistema internacional, os Estados Unidos revelam crescentes dificuldades.

Um segundo apontamento realizado pelo pesquisador da Fundação Grabois diz respeito à recuperação da autonomia do país na formulação de suas políticas de Estado. Segundo Barroso, nos anos neoliberais os países periféricos perderam a capacidade de fazer política macroeconômica e ficaram submetidos à vontade e aos ditames dos países centrais. Com o governo Lula o Brasil teria recuperado sua capacidade de controlar as variáveis chave de sua política econômica. Para Barroso, contudo, isso não se deu apenas em relação às três grandes variáveis macroeconômicas (monetária, cambial e fiscal). “Quando falo em política econômica, me refiro também a coisas como política salarial, creditícia e de investimentos. Isso também é política econômica.”

Barroso finalizou sua intervenção com uma observação sobre o atual contexto político brasileiro. Para ele, face ao quadro mundial atual, repleto de pressões do imperialismo contra os países em desenvolvimento, o sucesso eleitoral das forças progressistas – conquistado no último dia 31 de outubro – representou uma vitória “espetacular”. Com ela, na visão de Barroso, estão dadas condições para novos avanços. Para viabilizá-los será necessário, entretanto, equacionar os preços chave da economia (câmbio e juros). No mesmo sentido, será necessário buscar o crescimento econômico sem descuidar da promoção de avanços na área social.

Em aparente reação às críticas proferidas por Barroso no final de sua fala aos atuais pilares da política macroeconômica, Eliseu Padilha iniciou sua exposição evocando como essenciais à estratégia de desenvolvimento econômico os mesmos pilares dotados nos últimos anos: câmbio flutuante, metas de inflação e responsabilidade fiscal.

O representante da fundação peemedebista lembrou que desenvolvimento não é algo que se possa medir apenas por meio do PIB, sendo necessário dar mais destaque a índices como o IDH, supostamente mais capazes de medir os resultados sociais do processo de desenvolvimento.
Para ampliar o alcance social do desenvolvimento, Padilha listou algumas tarefas que considera essenciais: desconcentrar a economia, com mais apoio às pequenas e médias empresas; melhorar as políticas públicas de saúde, a assistência social e a rede de proteção à criança e ao adolescente, e realizar as reformas tributária (“fiscal”, nas palavras do ex-deputado federal) e política.

Segundo o presidente da Fundação Ulysses Guimarães, grande vitória alcançada nos últimos anos diz respeito ao envolvimento da população na elaboração, na implementação e na avaliação das políticas públicas. Isso teria se dado por meio de instrumentos como conferências, consultas públicas, conselhos e fóruns. Padilha citou como exemplo disso o fato de que políticas como as de saúde, educação, assistência social e criança e adolescente são todas acompanhadas, na atualidade, por conselhos enraizados na sociedade a partir do plano municipal. “Isso envolve a cidadania e torna menos falho o controle social”, postulou.

Padilha deu ainda grande destaque em sua fala à importância da política educacional para o alcance do desenvolvimento. “Faço política há 40 anos e nesse período aprendi a importância da educação. Sem ela não resolveremos os dilemas do país. Não podemos pensar em desenvolvimento sem resolver a questão da educação. Na Europa e nos Estados Unidos, cerca de 85% da população possui o equivalente ao 3º grau”, afirmou.

Padilha falou ainda da valorização da política, tema mencionado anteriormente por Nilmário Miranda. “A partir da Queda do Muro de Berlim e do estabelecimento da chamada ‘globalização’, o que tivemos foi uma hipervalorização do capital e uma desvalorização dos valores humanistas. Foi aí que teve início o processo de descredenciamento da política. Isso é muito ruim, pois fora da política não há salvação”, concluiu.

Livros da Fundação Grabois lançados na Conferência


Da esq. para a dir.: Aloísio Sérgio Barroso, João Sicsú, Fábio Palácio, Renato Rabelo e Marcio Pochmann

Logo após o debate protagonizado pelas fundações partidárias, a Fundação Maurício Grabois realizou o lançamento dos livros “Desvendar o Brasil – Suas singularidades, contradições e potencialidades” e “Desenvolvimento – Ideias pra um projeto nacional”. Compuseram a mesa do evento Renato Rabelo, presidente nacional do Partido Comunista do Brasil; Marcio Pochmann, presidente do Ipea, e João Sicsú, diretor de Estudos Macroeconômicos do Ipea, além dos diretores da Fundação Fábio Palácio e Aloísio Barroso.

Além de destacar positivamente o significado da 1º Conferência do Desenvolvimento, os convidados foram unânimes em relevar a importância dos livros publicados pela Fundação Grabois para o debate atual sobre os rumos do país. Os livros vêm sendo divulgados nos estandes da Fundação e da Editora Anita Garibaldi, obtendo excelente aceitação entre os participantes da 1º Code.

A 1º Conferência do Desenvolvimento segue até amanhã (26). Além de debates e seminários, a Conferência divulga publicações impressas e audiovisuais, a exemplo de filme sobre a vida de Celso Furtado que terá sua primeira exibição realizada hoje (25) à tarde. Na “cidade do desenvolvimento” também estão abrigadas exposições sobre temas diversos. Entre elas, uma em homenagem ao mesmo Celso Furtado.

De Brasília.