Filme expõe porões da tortura no Brasil
O objetivo era denunciar no exterior o que ocorria nos porões da ditadura brasileira.
O filme foi realizado em 1971, em Santiago, no Chile, para onde os brasileiros foram banidos. O documentário foi uma iniciativa dos cineastas americanos Haskel Wexler e Saul Landau, que estavam no Chile para produzir material sobre o presidente Salvador Allende e souberam da presença dos brasileiros.
Quase todos os guerrilheiros que deram depoimentos não assistiram ao filme até hoje. Dois deles se suicidaram alguns anos depois: Frei Tito e Maria Auxiliadora Lara Barcelos, uma das mais próximas amigas da presidente eleita, Dilma Rousseff, no período da Var-Palmares, no início da década de 70.
Nas imagens, os ativistas simulam vários tipos de tortura, como uma pessoa tendo seu corpo esticado, com pés e mãos amarrados entre dois carros. Simulam a "mesa de operação": sem roupa, ou só de cueca, o torturado deita na mesa, tem os braços e pernas amarrados nas extremidades e sofre pressão na espinha. Uma barra de ferro, no alto, tem um barbante amarrado aos testículos. A pessoa era obrigada a ficar por duas ou três horas na posição, suportando o peso do corpo com as mãos e braços.
O jornal O Globo enviou cópia a alguns dos protagonistas, que somente agora tiveram acesso ao documentário e relembraram o depoimento. Jean Marc Van der Weid, hoje diretor de uma ONG de agricultura alternativa, defendeu a luta armada no filme como única maneira de o povo chegar ao poder no Brasil ditatorial:
"Nunca tinha visto. Era um filme de denúncia contra a ditadura e produto de um momento inteiramente diferente de hoje. Não me lembrava nem do que falei. A ideia da luta armada era generalizada em quase todas as organizações de esquerda", disse Jean Marc, que era presidente da UNE quando foi preso e atuou na Ação Popular (AP).
Militante do PCBR, Elinor Mendes Brito aparece no documentário contando detalhes das técnicas de tortura, demonstrando no corpo de sua companheira de organização Vera Rocha Pereira em que partes eram aplicados os choques elétricos.
"Me sinto até mal assistindo hoje a essas imagens, fazendo isso com companheiros. 'Torturar' uma amiga, na demonstração, foi um horror. É um filme muito realista, e o objetivo era mostrar exatamente como eram as técnicas. Não era forçação de barra. Era emocional", disse Elinor Brito, que foi torturado em quatro instalações militares distintas. Hoje, Brito é funcionário da Comlurb, no Rio.
Fonte: O Globo