A agenda ambiental subiu de patamar nas prioridades do Ministério da Ciência e Tecnologia na gestão recém-inaugurada por Aloizio Mercadante. Está em gestação a criação de um Conselho de Biodiversidade, a mudança climática ganhou destaque e o Brasil pode ser pioneiro em laboratórios marinhos em alto mar. Na Amazônia, a estratégia é criar parques tecnológicos e incubadoras de empresas que tenham a biodiversidade como insumo – a intenção é agregar valor aos bens da floresta.

A marca que o novo ministro pretende imprimir ficou clara em seu discurso de posse. Mercadante mencionou várias vezes que o futuro está na “economia verde”. O sinal mais evidente de que ele realmente acredita que a sustentabilidade ambiental é um dos eixos do futuro surgiu ao convidar Carlos Nobre, o mais famoso climatologista brasileiro, para a Secretaria de Políticas e Programas de Pesquisa e Desenvolvimento (Seped). Nobre, que trabalha no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e coordena a Rede Clima – que agrupa 60 instituições e mais de 470 pesquisadores – , aceitou. Em poucos dias estará no comando de políticas e programas de desenvolvimento científico para oceano, Antártica, biodiversidade, biotecnologia, nanotecnologia, meteorologia, hidrologia e, evidentemente, mudança climática.

Um dos primeiros passos é formar um centro de prevenção de desastres naturais com base nos cenários traçados pelo supercomputador que acaba de ser inaugurado no Inpe, o terceiro maior do mundo em meteorologia. “Vamos ampliar para o Cerrado o mapeamento que já fazemos para a Amazônia”, disse o ministro ao Valor. Mas melhorar o controle sobre os ecossistemas é só um dos usos do novo computador. Ele será fundamental na previsão meteorológica e na prevenção de desastres naturais, área em que Nobre já vem trabalhando há algum tempo. O mapa de áreas de risco de inundações e deslizamentos de terra indica 500 pontos e cinco milhões de pessoas expostas. Há Estados que têm este mapa detalhado, mas outros não. A intenção é prosseguir com os estudos, cruzar com a previsão meteorológica do Inpe e antecipar a prevenção de desastres.

Outra diretriz será, claro, a Amazônia. “O Brasil é o G1 da biodiversidade mundial”, diz o ministro. “Temos que desenvolver instrumentos para transformar esta biodiversidade em desenvolvimento econômico.” A contenção do desmatamento tem sido um trunfo, mas é hora de criar empregos de qualidade na região, diz ele.

Outro ponto é valorizar os centros de pesquisa da região como o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), de Manaus, o Museu Emilio Goeldi, em Belém, ou o Mamirauá, em Tefé, no Amazonas. “A primeira coisa que estou fazendo é criar uma coordenação, porque ela não existe”, explica. “Cada um trabalha em seu projeto, na sua área, seu bioma, sua dinâmica, mas não existe um conselho que coordene, planeje ações, junte forças”, prossegue. “Não é só investir na pesquisa da biodiversidade, mas também no desenvolvimento da economia verde. É isto que trará perspectivas econômicas.”

Em conjunto com o Ministério do Meio Ambiente, o MCT pretende iniciar um inventário da biodiversidade do País.

Mercadante assumiu um Ministério que cresceu de estatura nas gestões anteriores. Em 1987, o Brasil formava cinco mil mestres e doutores, um número que hoje bate em 50 mil. Há uma oferta de 155 mil bolsas de estudo. O desembolso da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) de ciência e tecnologia era de cerca de R$ 475 milhões em 2002 e foi de R$ 4 bilhões em 2010. Há 122 institutos nacionais de ciência e tecnologia no país e dentro do ministério são 18 institutos de pesquisa, vários considerados centros de excelência. “Agora falta criar a carreira de pesquisador nas universidades”, imagina. Outro passo é articular a vida acadêmica e o mundo da produção, duas pontas que pouco se juntam.

Mercadante quer fortalecer o que ele chama de “sociedade do conhecimento”. Um dos alicerces é criar o que chama de “comitês de busca e atração” para seduzir os talentos brasileiros que foram viver no exterior durante a recessão. Ele estima que há 3 mil brasileiros dando aula nos Estados Unidos. “Isto é parte da nossa Inteligência. Muita gente foi embora por falta de condições nos anos de baixo crescimento, mas acho que este é o momento do Brasil.”

Ele sugere a organização de um portal na Internet para que os talentos se tornem conhecidos e conectados a institutos de pesquisa e empresas por aqui. Também está interessado em abrir espaço para que cientistas estrangeiros possam passar um período nas universidades ou institutos brasileiros. Para isto, cita a necessidade de serem feitos “ajustes” na legislação. “Não estou falando em mudar as regras dos concursos de docência, mas o primeiro requisito para uma universidade chamar um professor estrangeiro é que ele tem que dominar a língua. Mas, assim, vamos excluir muita gente.”

Ministro quer usar estrutura do pré-sal e construir um laboratório em alto mar
Na semana passada o ministro Aloizio Mercadante teve reuniões com executivos da Petrobrase Braskem, com a Marinha e a ministra Izabella Teixeira do Meio Ambiente, com a comunidade científica e acadêmica para começar a dar corpo a um projeto ousado: construir um laboratório em alto mar para estudar as correntes marítimas, os impactos do aquecimento global, o solo, o fluxo de peixes, a biodiversidade marinha e o que mais for interessante a 500 km da costa brasileira. “Não podemos ter o pré-sal como nossa única relação com o mar”, diz ele. “Vamos dar grande prioridade a este projeto, que é inédito. Não existe no mundo nada semelhante.”

Duas possibilidades estão em estudo. Uma delas é o governo adquirir o casco de um porta-aviões como o do célebre Minas Gerais que foi vendido como sucata, ao preço da tonelada de aço. A Petrobras poderia ancorá-lo no fundo do mar. A outra é aproveitar a casca de uma plataforma de petróleo. “Vamos colocá-lo no limite da nossa área na plataforma continental, lá na ponta”, adianta Mercadante. “A intenção é fazer pesquisa lá no meio do oceano.”

O ministro diz que a logística do pré-sal viabiliza a iniciativa e relativiza os custos porque o laboratório aproveitaria a estrutura de abastecimento, de locomoção e de suporte às plataformas, por exemplo. “Seria uma resposta muito inteligente que o Brasil estaria dando, de um país que quer ter responsabilidade ambiental além de usufruir das riquezas do mar.”

Segundo ele, “a presidente [Dilma Rousseff] adorou a ideia” e “está muito comprometida com este projeto”. O governo já está criando um grupo de trabalho para tocar o laboratório marinho. Mercadante concorda que há um contrasenso entre explorar as riquezas do pré-sal e alinhar o país em direção a uma economia descarbonizada. “São dois movimentos”, raciocina. “Há uma demanda crescente na economia mundial por gás e petróleo e há uma busca forte por novos combustíveis e energia renovável”, começa, lembrando que o Brasil tem matriz energética limpa. “Mas o mundo precisa de petróleo e vai precisar por muito tempo ainda”, prossegue.

O país, avalia, escapa da armadilha “se souber usar esta riqueza do pré-sal, que é uma janela de oportunidades”. Como? “Não podemos usar os royalties do petróleo pulverizados com gasto corrente, mas focar em educação, ciência e tecnologia e meio ambiente para produzir uma sociedade do conhecimento e ter compromisso com as gerações futuras.”

_____________________________________________________________

Fonte: Valor Econômico