Em 1960, o poeta e cordelista nordestino Antônio Teodoro dos Santos, publicou um cordel com o título: ”O Encontro de Lampião com Dioguinho”, de onde retirei a trova:

                                              -…E o tal Rocha Figueira
                                               Que se chama Dioguinho,
                                               Lá na região do sul,
                                               No distrito de Cravinhos,
                                               Fez a polícia correr,
                                               Sem “acertar o caminho”… .

                                                                          
                                                              
DIOGUINHO AO CENTRO. FOTO HISTÓRICA, CEDIDA POR ANTÔNIO FERNANDO PEREIRA, DO RAMO DO TURISMO, MORADOR DE BOTUCATU (SP)

      Tal como antigos semideuses da mitologia greco-romana, coexiste uma infinidade de versões sobre a vida e a morte de Dioguinho, “o homem terror”. Dioguinho foi o maior bandido de todos os tempos na região da Alta Mogiana, interior de São Paulo, que basicamente fica circunscrita à região de influência de Ribeirão Preto.

      O bandido Dioguinho, ou Diogo da Rocha Ferreira, nasceu em Botucatu (SP), em 09 de outubro de 1863 e morreu (ou desapareceu) em terras da Fazenda Tatuca, à época fazendo parte do município de Jataí (SP), hoje cidade de Luis Antônio (SP), região de influência de Ribeirão Preto; em 01 de maio de 1897; portanto faleceu com apenas 34 anos de idade! E como deixou estórias!!!!!

      Passaram-se 113 anos e até hoje só o fato de falar nele, provoca arrepios de quem vive na região onde ele atuava. Dioguinho era filho de um comerciante e de uma dona de casa, embora eu tenha encontrado um sem-número de registros, onde se dizia ser ele filho de um rico fazendeiro. Pelo que concluí, não passam de balelas!

      Dioguinho, que era agrimensor (ver N. A.), trabalhou também, entre outras, nas regiões de Cravinhos e São Simão. Foi casado e morou por uns tempos em Vila Mato Grosso de Batatais, hoje Altinópolis (SP), onde ele tinha amigos e protetores. No entanto vivia uma vida nômade, por ser um peregrino fugitivo.

      Ele trabalhava em levantamentos topográficos nos lugares onde estavam sendo construídas, à época, as primeiras linhas de trens no interior de São Paulo e de Minas Gerais. Por este motivo há referência de sua presença em São Sebastião do Paraíso e Uberlândia (ambas em Minas Gerais), assim como em Sorocaba, Itu e Porto Feliz (SP), lugares muito longe da sua área de atuação como bandido. Ao que parece, ele ficava trabalhando longe da Alta Mogiana (região de Ribeirão Preto), mas quando era chamado (por carta), ele ia e fazia o serviço e voltava a trabalhar. As várias indicações de que ele era também um “Oficial de Justiça”, não parece ser verdadeira, porém um topógrafo; ainda que protegido por fazendeiros influentes (alguns eram políticos), não teria condições de contratar um advogado para defendê-lo. Ainda mais um advogado com o prestígio e a estatura de um Ruy Barbosa; somente uma grande influência entre magistrados abalariam Ruy de sair da Bahia ou do Rio de Janeiro, para defender um bandido em São Paulo. Por isso, é bem provável que algum juiz o tenha usado nesse mister, uma ou outra vez.

      Ele jamais foi esquecido: até autores de música sertaneja, como o Ado Benatti (e seu superego “Zé do Mato”); autor entre outras, das músicas: “Bom Jesus de Pirapora” e “Transporte de Boiada”; publicou dois livros falando sobre o célebre facínora da região da Alta Mogiana: “Os Crimes do Dioguinho” e “A Morte do Dioguinho”.

      O iminente jornalista Luis Nassif ([email protected]) menciona que até o expoente máximo dos advogados do Brasil e político de projeção internacional, Rui Barbosa, defendeu “protetores do Dioguinho”, ricos senhores (alguns eram políticos) que habitavam a região da Alta Mogiana, que se utilizavam dos “serviços” de Dioguinho. Thadeu Quintanilha Martins pós-graduando em História Pela PUC-SP levantou alguns processos judiciais que contaram com a participação de Rui Barbosa:

      “…Naquele início dos século 20, havia uma tentativa de enfraquecimento do poder dos “coronéis” paulistas pelo presidente do Estado. O caminho encontrado foi rastrear os crimes do Dioguinho, jagunço famoso na época; matador profissional. Em 1898 (N. A.) Dioguinho cortou as orelhas e o nariz de uma mulher a mando do marido. Ela procurou o governador, que ficou estarrecido. Ocorre que Dioguinho era protegido de figuras importantes da região, no caso um grande fazendeiro e Senador da República: Alfredo Ellis Jr. Mesmo assim, o delegado não teve dúvidas, invadiu a fazenda do Senador e apreendeu documentos e cartas ligando-o ao matador, e pediu a sua prisão.

     O delegado era uma figura curiosa: jovem, tinha menos de trinta anos, tuberculoso, poeta e jornalista, além de ex-aluno da São Francisco e filho de Desembargador. Na época não existia ainda a polícia de carreira e os delegados eram escolhidos a dedo pelo governador. Sem proteção, Dioguinho foi morto numa emboscada e o Senador defendido por Rui Barbosa. Apesar das provas, Rui alegou o costume brasileiro de receber bem na sua casa todo tipo de gente. Era um hábito nobre que não podia ser confundido com crime, ou proteção ao criminoso. E venceu …”.

       N.A.: o fato aludido ocorreu antes dessa data, pois no ano grafado, o bandido já estava morto (pelo menos oficialmente, como veremos na continuação).

     DIOGUINHO COMO PERSONAGEM DA LITERATURA BRASILEIRA

      -O escritor João Garcia (João Garcia Duarte Neto), que publicou em 2002 o livro “Dioguinho, o Matador de Punhos de Renda”, sugere, baseado em sua pesquisa, que o bandido Dioguinho era homossexual. No entanto o próprio autor afirma que não ficou convencido de que o Dioguinho era homossexual, conflitando do que diz o livro do promotor de Batatais (SP). O próprio João Garcia invoca o testemunho da pesquisadora Selma Siqueira (PUC-SP) e autora de uma tese sobre Dioguinho, para quem o matador era realmente “macho” e chegou a ter mais de uma mulher ao mesmo tempo. Autores antigos que publicaram textos sobre Dioguinho, jamais falaram sobre essa faceta do bandido. Cito os autores Antônio Godói; ou Antônio de Godoy Moreira Costa (publicado em 1903) e João Amoroso Neto (publicado em 1945). Por outro lado, João Garcia, segundo a historiadora Nilce Camila de Carvalho, é neto de um Coronel-Major da época de Dioguinho e muitas das histórias que conta em seu livro, dever ter ouvido diretamente da boca de pessoas da família; o quê torna patente que a depreciação da “macheza” de Dioguinho em seu livro, não deve ser levada muito em conta; os fatos sim!

      -É de 1903 a publicação do livro “Dioguinho, narrativa de um cúmplice em dialecto”, de Antonio de Godoi (Godoy) Moreira Costa, 4º Delegado de Polícia da capital que foi o encarregado, em 1897, de comandar a captura de Diogo.) É também de sua autoria o artigo “O Dioguinho”, publicado na Revista do Departamento de Investigações da Polícia em 1949.

                                          
                                   FAC-SÍMILE DA CAPA DOLIVRO DE JOÃO AMOROSO NETO

      João Amoroso Netto, também delegado de polícia paulista, publicou uma série de artigos sobre Dioguinho no jornal Diário da Noite, em 1949. Ele utilizou a narrativa de Antonio de Godoy, acrescentando a ela informações obtidas em processos judiciais arquivados nas Comarcas de Botucatu, Ribeirão Preto e São Simão; também se apoiou “na tradição oral de pessoas idôneas”, para “descrever a vida do maior bandido paulista de todos os tempos”, no livro “Dioguinho. História completa e verídica do famoso bandido paulista” (publicado em 1949). É de sua autoria o artigo “O Dioguinho”, publicado na Revista do Departamento de Investigações da Polícia em 1949. De forma geral, Amoroso apenas reproduz a “Longa e macabra relação de crimes praticados, ou a ele (Dioguinho), atribuídos". Destacou, como assim o fizera anteriormente Antonio de Godoy, detalhes bárbaros dos crimes atribuídos ao Dioguinho. Ambas as narrativas exploram o apelo emocional que a representação do homicida frio e violento suscita no leitor.

      Este autor que lhes fala supõe que o ingrediente usado por João Duarte (possível descendente da burguesia cafeeira paulista) é deliberadamente polêmico, com intenções comerciais. Como defesa do argumento usado por João Duarte, ele menciona que encontrou, nas páginas de um processo no fórum de Batatais, alguns depoimentos de vítimas que sobreviveram às tocaias de Dioguinho, onde está registrado de que ele mantinha relações homossexuais com Zequinha Maia, filho de um fazendeiro da região. Nas palavras do João Duarte, como o pai do Zequinha reprovava o fato, Dioguinho matou-o. Segundo ainda João Duarte, há registro no fórum de Batatais, que haviam sido encontrados na casa onde Dioguinho morava, perucas e roupas femininas. O restante parece ser apenas obra literária com detalhes hipotéticos. Segundo vasta documentação (e fotos), Dioguinho era, antes de tornar-se um bandido, um homem discreto, elegante, com bigodes de pontas viradas (à moda dos portugueses e de Joaquim Nabuco), apreciador de comidas finas, bebidas e festas. Este fato na sociedade conservadora da época pode sugerir que muita gente o invejava, pois era convidado sempre para festas e ceias em casas de famílias de posse, vestia-se bem e tinha educação refinada, ou quase. Ele era agrimensor, segundo vários relatos (este autor imagina que o correto seria dizer topógrafo, pois um agrimensor é um engenheiro e topógrafo é um técnico, cuja profissão era muito bem conceituada no final do século XIX, com o advento das ferrovias em todo o estado de São Paulo, especialmente a Companhia Mogiana e os vários ramais entre as principais estações da Alta Mogiana e as cidades produtoras de café da região) e isso o diferenciava! Dioguinho se relacionava bem com os principais fazendeiros da época. De seu nascimento em Botucatu, em meados do século XIX aos primeiros crimes, não se sabe ao certo quanto tempo passou. Sabe-se também que, através da influência dos amigos fazendeiros e políticos, Dioguinho foi também um Oficial de Justiça, passando a ter também amizades com todos os Juízes de Direito da região. À época, o progresso chegava aos sertões paulistas, o ciclo do café com a imigração italiana, o comércio de gado, a chegada da estrada de ferro, tudo num período em que o Brasil monarquista cedia lugar ao republicano.

      Servindo aos coronéis, Diogo era por eles protegido. Nunca foi preso. Tinha assento cativo às mesas ou alpendres das casas-sede dos latifúndios. Tinha, até, certo prestígio, segundo Garcia: o bandido assinou a ata da República. Existem depoimentos que o Dioguinho participou de reuniões da formação do Partido Republicano, em Cravinhos, em São Simão, na fazenda Alvarenga e em Itu; onde se deu a famosa "Convenção de Itu". Quando seus crimes começaram a incomodar o governo da então província, tornou-se um fugitivo.

      O cenário da região de Ribeirão Preto, naquele final do século XIX, era dominado pela figura dos coronéis, os grandes proprietários de terra locais. Quinzinho da Cunha, Francisco Schmidt, Luís Pereira Barreto, o próprio Francisco Bonfim, entre outros. Estes homens ricos, detentores de status social e poder político, tinham grande responsabilidade em manter a ordem civil e garantir o cumprimento das leis, mesmo que fosse ao seu modo. Às vezes mesmo os mais benfeitores coronéis tinham que recorrer a alguém disposto a fazer o “serviço sujo” que fosse necessário. Um desses era um pistoleiro chamado Dioguinho, que fazia favores a diversos coronéis dos arredores da Villa Bonfim. Mas após ter matado um viajante próximo a São Simão, passou a ser procurado e ainda tentou extorquir o Coronel Bonfim. Uma escolta policial de São Paulo veio em seu encalço e quase o capturou, em uma perseguição que custou a vida do irmão do pistoleiro. Dioguinho conseguiu fugir e posteriormente foi dado como morto.

      Pouco tempo depois, Francisco Bonfim passeava no trole em Cravinhos quando foi atingido por um tiro. O coronel não resistiu ao ferimento e faleceu naquele dia 02 de junho de 1898. O crime foi posteriormente atribuído a Dioguinho, fato que nunca pode ser provado pelo fato do pistoleiro continuar desaparecido.

      A PRIMEIRA MORTE DE DIOGUINHO (E AS OUTRAS QUE SE SABEM)

      Alguns artigos que este autor encontrou, falavam em 25 mortes de autoria do Dioguinho, outras citações falam em 50 mortes. Ao que se sabe, a primeira morte de Dioguinho foi a de um dono de circo, em Botucatu: segundo novela radiofonizada nos anos 1950, o dono do circo pegou o irmão do Dioguinho, Joãozinho; entrando escondido e sem pagar no circo, passando por sob a lona e a arquibancada. O dono do circo escorraçou o Joãozinho, pondo-o para fora do circo em gritos e, não contente, deu-lhe uma surra. Consta-se que Joãozinho teria dez anos de idade. Dioguinho ficou sabendo, foi até sua casa e pegou um punhal, indo ao encontro do dono do circo, que confirmou de que havia batido no irmão dele. Dioguinho, por vingança, matou-o a punhaladas. Há que entender também que, na vasta literatura a respeito de Dioguinho, outra versão do primeiro crime: numa caçada, ele e um amigo atiraram ao mesmo tempo numa perdiz enorme. O amigo disse que ele é que havia matado a perdiz e não o Dioguinho; e pegou o troféu de caça para si. Inconformado, Dioguinho ficou muita raiva e deu dois tiros no amigo, matando-o. Isso teria acontecido em Jaboticabal (SP), onde Dioguinho foi sentenciado, tendo se foragido em Altinópolis (SP). A segunda morte, pelo que se pode apurar, foi quando matou a punhaladas o namorado de uma irmã, “por questões de honra”.

       A partir daí, começaram a aparecer as “encomendas”. Pessoas influentes passaram a se servir de sua perícia com armas brancas ou de fogo, para livrarem-se dos desafetos. Interessante e inédito, ao menos para este autor, é o fato de Dioguinho ser mestre de Capoeira e usar também navalhas em suas lutas.

      -Tais crimes fizeram a história de um dos mais notáveis bandidos do século XIX. Seu bando, que assolou a “Alta Mogiana”, fez com que Dioguinho, para sua própria segurança, começasse a cercar-se de capangas: conseguindo assim, mais “fregueses”. E as mortes iam-se sucedendo, como veremos a seguir:

      …"e o Dioguinho, em pleno 1892, entrou na Venda de Tábua, ao lado da Estação Mogiana de mesmo nome e comprou uma espingarda nova. Saiu com a mesma para fora e municiou-a. Lá ao longe, caminhava um homem que recém saíra da Venda de Tábua e que levava um picuá às costas: de um lado açúcar e macarrão, do outro fubá. Dioguinho fuzilou-o pelas costas, só para experimentar a espingarda. Um caboclinho de seus oito anos, tremendo de medo, olhava com pavor para o “homem terror”. O Dioguinho sorriu amarelo e incitou o caboclinho a ir pegar o picuá nas costas do morto e levá-lo para sua casa. Dioguinho era assim: um assassino cruel, com arroubos ínfimos de bondade e doçura, que não duravam mais que um átimo”. No final do século XIX, época em que a região era a principal produtora de café do mundo e quando a modernidade como os “Correios” e a Estrada de Ferro Mogyana, estavam chegando à região. Felizmente um dia ele foi morto (1897), ainda que de tocaia; por policiais que o temiam, tanto quanto os familiares de suas vítimas, muitas delas ainda habitantes da região em que atuava a mando dos fazendeiros, que lhe davam guarida. Esse bandido era cumpridor de ordens dos coronéis. Quando a coisa adquiria um colorido não muito do agrado deles, o Dioguinho era chamado; engraçado, sempre através de cartas, o que demonstrava que a turma não ligava muito para o “negócio” de se comprometer. Eles chamavam e o Dioguinho vinha sempre; firme! Dioguinho se hospedava num hotelzinho aí; da Vila Bonfim, Cravinhos ou São Simão e aguardava as instruções finais. Matava mesmo.

      Conforme relatado pelo historiador Rubem Cione, no IV volume de seu livro “História de Ribeirão Preto”; o Sr. Bonfim, grande proprietário de terras e poder na região, certa vez o Capitão Alexandre Silva, pessoa iminente da Vila Bonfim, mandou vir um moleque sei lá de onde, bom de tiro e lhe deu dinheiro e instruções de como encontrar e matar o Dioguinho. Um amigo do Capitão Alexandre o preveniu e advertiu o Alexandre:

      -Pense bem, compadre: isso que você está fazendo vai mexer com todos da região. Se esse “cabra” matar o Dioguinho, os coronéis vão cair em cima dele que nem gavião em pintainho: não vai sobrar nada!

      Conclusão: no dia seguinte acharam o cadáver do tal cabra bom de tiro; já o Dioguinho seguiu vivo.

      Parece que o capitão entendeu o "cair em cima dele…"

      (Há quem diga que o Dioguinho tinha um modo peculiar de comprovar que dera conta da tarefa: cortava uma orelha da vítima e enfiava-a em um cordão, só para mostrar ao contratante. Perversidade é pouco, para definir o ato.)

      Outro relato, utilizado em novela radiofônica nos idos da década de 1950 com o título de ”Dioguinho, o Homem Terror”, pela extinta Rádio Tupi de São Paulo: certa vez um tal Coronel Cirino ficou muito magoado com sua filha, pois ele queria que ela um dia se casasse com um filho de gente próspera da alta Mogiana, mas a filha de apaixonou pelo seu professor de Francês, que o próprio coronel Cirino contratou para ensiná-la e torná-la uma moça culta. Pelo que se deduz, o professor também correspondia ao afeto de sua filha. O Coronel Cirino mandou uma carta chamando o Dioguinho. O Coronel pediu ao matador que a morte do professor fosse suave!!!!

      No dia seguinte a família do coronel foi viajar, deixando a casa à disposição do matador, que atraiu o professor até a casa, através de um bilhete.

      Quando professor chegou não encontrou a amada nem a família dela, só o Dioguinho.

      Então Dioguinho perguntou se ele era o professor da filha do Coronel; ele respondeu que sim. Dioguinho perguntou a ele se ele gostava da filha do coronel. O professor teria dito que a amava mais do que tudo. Então, Dioguinho depositou um revólver trinta e oito na mesa, depois um punhal e por último pegou uma caneca com água e despejou um pó dentro dela, informando ao professor que aquilo era veneno estricnina.

      Em seguida informou ao professor que ele iria morrer de qualquer jeito: mas que tinha o direito de escolha da forma em que iria morrer: de tiro, de punhalada ou por veneno.
Chorando, o professor escolheu a caneca com o veneno, tomando todo o líquido da caneca de olhos fechados: morreu ali mesmo!

      ROTEIROS DE CINEMA: FILMES FEITOS SOBRE A VIDA DE DIOGUINHO

      -Ano de 1917: pela primeira vez, dez anos após a morte do bandido, Dioguinho virou personagem do cinema brasileiro.

                      
                                         CARTAZ DO FILME PRODUZIDO EM 1916

       Rodado em 1916, com o título “Dioguinho”, o filme tem a duração de 72 minutos e estreou no Brasil em 01/02/1917, foi feito pelo Estúdio “Paulista Filme”, com direção de Guelfo Andaló e tinha no elenco: Antônio Latari, Elvira Latari, Georgina Marchiani e Antônio Rolando; além do roteirista A. Paladino, fotografia de João Stamato e produção de Guelfo Andaló e Farid Riskala.

      -Ano de 1957: Pela segunda vez, Dioguinho virou personagem do cinema nacional. Dirigido por Carlos Coimbra, coube ao ator Hélio Souto, que acabara de ficar famoso, fazendo o papel de galã na primeira novela da TV brasileira, na extinta TV Excelsior de São Paulo, juntamente com a então jovem atriz Rosa Maria Murtinho, Hélio Souto fez o papel de Dioguinho no cinema. O roteiro desse filme mostrou outro crime cometido pelo criminoso em Piracicaba, provavelmente a mando de uma família de usineiros de lá. O coitado do funcionário da usina tinha uma posição modestíssima na usina, mas ficou sabendo de falcatruas do patrão usineiro e certo dia, embriagado, disse isso ao patrão. O usineiro mandou chamar o Dioguinho, que por uma desculpa qualquer, num domingo com pouquíssimos empregados na usina, fez o coitado subir a grande chaminé de tijolos, com uma desculpa qualquer. Dioguinho havia dito ao coitado que ele precisava subir até a boca da chaminé, lá no alto. A escalada do funcionário era através de uma “escada” improvisada no lado externo da chaminé, cujos degraus, sem proteção nenhuma, eram nada mais que ferros dobrados e chumbados nos tijolos. O que o sujeito não sabia era que o próprio Dioguinho havia, na noite anterior e com consentimento do usineiro, soltado uma das pontas de um degrau, a pelo menos vinte metros de altura: quando o sujeito apoiou-se naquele degrau, este se soltou e o infeliz despencou lá do alto, morrendo instantaneamente e aparentando ter sido apenas um acidente.

      -Ano de 2000: pela terceira vez o Dioguinho virou personagem do cinema. Alguns atores independentes da cidade de Brodowski (SP), cidade natal do pintor Cândido Portinari, que fica próximo de Ribeirão Preto (SP), fizeram um filme maravilhoso sobre o bandido Dioguinho (segundo depoimento de quem o viu), o filme é fiel à história real, muito bem feito e sem nenhuma divulgação na mídia. Pelo que entendi nas pesquisas, este filme nunca passou em cinemas e alguns privilegiados o têm em DVD. Este autor não conseguiu saber quem o dirigiu e quem nele atuou, embora tenha tentado inúmeras vezes tal contato, enviando mensagens por e-mail até para o Secretário de Cultura atual (2010), Sr. José Marcos ([email protected]) e para o Sr. Guilherme Massonetto ([email protected]). O Sr. Guilherme respondeu, informando que não faz parte do governo municipal (e me fez supor que nada sabe sobre o assunto tratado) e o Sr. José Marcos, Secretário de Cultura, jamais respondeu minha mensagem! Diante disso tudo, não tive como passar aos leitores maiores dados sobre tal filme, visto que me faltam os nomes do roteirista, do diretor, do fotógrafo e dos atores; só para citar alguns dados.

      AS POSSÍVEIS RAZÕES DA TOCAIA E MORTE DE DIOGUINHO

      -Uma das possíveis causas da morte de Dioguinho, em 1897: segundo os relatos policiais da época, quem o matou foi a polícia da cidade de São Simão. O motivo que levou a polícia de São Simão, reforçada por policiais da capital de São Paulo, foi o fato de a polícia de São Simão já ter recebido denúncia, informando que Dioguinho estava extorquindo dinheiro de um fazendeiro de Ribeirão Preto (mais exatamente da cidade de Gaturamo, ou Vila Bonfim; atualmente Bonfim Paulista). Por um acaso, o Dioguinho passou com o bando por São Simão e assaltou e matou um viajante que passava por lá, fato que teve muitas testemunhas oculares. Mexida em seus brios, a polícia da capital mais a de São Simão, perseguiram o bandido até a barranca do Rio Mogi, onde foi que o bandido entrou numa canoa para fugir do tiroteio, tentando fugir para outra margem. Os policiais fuzilaram o Dioguinho dentro da canoa, no meio do rio. A canoa virou com o  Dioguinho mais duas pessoas. As duas pessoas que acompanhavam o Dioguinho foram exibidas à população pelos policiais, porém o corpo do Dioguinho nunca foi encontrado. É sabido à boca pequena que um “coronel” de Bonfim Paulista foi considerado, pelos outros fazendeiros da região, culpado pela morte de Dioguinho. O fato é que o tal Coronel Alexandre foi morto numa tocaia por antigos capangas de Dioguinho, logo após a morte do facínora; ao que se supõem, os outros fazendeiros mandaram matá-lo, usando a mesma fórmula tantas vezes usada com o Dioguinho! Dioguinho sabia das negociatas dos fazendeiros, dos arranjos políticos, além dos ”podres” de muita gente importante daquela época. O Dioguinho, vivo, era um perigo para os poderosos!

      -Segundo João Garcia, escritor de “Dioguinho, o matador de punhos de renda”, a fazenda em que Dioguinho estava acoitado à época de sua “morte”, era propriedade do senador Alfredo Ellis Jr. Os poderosos da região, após a morte de Dioguinho foram denunciados pelo Dr. Godói: Ruy Barbosa, o maior tribuno brasileiro da época, foi contratado a peso de ouro e todos os envolvidos foram absolvidos.

      -Outra possível causa: conforme a “FUNCUS”-Fundação Cultural Simonense, de São Simão (SP); Todo Estado já tinha conhecimento do famoso bandido “Diogo da Rocha Figueira – Dioguinho”, mas nada de providência pelas autoridades. Sua última ação e de seu bando foi o caso da Balbina, mulher muito bonita e mandona; mulher que nunca foi sua mudou-lhe talvez a sorte e o destino. Isso foi no mês de março 1887.

      Balbina, namoradeira, tinha um caso com Marciliano Pereira Machado (Marciliano fogueteiro). O comerciante Manuel Ferreira, de ciúmes da mulher pediu ao famoso bandoleiro que resolvesse a questão. No dia seguinte Marciliano estava desembarcando na “Estação do Cerrado”; Ao sair da estação foi seguido pelos bandidos e Dioguinho, que deram tiros nas costas de Marciliano. Balbina foi judiada pelos bandidos; No outro dia fugiu para Casa Branca, onde tinha parentes, que a aconselharam a ir para São Paulo dar parte no departamento especializado.

      Foram ordenados ao delegado de polícia, Dr. Antônio de Godoy Moreira e Costa, que com sua equipe vieram para São Simão e Cravinhos atrás do bandido, assessorados pelo Coronel Pedro França Pinto. (O delegado Dr. Antônio Godoy Moreira da Costa escreveu vários artigos e um livro sobre a vida pregressa de Dioguinho. Ele, que conheceu pessoalmente pessoas que davam guarida a Dioguinho e talvez tenha conhecido até o bandido-não se sabe ao certo- jamais falou uma única frase que fizesse supor que Dioguinho era afeminado. O que este autor pensa do fato relatado por um escritor acima mencionado está lá escrito).

      Dioguinho, procurado em São Simão e região, já estava escondido nas margens do Rio Mogi Guaçu. A patrulha que já sabia onde o bandido escondia ficou de plantão ao entardecer, esperando Dioguinho e Joãozinho, buscar a correspondência.

      A patrulha ficou escondida do outro lado do rio, em Santa Eudóxia (São Carlos), aguardando á chegada dos dois bandidos. Isso aconteceu dia 1 de Maio de 1897 ao entardecer.

      Quando chegaram ao local, Joãozinho e Dioguinho estavam remando a canoa, mas não chegaram muito perto do barranco, quando a patrulha atirou, matando só Joãozinho que caiu no rio e o Dioguinho pulou da canoa junto com seu cachorro caçador de perdiz, que sempre o acompanhava. Era noitinha do outro dia quando acharam o corpo do Joãozinho, que foi enterrado na cidade de São Simão. Já do Dioguinho, ninguém teve mais noticias.

      Outra versão da tocaia e mote de Dioguinho: o bando do Dioguinho estava acampado numa “ilha” do Rio Mogi, num local denominado Porto Velho [Jataí/Luiz Antônio (SP)]: o cozinheiro do bando, como de costume, foi fazer compras em Jataí. Os policiais do Dr. França Pinto e do Dr. Godói estavam na cidade e submeteram o cozinheiro a um interrogatório e acabaram por arrancar dele a confissão de que estavam na ilha. Os policiais convenceram ao cozinheiro levá-los até lá. Perguntaram-lhe como ele voltava à ilha, cada vez que saía: -Eu chamo pelo Diogo e ele vem me buscar de canoa; teria dito o cozinheiro. Assim foi feito: os policiais se esconderam na margem, enquanto o cozinheiro, aos gritos, chamava pelo Diogo. Pouco tempo depois, uma canoa vinha na direção do cozinheiro: dentro dela estavam o Joãozinho, o Dioguinho e um cão perdigueiro, companheiro de Diogo. Quando chegaram no meio do rio, foram metralhados pelos policiais. Joãozinho morreu dentro da canoa, mas Diogo lançou-se no rio, junto com o cão. Diogo nunca foi encontrado. Joãozinho foi enterrado, um dia depois, num local próximo, dentro do que é hoje uma estação experimental, tombada pelo Patrimônio Histórico, em Luiz Antônio (SP). Esta versão foi passada em trabalho de conclusão de curso pela historiadora Nilce Camila de Carvalho, Mestre da Universidade Estadual de Londrina (PR).

      Historiadores atestam que ele continuou vivo aparecendo em diversos lugares do Brasil.
Anos depois de ser dado como morto, ele foi visto em São Paulo, na antiga Casa Alemã (Mappin). E apareceu em muitos lugares, como se propala que relata os boletins de ocorrência da polícia de São Paulo. Há relatos que ele morreu de velho no Estado do Paraná, onde tinha parentes e outras vezes, dizem que ele morreu de velho morando em Minas Gerais.

      Nos relatórios policiais atestam que o Dioguinho também morreu, mas que nunca encontraram o corpo. Sobre o fato surgiram muitos mitos. Há quem diga que Dioguinho morreu de velhice, lá mesmo em Botucatu, onde nasceu; fato que nunca foi comprovado. Ouro dado que destaco, é que alguns historiadores mencionam que Dioguinho foi morto no Rio da Onça; rio que este autor conheceu muito bem e cujas dimensões não permitiriam que se usassem canoas, devido suas pequenas dimensões (trecho mais largo do Rio da Onça era quando eu era criança, de no máximo sete ou oito metros); hoje com toda a terra movida na preparação e cultivo dos canaviais, é bem provável que o Rio da Onça tenha sido completamente assoreado. Vi-o, pela última vez no início dos anos 1960. O Rio da Onça continuava lá, tranqüilo, impassível, sereno, mas a história de Dioguinho persiste.

      DIOGUINHO COMO PERSONAGEM DE TESES DE PÓS-GRADUAÇÃO E MESTRADO

      Embora a história nos conte que alguns bandidos já haviam precedido Dioguinho na região; Dioguinho, no entanto, foi o mais temível. Os outros, que se têm notícia foram os matadores de aluguel: João Brandão, Chico Tanoeiro, Juca Aragão, João Bairral e “Dente de Ouro”; este último foi personagem de texto de Menotti Del Pichia (um dos integrantes da Semana de Arte Moderna), nos anos 20.

      Ao rever a trajetória da construção de um mito, a autora do trabalho de conclusão de curso da (TCC) da USP-SP, Marília Schneider comenta a ação policial e judiciária para a captura do famoso homicida paulista, tomando por bases narrativas literárias, crônicas jornalísticas e os julgamentos de habeas corpus dos acusados de cumplicidade do criminoso. Durante o mês de abril do ano de 1897, o Governo do Estado de São Paulo empreendeu uma verdadeira força-tarefa para capturar Diogo da Rocha Figueira, o “Dioguinho”, a quem se atribuía mais de 50 assassinatos praticados entre os anos de 1894 e 1897. O facínora vivia acoitado em fazendas no extremo Oeste do Estado de São Paulo, na região denominada de “Alta Mogiana”, formada em função das ferrovias que se interligavam com a Estrada de Ferro Mogiana. Essa região abrangia a comarca de Ribeirão Preto, cidade então considerada a capital mundial do café.

      A mestranda da Universidade Estadual de Londrina, Nilce Camila de Carvalho defendeu a tese das causas que levaram Dioguinho a manter-se no banditismo por tanto tempo: foi a “opressão cafeeira”, ou seja, a riqueza junto com o poder e as leis manipuláveis, os causídicos ávidos por dinheiro e a sensação de impunidade dos mais abastados.

      Embora eu, ACAS, tenha encontrado uma afirmação de que já foram feitas 27 (vinte e sete) Teses de Mestrado e de Doutorado (até 2006) com a história de Dioguinho, eu encontrei apenas cinco na Internet. Observem que neste texto, há indicações e nominações de outros mestrandos, pós-graduados e doutorandos, que falam do bandido.

      OUTROS PROTETORES DE DIOGUINHO

      Os fazendeiros defendiam interesses da Companhia Melhoramentos de Estradas de Ferro. A Companhia Melhoramentos era opositora da companhia Mogiana de Estradas de Ferro. O Diogo da Rocha Ferreira, vulgo Dioguinho, era funcionário da Mogiana. Havia interesses comerciais de ambas as partes (transporte ferroviário, fluvial, produção de café e de lenha e/ou material para celulose).

      Os protetores principais de Dioguinho foram, conforme trabalho de doutorado de Marília Schneider (doutora em História social pela USP): Senador Alfredo Ellis (Jataí (SP); Bacharel Henrique Amâncio de Souza Jordão (deputado estadual do Rio de Janeiro); Martinho Soares e João dos Santos (da cidade de São Simão (SP); João Antônio Mariel (capitão da Guarda Nacional); Capitão Coronel Cândido Cyrino de Oliveira; Tenente Mizael Gonçalves de Oliveira (Ribeirão Preto (SP) e Reginaldo Marques Gomes (juiz de paz de Cravinhos (SP).

ECOS DA HISTÓRIA DE DIOGUINHO

      Gostaria de reforçar aos meus leitores que eu, ACAS, nasci e vivi na mesma região onde Dioguinho irradiava o medo. Raras vezes se tem notícias de que alguém mostrasse simpatia pelo bandido, embora haja um trabalho feito por um doutorando de Luiz Antônio (SP), onde um ou dois depoentes teria dito que “Dioguinho arrancava coisas dos ricos para dar aos pobres”; sendo estes depoimentos uma coisa rara.

      Eu nasci 50 anos depois da morte de Dioguinho e me lembro perfeitamente que, na Fazenda São José do Pântano, havia as marcas de uma antiga estrada, abandonada, que ligava São Simão (SP) à Jataí (SP). Comumente os antigos moradores da fazenda comentavam que por ali, o bando do Dioguinho passou inúmeras vezes. E a tal estrada abandonada, em meio a um pasto, ficava a pouco mais de um quilômetro da casa onde nasci e vivia. Passei por aquele trecho centenas de vezes, nas reinações da minha meninice de menino caipira. Por outro lado, sei que vale mais este registro histórico da vida do Dioguinho, porém o fato dele ter existido jamais foi motivo de orgulho para mim.


Antônio Carlos Affonso dos Santos – ACAS. É natural de Cravinhos-SP. É Físico, poeta e contista. Tem textos publicados em 7 livros, sendo 4 “solos e entre eles, o Pequeno Dicionário de Caipirês e o livro infantil “A Sementinha” além de três outros publicados em antologias junto a outros escritores.