O menino caipira; sem o saber, decidiu que ensinaria ao seu país e ao mundo, as palavras lusófonas que ele sabia que eram faladas, mas não escritas.

      Começou a plantar palavras em várias áreas de sua terra natal, tantas quantas fosse possível plantá-las.

      E plantou palavras; dias e noites. E as cultivou, observou-as crescerem, na esperança de que grandes florestas de palavras surgissem em todo o país.
     
      Muitas foram as pragas que as combateram. Muitos foram os machadeiros que as queriam derrubar; por vergonha, inveja ou ignorância.

      Seu sonho era de que o seu país fosse uma nação de pensamentos e palavras cultivadas.

      E as palavras medraram rapidamente, proliferaram, cresceram e deram folhas, flores e frutos; e os lusófonos se deliciaram.

      E o menino colheu algumas sementes dessas árvores e as atirou na rede mundial, atingindo intelectuais, gente simples, poetas, pensadores, escritores, socialistas e comunistas convictos, além dos democratas, moderados ou não.Sementes caíram em meio a espinheiros, que as sufocaram e mataram; sementes caíram em campo aberto e as aves as comeram; sementes caíram, porém em solo fecundo e germinaram…

      E ele convidou seu povo a se aproximar do bosque por ele plantado, para que o povo pudesse ver desabrochar as flores e os frutos das palavras e ainda se embriagarem com seus perfumes.

      E então, ele colheu suas melhores palavras plantadas, sacudiu-as, tomou-as em suas mãos e as glorificou, dizendo: tomai conta e aprendam todos vós as palavras lusófonas; vêm e as recebam todas, pois elas são o meu sangue, meu corpo e meu sonho!

      É meu corpo, porque são a luz do conhecimento e a inteligência, os sentimentos, a emoção, os planos, os sonhos… . Também é corpo porque a palavra escrita é forte, ainda que o ser humano seja frágil; sabemos que o corpo humano murcha, como murcham as ervas do campo! Porém, as palavras escritas acabam por se transformarem em árvores que a tudo resistem, posto que são enraizadas em solo firme. De lambuja ainda oferecem a proteção de seus galhos para abrigar futuros ninhos dos pássaros, anunciadores de um novo tempo!

      É meu sangue, posto que sangue significa a vida. O sangue derramado é a vida tirada e violentada, daqueles que nasceram e viveram nas trevas da ignorância e do desconhecimento.

      E as pessoas vieram e beberam de sua fonte; de suas palavras.

      E ele entendia que um dia, seriam necessárias mais e mais pessoas para ajudá-lo a fornecer palavras e sacudí-las na frente dos incrédulos.

      E algumas pessoas teriam que subir nas árvores das palavras, colher algumas delas, pouco conhecidas, sacudi-las para então atirá-las nas pessoas que estavam mais abaixo, no chão; na esperança vã de que tudo cairia do céu.

      E as pessoas que recolhiam palavras no chão, alimentando-se delas, saciavam sua fome de saber e as retransmitiam ao restante do povo, que estava além; muito além do bosque das árvores das palavras escritas.

………….fim do texto.

Antônio Carlos Affonso dos Santos – ACAS. É natural de Cravinhos-SP. É Físico, poeta e contista. Tem textos publicados em 7 livros, sendo 4 “solos e entre eles, o Pequeno Dicionário de Caipirês e o livro infantil “A Sementinha” além de três outros publicados em antologias junto a outros escritores.