Histórias que os Pescadores contam, ou O Minêrim Cachacêro
Um mineirim, de nome Tunim, tinha dois amô na vida: cachaça e pescaria.
Num vivia sem uma das duas coisa que gostava; das veiz fazia as duas dijunto.
Como seu sítiozinho pôco produzia, passô a comprá cana dos vizinho e das veiz inté a robá cana das fazenda de longe, tudo pra moê e fazê cachaça. Pra fazê cachaça, ele fez uma barganha com dois porco cevado, por um alambique de cobre. E passô a fazê cahaça!
A cachaça num era tão boa anssim, mai ia tintiano; um dinherinho aqui, ôtro ali, ia viveno e pelejano cum a vida. Desse jeitim, ele num dexava de tê seu dinhêro e num dexava de í pescá.
Inté que num dia de muita chuva fina e um frio de batê os dente, ele que tinha ído pescá anssim mêmo; inzagerô nas cachaça. Quando arresorveu vortá pra casa, já no fim do dia, ele tava mai pra lá que pra cá!
Mai, o Tunim tinha que passá num trecho da rodovia Anhanguera, pra fazê o retorno e pegá a istradinha de terra que ia pro seu sitiozinho. O carrim véio do Tunim, um Ford 28 com bigode e roda de aro de bicicreta, inté que ia maomeno, mai num é que envinha na sua frente um carro BMW novim que brecô de repente pra desviar dum buraco, e o Tunim infiô sua charanga na trasêra do BMW.
O dono da BMW saiu ingual uma fera pra cima do Tunim, chamano ele de barbêro i de burro i sôrtano us cachorro.
O Tunim, que tava veno tudo anuviado, promode das cachaça que tomô; óia bem firme pro home do BMW e diz:
– Vamo mantê as carma, moço. Tudo vai se arresorvê…
– Resolve nada, seu caipira duma figa! Veja o prejuízo que me causou!
– Carma, moço! Óia, eu tenho aqui uma cachacinha que eu mêmo fiz no meu sítio. É das boa! Toma um gole que o sinhô vai se acarmá logo!
O moço do BMW toma um gole no gargáio.
– Acarmô?
– Acalmei nada!
– Então toma mais uma, por obséquio… U sinhô tem que se acarmá!
E anssim foi. Dispois de uma dúzia de gole no gargáio do garrafão, o Tunim perguntô:
– Acarmô?
– Sim, agora sim!
– Intão agora nóis vamu sentá aqui, chamá a pulícia pra fazê teste do tar di bafômetro, prumodi vê quem tá errado, tá bão?
Antônio Carlos Affonso dos Santos – ACAS. É natural de Cravinhos-SP. É Físico, poeta e contista. Tem textos publicados em 7 livros, sendo 4 “solos e entre eles, o Pequeno Dicionário de Caipirês e o livro infantil “A Sementinha” além de três outros publicados em antologias junto a outros escritores.