Uma, seus méritos, seu nome e a carreira que construiu no rastro do tema de preservação do Meio Ambiente e salvação do Planeta, com uma ligação estreita a ONGs internacionais que acabaram consolidando sua imagem no exterior. Um fenômeno de fora para dentro que, apesar de tudo, e curiosamente, não chegou a atingir seu Estado natal, o Acre, onde ficou em último lugar entre os principais candidatos a presidente em 2010.

Esses votos de Marina, definidos como os votos verdes, contudo, renderam-lhe uma base de apoio cativa, financiamento de campanha, temática sólida, mas não a levariam, sozinhos, ao pedestal de fenômeno que acabou galgando. Igualmente importante, ou até mais, foi a exposição nos meios de comunicação de massa, os principais telejornais da TV aberta do Brasil.

Teatral e tardia estridência contra o Código

Há uma terceira razão muito forte que pode até ser a preponderante: Marina Silva representou a terceira via. Entre PT e PSDB, uma parte consistente do eleitorado, notadamente das camadas de nível mais elevado de instrução e renda, preferiu Marina, como em outras disputas preferira Ciro Gomes e outros tertius, por exemplo, evitando os polos das últimas disputas eleitorais no país.

A ex-senadora, ex-ministra e ex-candidata a presidente, que saiu da campanha eleitoral em excelsa glória, perdeu o prumo, o rumo e o ritmo nos últimos seis meses pós disputa presidencial. Não está sabendo o que fazer com tão extraordinário desempenho e queima sem parar seu capital.

A empreitada mais relevante que contratou, única na qual se destacou nesse período, foi uma querela interna no Partido Verde, onde embarcou numa divisão entre os grupos do Rio e de São Paulo, engalfinhando-se desnecessariamente com o secular dirigente partidário do PV, José Luiz Penna. Marina chegou a inclinar-se por uma facção do partido, a Transição Democrática, a ponto de seu público atribuir a ela o desejo de, tal qual os políticos velhos de guerra, sair para criar seu próprio partido se não conseguisse o poder de mando entre os verdes. Mais mofado em matéria de política partidária, impossível.

Sua ficha de filiação é nova em folha, mas o exercício dos piores e tradicionais hábitos políticos é irresistível. Marina Silva ficou longe dos temas importantes, inclusive aqueles de seu domínio histórico, e não foi capaz sequer de aceitar críticas que lhe apontavam o seu desvio do caminho principal.

Reagiu com arrogância aos comentários de que, enquanto travava uma luta com Penna em torno do domínio do PV, o Código Florestal, ouro puro do ambientalismo mundial em discussão, seguia seu curso congressual sem a contribuição de tão ilustre especialista.

A resposta de Marina Silva foi dizer que, como não tem mandato, trava o diálogo com a sociedade e não com o Congresso. E criticou parlamentares do seu partido por terem permitido o avanço da negociação do Código. Recebeu, de volta, o desdém, por seu alheamento e desinformação.

Ora, é no Congresso que o Código está tramitando e sendo votado, deve entrar em pauta esta semana, depois de anos de negociação com a sociedade.

Em 2008 um esboço do Código ficou pronto, em 2009 chegou à Comissão especial e começou a ser trabalhado pelo relator, deputado Aldo Rebelo (PCdoB), que executou um detalhado e estratégico projeto de discussão e negociação das mudanças em todo o país, com os mais diferentes auditórios e grupos de interessados, os cidadãos aos quais as normas atingem diretamente. Foram 70 reuniões em 22 Estados, algumas com 5 mil, 6 mil pessoas.

Essa mega negociação, inclusive mais recentemente envolvendo as conflitantes autoridades do governo que conseguiram chegar a um consenso mínimo, e com as bancadas de ruralistas e ambientalistas – PV incluído – resultou em duas ou três versões do Código com alterações acatadas pelo relator.

Pronto o trabalho para ir a voto, a ex-candidata a presidente, instigada pelas críticas, resolveu, ontem, insurgir-se. Participou de reunião da bancada do Partido Verde e liderou uma marcha ao chefe da Casa Civil, ministro Antonio Palocci, para propor adiamento da votação do projeto, prevista para hoje. E o fez, novamente, com falta de senso de realidade: "Espero que o bom senso sinalize no sentido do adiamento, é impossível elucidar esse texto de hoje para amanhã, é uma irresponsabilidade de quem disser isso".

A ordem de zerar tudo é uma tardia estridência da ex-senadora contra um espetáculo que está há quatro anos em cartaz com encerramento já agendado. Dificilmente os atores concordarão em voltar tanto no tempo. A conferir se as ONGs internacionais que apoiam a ex-senadora terão força para sustar, neste momento, a tramitação do projeto.

Está claro que Marina Silva precisa e merece um bom aconselhamento, daqueles que lhe apontem caminhos que possam manter acesa a sua chama política até a próxima disputa eleitoral. É preciso ver, porém, se ela quer, ou se a falta de eixo desses meses pós-campanha tem um significado mais radical, porém oculto.

Ecumênica também na sua insatisfação, a presidente Dilma Rousseff tem avaliação negativa do desempenho dos mais importantes ministros do PT e do PMDB, os dois pilares de sustentação do seu governo.

Do PT, sobram críticas, especialmente, ao ministro da Educação, Fernando Haddad, embora o da Saúde, Alexandre Padilha, ainda não tenha dado motivos de regozijo à nova gestão. Os dois petistas de altíssima cotação partidária ainda não aconteceram no governo.

Do PMDB, o desânimo é com o representante principal, o ministro Edison Lobão, das Minas e Energia.

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Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília

Fonte: Valor Econômico