Segunda Frota da Liberdade começa a zarpar para Gaza
O barco que levará 50 pessoas da Espanha foi baptizado com o nome de Guernica e levará a Gaza uma reprodução livre, feita por vários artistas bascos, do famoso quadro de Pablo Picasso – Foto de Rumo a Gaza/Flickr Bilbao, Espanha, 24/6/2011 – Conforme se aproxima o momento de zarpar a Segunda Frota da Liberdade, uma dezena de embarcações nas quais viajarão mil activistas de 20 países rumo à sitiada Faixa de Gaza palestina, intensificam-se as ameaças das autoridades israelitas. O governo de Israel pressiona os governos dos países mediterrâneos de onde os barcos partirão no final deste mês, embora o lugar e o dia exactos não tenham sido revelados por motivo de segurança.
“Israel advertiu os diplomatas estrangeiros em Telavive que se preparem para encarar as consequências”, afirma um comunicado divulgado pelo comité coordenador da iniciativa Rumo a Gaza. O jornal israelita Haaretz revelou planos para uma abordagem com comandos especiais e franco-atiradores contra a “odiosa frota”, que só quer “confrontar as Forças de Defesas de Israel, criar uma provocação mediática e deslegitimizar o Estado israelita”, segundo afirmou no dia 19 o comandante da marinha de guerra deste país, Eliezer Marom.
O barco que levará 50 pessoas da Espanha – incluída esta repórter – foi baptizado com o nome de Guernica e levará a Gaza uma reprodução livre, feita por vários artistas bascos, do famoso quadro que Pablo Picasso pintou em 1937 após o bombardeio conjunto alemão e italiano sobre a cidade basca de Guernica.
O governo espanhol evitou dar declarações à imprensa. Mas a ministra dos Negócios Estrangeiros, Trinidad Jiménez, disse que a melhor maneira de ajudar Gaza é com pressão diplomática no lugar de frotas. “É fortemente desaconselhável embarcar em qualquer navio da iniciativa Rumo a Gaza devido ao grave perigo que pode acarretar para os participantes dessa frota”, afirma um aviso colocado no site do ministério dos negócios estrangeiros espanhol.
Israel impôs o bloqueio à Faixa de Gaza em Fevereiro de 2006, pouco depois que o radical Hamas (Movimento de Resistência Islâmico) venceu as eleições gerais na Palestina, e que foi endurecendo nos anos seguintes, sobretudo após a ofensiva militar Chumbo Derretido, lançada no final de 2008. As autoridades israelitas têm preparadas as prisões para receber os participantes da Frota, que supostamente seriam detidos e encarcerados por violarem o bloqueio.
“No ano passado, 15 dias antes de partir, sabíamos que, se a comunidade internacional não agisse, haveria uma matança, como comprovámos mais tarde”, disse à IPS o activista Manuel Tapial, coordenador da iniciativa Rumo a Gaza na Espanha e um dos viajantes da frota de 2010. Na madrugada de 31 de Maio do ano passado, o navio almirante da primeira Frota da Liberdade, o Mavi Marmara, foi abordado por comandos israelitas a partir de helicópteros militares, e nove activistas foram assassinados, 50 ficaram feridos e o restante dos 750 passageiros acabaram detidos sem acusação em Israel por um dia e meio, sendo deportados em seguida.
Israel não tem base legal para deter as embarcações ou impedir que entreguem a carga humanitária que transportam, afirmam juristas especializados em direito internacional. “Israel só tem jurisdição sobre as suas águas territoriais, que são as 12 milhas náuticas, e as águas de Gaza não são de sua competência, como tampouco o são as águas internacionais”, disse à IPS o professor de direito internacional da Universidade do País Basco, Juan Soroeta. “Nenhuma resolução da ONU autoriza o bloqueio de Gaza. Pelo contrário, é uma medida ilegal e unilateral imposta pela força por parte de Israel no contexto de uma ocupação igualmente ilegal do território palestiniano”, acrescentou.
A resolução 1860 do Conselho de Segurança da ONU, de 8 de Janeiro de 2009, determina que “sejam garantidos o fornecimento e a distribuição sem entraves da ajuda humanitária, incluídos alimentos, combustível e tratamento médico, em toda Gaza”. Porém, os informes de todas as organizações humanitárias internacionais que trabalham no terreno confirmam que esse ponto não é cumprido.
“Pedimos reiteradamente aos nossos governos e aos órgãos internacionais que revistem, mediante observadores, os barcos, a carga de ajuda humanitária que levamos e os passageiros, tanto nos portos como em alto mar, mas até agora ninguém respondeu a esta proposta”, disse Tapial. Estava previsto que o navio Mavi Marmara participasse desta segunda viagem, mas a sua proprietária, a Fundação de Ajuda Humanitária da Turquia (IHH), afirmou que as reparações dos danos sofridos no ano passado não estão finalizados e a embarcação não tem condições de realizar a travessia.
Há especulações quanto a esta decisão se relacionar de algum modo com as conversações reservadas entre Turquia e Israel. Mas o facto de a viagem prosseguir descarta o argumento de que esta campanha foi organizada pela islâmica IHH, à qual Israel acusa de ter “vínculos com o terrorismo”. Por outro lado, dentro de Israel “surgiu um debate aberto sobre o que fazer, e alguns defendem que deveriam deixar-nos passar porque somos civis, levamos apenas ajuda humanitária, e o bloqueio, segundo Israel, refere-se unicamente a armas”, disse Tapial.
Apesar das dificuldades, o comboio rebaptizado de Segunda Frota da Liberdade – Continuamos a Ser Humanos – em honra do pacifista italiano Vittorio Arrigoni, assassinado em Abril em Gaza – tem a intenção de entregar a sua carga, composta por materiais de construção, escolar e sanitário. A Agência das Nações Unidas para os Refugiados da Palestina “enviou-nos uma carta a informar que não poderiam receber a nossa carga para Israel não ter motivos de acusá-la de ser parte do conflito”, contou Tapial. “Mas, se chegarmos até lá, acredito que aceitarão os materiais e os distribuirão equitativamente”, acrescentou.
As dez mil toneladas de ajuda humanitária que era transportada pela primeira Frota da Liberdade foram confiscadas por Israel junto com os pertences pessoais dos passageiros e os equipamentos de trabalho dos jornalistas. Nada disso foi devolvido aos seus proprietários, o que representa uma “pilhagem ao mais puro estilo da pirataria”, afirmou o advogado espanhol Enrique Santiago, responsável pela denúncia apresentada contra Israel pelo ataque à Frota em águas internacionais.
Entretanto, o apoio civil à segunda viagem fortaleceu-se e recebeu o apoio de milhares de personalidades de todo o mundo, como as vencedoras do Prémio Nobel da Paz, Rigoberta Menchú (Guatemala), Mairead Maguire (Irlanda do Norte), Jody Williams (Estados Unidos) e Shirin Ebadi (Irão). As quatro destacadas activistas pela paz e pelos direitos humanos pediram ao secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, que convença os governos dos países envolvidos na missão a adoptar as medidas necessárias para garantir a sua segurança.
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A informação é da IPS, na Envolverde