Governos de esquerda: o imperalismo dos EUA e a crise do capitalismo
Participaram desta mesa o vice-presidente do PSB (Partido Socialista Brasileiro) e ex-ministro da Ciência e Tecnologia Roberto Amaral; a integrante do Departamento de Relações Internacionais do Partido Comunista de Cuba Idalmis Brooks; o senador uruguaio Ernesto Agazzi da Frente Ampla e ex-ministro da Agricultura e Luis Fernandes professor de Relações Internacionais da PUC RJ. O debate foi coordenado por Valter Pomar, secretário-executivo do Foro de São Paulo.
Imperialismo dos EUA consolidado
Roberto Amaral, ao iniciar o debate, afirmou categoricamente que o capitalismo não acabou e a hegemonia imperialista dos EUA segue fortalecida, ainda que sob a crise econômica. De acordo com Amaral, não há mais uma bipolaridade de forças geopolíticas como no passado – comunismo e capitalismo – e sim um imperialismo americano, fundamentado na tecnologia, nos valores culturais, na estrutura financeira, além da força militarizada, espalhados pelo mundo. “Não há adversário no mundo à altura do poderio norte-americano”, ressaltou.
Roberto Amaral, vice-presidente do PSB
Para o vice-presidente do PSB há uma coincidência da perpetuação deste imperialismo com a crise do capitalismo e a crise dos partidos de esquerda e da social democracia de esquerda na Europa. “Não somos inocentes neste quadro, somos partícipes”, destacou Amaral. “Abandonamos a denúncia do imperialismo, abandonamos a guerra da contracultura.”
O grande desafio para os governos progressistas latino-americanos na avaliação de Amaral é o de reverter o projeto imperialista de dividir o mundo entre os que produzem e os que consomem. Há três possibilidades deste mundo em transformação, segundo ele: neocolonialismo, guerra mundial pelas fontes renováveis ou o socialismo internacional.”Desafio não é governar sob o capitalismo mas com as baionetas do imperialismo contra nós.”, concluiu.
Integração das cadeias produtivas da América Latina
Luís Fernandes, por sua vez, reiterou a avaliação de Amaral sobre a hegemonia estadounidense fortalecida pelo colapso do socialismo, processo que pode paralisar as esquerdas. E chama a atenção para um aspecto dessa hegemonia que pode destruí-la: a interferência financeira nas economias dos países ditos “periféricos”, resultando na mudança de pólos dinâmicos de produção e enfraquecimento relativo de polos centrais (países desenvolvidos).
Luís Fernandes, professor do Instituto de Relações Internacionais da Pontifícia
Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ)
O professor traçou ainda, em linhas gerais, a estruturação das forças progressistas de esquerda latino-americanas que estão nos governos de países como Uruguai, Brasil, Argentina, dentre outros. A legitimação destas forças ocorreu nas lutas de resistência às ditaduras, nas fases de transição democrática na maioria dos países latinos, quando as esquerdas fizeram oposição à agenda neoliberal. Com o fracasso do neoliberalismo, essas forças são levadas aos respectivos governos pelo voto e agora têm compromisso com o desenvolvimento sustentável. “As bases deste desenvolvimento são frágeis, porque estão sendo colocados na economia global como produtores de commodities dos novos atores”, resume. Segundo o professor, essa conjuntura favorável é para avançar num processo de integração regional para fortalecer essa agenda e o caminho possível seria a estruturação de cadeias produtivas regionais, para reduzir as assimetrias latino-americanas.
Idalmis Brooks, membro do Departamento de Relações Internacionais do
Partido Comunista de Cuba
Idalmis Brooks destacou em sua apresentação que a crise estrutural do capitalismo leva as esquerdas à convergência de ações e, ao mesmo tempo, ameaça a hegemonia dos EUA – manifestada nas revoltas no Oriente Médio e na Europa, no crescimento econômico da China. De acordo com Idalmis as esquerdas devem se preparar para enfrentar essa crise em todos os seus aspectos, em defesa dos povos, a exemplo de Cuba, que está há 50 anos em busca desta utopia.
Uruguai: Estado capitalista governado pela esquerda
O senador Ernesto Agazzi fez um relato das experiências da Frente Ampla – que reúne vários partidos de esquerda – em dois governos consecutivos do Uruguai. No primeiro mandato – 2005 a 2010 – a Frente iniciou um processo para reduzir a exclusão social, econômica e política no país. “Tivemos a responsabilidade de reverter este quadro”,explicou “ Tivemos que criar formas novas de fazer políticas, e nos formamos como políticos, era a primeira experiência das esquerdas em governos do nosso país.”
No primeiro mandato, segundo o senador, o Uruguai estava numa profunda crise econômica, política e social e com a nova agenda, entrou num processo de crescimento, que pode ser entendido a partir dos números: aumento de 31% do PIB (anteriormente era 6,9%); a pobreza foi reduzida de 40% para 21% e de indigência diminuiu de 4,6% para 1,6% na população uruguaia. Agazzi destacou que houve ações de estímulo ao emprego, aos salários, além da reformulação do sistema tributário, da propriedade da terra e do sistema de defesa. “Houve a reativação dos contatos com o Mercosul, que deve ter outra visão e não a mercado”, afirmou ainda.
Exposição de Ernesto Agazzida, senador da Frente Ampla e ex-Ministro da
Agricultura, Uruguai
Neste segundo mandato, a Frente se depara com outro desafio, segundo Agazzi: qual tipo de crescimento econômico o país deve ter? Ele lembra que em muitos momentos da história do Uruguai e da América Latina houve crescimento, nem sempre acompanhado de inclusão social, por exemplo. “Somos um país pequeno, com economia ligada aos recursos naturais e a transformação estrutural da produção é grande desafio desta etapa”, ressalta.
Outro aspecto deste desafio destacado pelo senador seria o de transformar a estrutura do Estado uruguaio, uma vez que a direita ameaça com o discurso do medo, e a Constituição atual está fundamentada na cartilha neoliberal. “Não basta governar para a maioria, temos que governar com a maioria”, resume.