Um banqueiro não passa fome
É preciso cortar na despesa e emagrecer o Estado, clamam as vozes do costume. Olhem para o novo governo que é “curto” e “jovem”, vejam o primeiro-ministro que só viaja em “econômica”, deslumbrem-se com a abolição das gravatas no Ministério da Agricultura. Tudo em nome do corte na despesa. Sacrifícios imensos para dar o exemplo. Para que o povo compreenda a razão dos sacrifícios. Para que o povo alcance que o roubo no subsídio de Natal, a liberalização dos despedimentos, o fecho do centro de Saúde, não serão em vão.
A partir da densificação de notícias em torno da desvalorização bolsista dos bancos, da sua avaliação nos ditos “testes de stress”, da necessidade de injetar dinheiro na economia, das descidas de notação da banca pelas agências de rating, da exposição da banca à dívida grega, não tardará a que se crie o ambiente favorável à transferência do Estado de milhões de euros para a… banca. Uma espécie de BPN em larga escala. Matéria, aliás, escandalosamente prevista no programa da troika e cinicamente silenciada.
O argumento será “sério” e “técnico”. Recapitalizar a banca, dirão. Ou melhor, pôr o Estado — esse que é gordo, despesista, que vive acima das suas possibilidades — a entrar com o dinheirinho, mesmo que isso ponha o País a comer pão seco. Sim, porque não se pode pedir esse sacrifício aos banqueiros. A quem, só entre 2004 e 2010, alcançou mais de 14 mil milhões de euros de lucros. A quem vive da especulação. A quem milhões de trabalhadores transferem, por vias diversas, a riqueza que produzem.
É por isso que se tornará cada vez mais necessário — e será cada vez mais decisivo para a luta que travamos — que se alargue a consciência de que para lá do PS, do PSD e do CDS, de que para lá do Estado, está de fato uma classe que os domina, controla e explora o país.
Este texto foi publicado originalmente no jornal Avante!