Desemprego nos EUA e Europa lembra Brasil da era Collor
A explosão das taxas de desemprego nos Estados Unidos e na Europa, iniciada com a crise financeira internacional de 2008, tem ocorrido em proporções semelhantes às verificadas no Brasil entre o final dos anos oitenta e o início dos noventa, sob o governo de Fernando Collor de Mello. Foi nesse período, de graves turbulências políticas e econômicas, que os índices nacionais de desocupação praticamente dobraram, após uma longa etapa de ascensão mais lenta, na década anterior.
"Guardadas as proporções das economias, é uma situação semelhante", disse à Carta Maior o economista Sérgio Mendonça, do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio-econômicos (Dieese).
Naquele período, a taxa de desemprego da região metropolitana de São Paulo saltou de 8,7%, em 1989, para 15,2%, em 1992, segundo o Dieese. A origem da crise do mercado de trabalho estava na aplicação de políticas de cunho liberal na economia brasileira, quando sua base produtiva, repentinamente, foi exposta à competição externa.
A política recessiva instalada para combater a inflação agravaria ainda mais esse quadro, só encerrado – ainda que temporariamente – após a queda de Collor e início do Plano Real, já na presidência de Itamar Franco.
Nos casos norte-americano e europeu, em que pese todas as diferenças com o Brasil, instabilidade política e crise econômica também formam o substrato da deterioração do mercado de trabalho. Nesta sexta-feira (5), o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, comemorou a geração de 117 mil postos no país em julho, acima dos 75 mil previstos.
O desemprego caiu para 9,1%, ante os 9,2% registrados em julho – um avanço mínimo, porém, para um país que antes da quebra do banco Lehman Brothers, em 2008, possuía um índice de 5,8%.
Drama europeu
Na Europa, a situação do mercado de trabalho é ainda mais grave do que no país de Obama. O ranking do desemprego no bloco é liderado pela Espanha, onde o índice em maio atingiu 20,9%. É quase o dobro da taxa média registrada em 2008, de 11,4%, conforme dados da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Em seguida, estão os países que já recorreram a pacotes de ajuda externa para pagar suas contas. Na Grécia, a taxa de desocupação em março, última divulgada pela OCDE, alcançou 15%, um valor 95% mais alto do que os 7,7% apurados em 2008. Na Irlanda, o índice chegou a 14% em maio, 122% acima dos 6,3% de 2008. E em Portugal, o desemprego em maio foi de 12,4%, 46,2% mais alto do que os 8,5% de 2008.
Para Sérgio Mendonça, do Dieese, os níveis de desocupação dessas economias podem ser ainda maiores, caso se considere o chamado desemprego oculto, em geral não incluídos nos índices citados anteriormente.
Essa modalidade de desemprego, calculada na metodologia usada pelo Dieese, considera como desempregado o trabalhador que desistiu de procurar uma vaga por causa das más condições do mercado (o chamado "desemprego por desalento") ou ainda aqueles que realizam uma atividade produtiva ocasional, como "bicos" (o chamado "desemprego por trabalho precário").
No caso dos números divulgados pela OCDE, conhecidos tecnicamente como "desemprego aberto", essas formas de desocupação são normalmente desconsideradas – e justamente elas, que tendem a crescer mais rápido em momentos de crise.
Conseqüências
Diante de tamanha deterioração, e em um curto período, dos níveis de emprego, quais as conseqüências para as sociedades que enfrentam esse processo?
No caso brasileiro, a transformação da crise do mercado de trabalho em crise social sempre foi amenizada por condições peculiares do país. Segundo Mendonça, a informalidade e a flexibilidade de nosso mercado de trabalho são traços historicamente constituintes das relações laborais brasileiras, e tendem a ser acionados nos momentos de maior dificuldade.
No caso europeu, porém, a experiência com formas precárias de relações laborais é mais recente. Legislações que permitiram contratos de trabalho temporários e de tempo parcial surgiram apenas nos anos setenta. Assim, a chance de conflitos graves por conta do aumento do desemprego, como terrorismo, poderia ser mais alta entre europeus do que entre brasileiros – uma tese que ainda precisa ser comprovada pela realidade.
De qualquer maneira, em documento divulgado no ano passado, antes mesmo da recente tragédia vivida pela Noruega, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) já alertava que a desocupação entre jovens caminhava para níveis recordes no pós-guerra, em especial na Europa, tornando-se um combustível para a criminalidade e a violência.
"A incapacidade de encontrar emprego gera a sensação de inutilidade e inatividade entre os jovens, o que pode levar a um incremento na criminalidade, nos problemas de saúde mental, violência, conflitos e consumo de drogas", diz o informe "Tendências de Emprego Global da OIT para os Jovens 2010".
Entre 2008 e 2009, o desemprego entre jovens de 15 a 24 anos nas principais economias desenvolvidas saltou 4,6%, para 17,7% do total da força de trabalho naquela faixa etária.
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Fonte: Carta Maior