Na madrugada do dia 13 dezembro de 2007, o Senado Federal extinguiu a CPMF por 45 a 34 votos. De nada adiantou o compromisso do presidente Lula de que seria total a transferência dos recursos arrecadados por esse imposto para a saúde. À época, formou-se uma diabólica aliança entre a mídia, a dupla PSDB e DEM e a plutocracia do país. Contra a CPMF, a Fiesp coletou mais de um milhão de assinaturas e promoveu até showmício. A campanha midiática alardeava que seu fim aumentaria a renda, baratearia o crédito, reduziria a carga tributária. Enfim, uma panaceia para todos os males.

Pelos cálculos do governo, 40 bilhões de reais seriam arrecadados em 2008, pelo extinto imposto. Quanto esse montante poderia assegurar em remédios, equipamentos e contratação de profissionais da saúde? Quantas mortes poderiam ter sido evitadas? Quanto reforço poderia proporcionar ao Sistema Único de Saúde (SUS)? Naquela madrugada, a elite brasileira demonstrava mais uma vez seu desprezo ao povo. Preocupada em acabar com o mecanismo fiscal que lhe dificultava a sonegação, a lavagem de dinheiro, cometeu um crime hediondo contra a Nação, pois golpear o SUS é ferir de doença e morte o povo brasileiro.

O SUS nasceu no bojo do vigoroso movimento democrático, patriótico que pôs abaixo a ditadura militar em 1985 e desembocou na Constituinte de 1988. Neste período, entre outras bandeiras democráticas, ganhou força o movimento pela Reforma Sanitária Brasileira. Como resultado a saúde foi grafada na Constituição da República como direito de todos, e dever do Estado. E para assegurar esse preceito foi criado o SUS para garantir o acesso universal e integral às ações e aos serviços de saúde. Uma grande conquista social assegurada constitucionalmente, com essa abrangência, é algo raramente encontrável no mundo.

Contudo, ainda na “infância”, o SUS sofreu o impacto negativo da avalanche neoliberal que varreu o país na década de 1990. Agora, ele completa 21 anos. Qual a sua situação? Desde a vitória do presidente Lula, em 2002, houve avanços, mas entre os direitos sociais a saúde talvez seja aquele que mais distante ainda se encontra dos brasileiros.

O subfinanciamento é uma das causas do conjunto de lacunas e insuficiências do SUS. O Brasil investe em saúde apenas 3,7% do PIB. Metade do necessário, segundo parâmetros da Organização Mundial da Saúde (OMC). Esta marca o coloca nas derradeiras posições em termos de investimento no setor na América Latina. Além disso, a maior parte dos recursos vai para o setor privado que atende somente a 1/3 da população. Portanto, além de mais investimentos é preciso priorizar sua aplicação no setor público. É urgente a regulamentação da Emenda Constitucional 29. Ela visa a assegurar os recursos mínimos para o financiamento das ações e serviços públicos de saúde. Sua fase quase conclusiva de votação está “empacada” na Câmara dos Deputados. Motivo: há um “destaque” que determina a criação ou não de uma nova Contribuição Social para a Saúde, a CSS. E como esta proposta foi “satanizada” quando do fim da CPMF, a deliberação não se conclui.

Há falta de recursos humanos. O número de médicos, por exemplo, é insuficiente e eles estão mal distribuídos no território nacional. Os pequenos e médios municípios, as regiões pobres das metrópoles não estão dotados do conjunto de recursos necessários para garantir a solução dos problemas de saúde da população. A gestão deste sistema que abarca a União, os estados e municípios é desafiadora sob todos os aspectos. Desde os instrumentos de controle que combatam a corrupção à necessária expansão da força de trabalho e valorização profissional dos recursos humanos.

Entre outros caminhos para o fortalecimento no SUS, no âmbito dos debates da 14ª Conferência Nacional da Saúde, dois podem ser destacados. O povo, os trabalhadores precisam assumir o SUS como um grande patrimônio social da Nação, defendê-lo com a mesma determinação pela qual se batem, por exemplo, pelo trabalho e por melhores salários. Sem uma grande pressão política e social o SUS não será efetivamente prioridade de governo.

Outro caminho é elevar a saúde à categoria de parte destacada e estratégica do Projeto Nacional de Desenvolvimento. Tanto por ser indispensável à cidadania quanto pela dimensão de seu complexo produtivo para impulsionar a indústria brasileira com inovação e tecnologia de ponta. O país não pode continuar dependente da produção estrangeira na área de insumos de medicamentos e do aparato tecnológico que serve o setor.

Adalberto Monteiro
Editor