“Nós nos encontramos atualmente exatamente como Friedrich Engels previu (…), diante da escolha: ou o triunfo do imperialismo e a queda de toda a civilização como na antiga Roma, despovoamento, destruição, degenerescência, um vasto cemitério, ou a vitória do socialismo (…). Eis o dilema da história mundial, uma alternativa na qual os pratos da balança oscilam diante da decisão do proletariado consciente” (Apud Löwy, 1985: 119).

Berman, portanto, ao contrário de Marx, Lênin e Rosa Luxemburgo, capitulou perante a tão criticada unilateralidade das visões dos modernistas contemporâneos, ou pós-modernistas, e acabou se convertendo em mais um apologista ou avalista da sociedade realmente existente, a sociedade capitalista em crise.

Um dos mais duros críticos dos pressupostos teóricos dessa visão foi o marxista inglês Perry Anderson. Ele criticou a ausência dos conceitos de “classe” e de “luta de classes” nas análises feitas por Berman. Esse teria sido um dos motivos devido aos quais o conceito de “modernidade” aparecia como autoconstitutivo, autônomo, com uma história própria, sem determinações estruturais ou classistas.

A trajetória da modernidade, que se confundia com a trajetória do capitalismo, pareceria assim um desenvolvimento plano, retilíneo. A modernidade e o capitalismo conheceriam um desenvolvimento perpétuo e em linha sempre ascendente. As crises seriam apenas fatores dinamizadores desse processo. Detalhe: trata-se de um processo que parece só conhecer alterações quantitativas e não saltos qualitativos, ou seja, revoluções.

Criticando essa visão unilateral sobre o desenvolvimento da modernidade capitalista Perry Anderson afirmou:

“Mas, se considerarmos a explicação que Marx dá dessa sociedade, o que encontramos é algo que está muito distante de qualquer processo de desenvolvimento plano (…). A sociedade burguesa conhece uma ascensão, uma estabilização e um declínio. Nas próprias páginas dos Grundrisse (…), quando Marx fala do ‘ponto de floração’ da base do modo de produção capitalista, refere-se ao ponto em que ela pode unir-se ao mais alto desenvolvimento das forças produtivas, assim como o ponto do mais rico desenvolvimento do indivíduo ele também estipula expressamente: ‘Não obstante, esta planta em flor (…) fenece após a floração e como consequência de haver florido’” (Anderson, 1986: 6).

Octavio Ianni pareceu compartilhar da mesma visão de Anderson.

“Para Marx a história não é nem unilinear nem evolutiva; e muito menos cronológica. Fundamentalmente, a historicidade do capitalismo é dada pelo caráter essencialmente antagônico das suas categorias. Por isso é que há ocasiões em que a história parece precipitar-se, num ritmo que sobrepassa o andamento cronológico e em direções radicalmente novas. Ocorre que, de fato, ela se acelera, conforme se agudizam e explicitam as contradições de classes. Reciprocamente, há ocasiões em que a história parece adquirir outro andamento, mais lento. Isto também está relacionado ao caráter, à extensão e à profundidade das contradições de classes. Em outro nível, em nível estético, pode-se dizer que nas análises de Marx há tempos dramáticos e tempos épicos” (Ianni, 1985: 35 e 40).

Ao não levar em conta conceitos fundamentais, tais como “classes sociais”, “luta de classes” e “revolução”, Berman perdeu o próprio sentido da história e o conceito de “modernidade” perdeu seu poder explicativo do mundo realmente existente: o mundo sob a égide do capital. A modernidade realmente existente é a modernidade capitalista, que tem como motor a luta de classes, a luta entre nações dominadas e dominantes.

Em Marx, os termos “moderno” e “modernidade” designavam o período histórico marcado pela ascensão da burguesia e todas as suas manifestações políticas, sociais, culturais e morais. Não foi sem razão que a palavra “moderno” apareceu inúmeras vezes logo nas primeiras páginas do Manifesto. Os autores falavam da “indústria moderna”, da “moderna sociedade burguesa”, do “moderno proletariado”, do “Estado representativo moderno” etc. Sem dúvida, não poderíamos falar ainda de uma teorização marxista sobre a modernidade no Manifesto de 1848. Mas ele, decerto, oferece-nos pistas importantes para pensar uma possível construção do conceito marxista de “modernidade”.