“Época” de macarthismo
Na história brasileira toda vez que a direita recorreu ao anticomunismo, além de procurar “aniquilar” o Partido Comunista em virtude do seu crescimento ou de sua resistência à tirania, sempre usou esse ataque como estratagema para golpear governos democráticos e a própria democracia.
Uma “gota” de história basta como exemplo. Em 1947-1948 o macarthismo “tropical” comandado pelo general Dutra cassou o mandato da bancada comunista e depois o próprio registro da histórica legenda de 1922. O Partido Comunista do Brasil de então florescia, expandia-se. Em seguida, o governo do general sufocou temporariamente a onda democrática do pós-guerra e impôs um período de autoritarismo e retrocesso democrático.
Isso se repete agora. A direita reacionária recorre ao seu atávico anticomunismo para satanizar o PCdoB, justamente porque ele ganha crescente força política e social e se qualifica como um Partido revolucionário e contemporâneo. Mas, essa investida para enlamear a legenda comunista e desmoralizar o ministro Orlando Silva faz parte da tática da direita para golpear o governo da presidenta Dilma Rousseff, justamente quando ela lidera com êxito os efeitos da crise capitalista sobre o país, procurando defender a economia nacional e os direitos dos trabalhadores.
O texto da revista mais parece uma sentença lavrada por um pretenso jornalismo que se julga “togado” do que propriamente uma reportagem. Seu primeiro parágrafo, no entanto, é esclarecedor. “O Brasil sempre foi o país do futebol. Na última década, tornou-se o país do petróleo e das Olimpíadas. Nas três categorias reina um partido que saiu da clandestinidade nos anos 1980 para se acomodar no centro do projeto petista de poder”.
Fica nítido que o campo político reacionário do qual Época é instrumento não “engole” que as forças progressistas tenham chegado ao governo da República. Muito menos aceita que o PCdoB exerça responsabilidade de relevo no governo da República. Época rejeita as regras da democracia. Sua leitura macarthista da realidade não admite que o PCdoB em decorrência de sua força política e social, de sua respeitabilidade proveniente de 90 anos de história, da competência, da honestidade e do talento de seus quadros tenha um papel de destaque na vida institucional do país.
É cínico que a revista recorra a dois “cientistas políticos” tão inexpressivos quanto tacanhos para lavrar um diagnóstico de que o PCdoB teria abandonado suas convicções revolucionárias. Bem diz a sabedoria popular que “não se atira pedras em cachorro morto”. Atacam-no porque ele soube renovar-se, se colocar à altura da luta de classes que é travada na contemporaneidade. O queriam miúdo e à margem da história. Atacam-no justamente porque se fortalece armado com um Programa Socialista e uma política que respondem aos desafios do século XXI, mantendo e reavivando seus princípios e a identidade revolucionária. Se ele tivesse renegado seu compromisso com o povo, com o socialismo, é claro que não gastariam tanta munição contra ele. Aliás, a própria revista é obrigada a reconhecer a presença do Partido no movimento sindical e social como um todo, o trunfo de seu vínculo com a juventude e, ainda, sua capacidade de atrair personalidades da vida cultural do país.
A “bula” de Época, também, tenta achincalhar quadros do PCdoB. Descabela-se pela liderança que eles exercem. O ministro Orlando Silva deu uma dimensão importante a um Ministério que, praticamente, não existia. Sua atuação foi relevante para trazer a Copa e a Olimpíada para o Brasil. E a lisura com que enfrenta interesses poderosos que envolvem esses dois eventos e mesmo a cobiça pelo Ministério que cresceu com seu trabalho são motivações presentes nos ataques que ora recebe. A Agência Nacional de Petróleo (ANP) com a gestão de Haroldo Lima ganhou uma vida nova. Teve atuação destacada na elaboração do marco regulatório do petróleo das camadas do Pré-Sal. Dinamizou a ANP com a atuação na área do biodiesel e dos biocombustíveis. Criou a superintendência de fiscalização que nos últimos anos reduziu muito positivamente os índices de adulteração de combustíveis. E com a realização de concursos públicos agregou talentosos recursos humanos à Agência. O deputado federal Aldo Rebelo também atacado pela revista é uma das lideranças mais respeitadas do Congresso Nacional. Diz a revista que Aldo, como relator do Código Florestal, teria se tornado um porta-voz dos ruralistas. Mentira da grossa, pois hoje ele é um político dos mais respeitados pelos os agricultores familiares, vez que defendeu os direitos dos pequenos proprietários.
O texto aproveita para jogar lama na União Nacional dos Estudantes (UNE). Tudo o que tem honra e tradição parece incomodá-la muito. Criminosamente, a revista faz ligação entre a compra da sede do PCdoB em São Paulo com a gloriosa entidade dos estudantes brasileiros. Criminosa, porque a acusação é lançada a esmo, de forma gratuita, sem nenhum indício. Contudo, o acusador é obrigado a se render à lisura da UNE: “A UNE também já foi alvo de denúncias, mas não consta que qualquer uma tenha resultado em condenação”.
Época se assemelha a certo tipo de imprensa do tempo da ditadura que disseminava o preconceito, e mesmo o ódio, contra comunistas. Bastava uma testemunha forjada ou torturada, bastava uma acusação, um “suposto” delito para se aniquilar pessoas e partidos. Hoje, determinados veículos dos monopólios midiáticos ganharam semelhança com tribunais de exceção. Sem provas, julgam, condenam, lavram sentença. E mais: se arrogam o direito de governar, de nomear e demitir.
Sexta-feira última, quando a presidenta Dilma Rousseff manteve Orlando Silva no posto de ministro do Esporte, era visível a tristeza de uma mídia que se julga “o poder dos poderes”. Dilma defendeu publicamente o PCdoB, lembrou que a democracia que o país hoje respira foi conquistada com a contribuição dos comunistas. Defendeu o ministro e sublinhou que a República da qual ela é presidente respeita e pratica a presunção da inocência. Em suma, lembrou que o país tem um governo legitimamente constituído e que a vida das pessoas e das instituições é regida pelo Estado democrático de direito.
Adalberto Monteiro, jornalista e poeta, é presidente da Fundação Maurício Grabois e editor da revista Princípios