Marco regulatório é tema de Seminário Nacional do PT
Com as ausências do escritor Fernando Morais, que enviou documento endossando seu apoio à luta pela democratização do setor, e do ministro das Comunicações Paulo Bernardo, que atende a compromissos governamentais no Rio de Janeiro, Rui Falcão, presidente do PT, inaugurou o debate destacando a importância de o Partido resgatar seu compromisso histórico com a democratização da comunicação. Ele afirmou que, no evento, “não assumiremos decisões partidárias, mas compromissos com as entidades envolvidas nessa luta”.
Segundo Falcão, dentre os princípios compreendidos pelo PT para a criação do novo marco regulatório estão a liberdade de imprensa e o repúdio a qualquer tipo de censura; a pluralidade das fontes de informação; o fortalecimento da indústria nacional criativa, principalmente da produção independente, além da promoção da cultura brasileira e dos direitos de acesso à comunicação por redes públicas e comunitárias; o estímulo ao desenvolvimento regional e à desconcentração das oportunidades de negócio; e, por fim, uma regulação à luz da convergência dos meios e dos anseios por um Brasil soberano e socialmente mais justo.
O deputado federal Emiliano José, que integra a Frente Parlamentar Pela Liberdade de Expressão e Direito à Comunicação com Participação Popular, comentou a importância da retomada da pauta da comunicação: “Essa questã vinha sendo marginalizada pelo Partido, de certa forma. É fundamental que ocorra o resgate dessa luta para a nossa pauta. Trata-se de uma questão-chave para a democracia do Brasil”. Para ele, é preciso enfrentar a questão no sentido de ampliar o leque de vozes presentes na mídia e isso só pode ser feito com mobilização social. “Ou mobilizamos a sociedade em relação à questão, ou não avançaremos no âmbito parlamentar”.
André Vargas, secretário nacional da Comunicação do PT, defendeu que a realização do evento coloca o PT como catalisador do debate da regulamentação, que não é um anseio partidário, “mas uma necessidade da democracia brasileira”. Já Antonio Donato, vereador municipal do Partido, chamou a atenção para a importância do combate ao monopólio e oligopólio dos meios de comunicação. “A reflexão que produzimos ao discutir esse tema é a necessidade do direito à informação”, diz.
O estigma da censura, difundido pelas empresas de comunicação contrárias à criação do marco regulatório, foi comentado por Edinho Silva, presidente estadual do PT e deputado estadual. “Num país que se propõe a ser democrático e plural, não pode haver dogmas, estigmas e fantasmas que evitem esse debate sobre a democratização da comunicação”, diz. Ele argumenta que, pelo fato de a comunicação social ser concessão pública, o processo não pode ser vetado pelo âmbito empresarial. O deputado, bem como outros debatedores, chamou a atenção para a importância de levar o debate à sociedade civil.
Ainda participaram da mesa de abertura Paulo Teixeira, líder do PT na Câmara, e Selma Rocha, da direção da Fundação Perseu Abramo. Teixeira ressaltou a importância de regulamentar a comunicação não a favor de partidos, governos ou empresas, mas a favor da sociedade. Ele ainda lembrou que a regulação vigente foi criada no período da ditadura militar, o que expressa a urgência de sua atualização. Rocha, por sua vez, afirmou que “produzir informação é um direito social” e que, por isso, “é tão importante que esse debate venha à tona”. Ela ainda mencionou que a realização do seminário afirma uma política ligada à afirmação da democracia no país, além da qualificação política e social dos indivíduos para além do voto.
Estado, democracia e liberdade de expressão
O debate da parte da manhã teve como tema Estado, democracia e liberdade de expressão. Sob coordenação de Emiliano José, a mesa contou com Glauber Piva, diretor da Agência Nacional do Cinema (Ancine); Venício Lima, jornalista, sociólogo e professor aposentado da Universidade de Brasília; Rosane Bertoti, secretária nacional de Comunicação da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e Laurindo Lalo Filho, jornalista, sociólogo e professor aposentado da Universidade de São Paulo.
Para Piva, o direito à comunicação implica a garantia da circulação da pluralidade de ideias. “As novas tecnologias facilitaram a produção de conteúdo. Agora, é necessário regular o espaço para que essa produção tenha alcance tão potencial quanto o da grande imprensa”. Ele sintetiza que, sem regulamentação, “disponibilizamos conteúdo na rede, mas não disputamos o terreno da política”. Um novo marco regulatório, na visão de Piva, deve proporcionar a circulação da pluralidade de ideias, promovendo a liberdade de expressão e comunicação.
Liberdade de expressão para quem?
Autor de vasta bibliografia sobre liberdade de expressão e as relações de poder na imprensa, Venício Lima citou o estudioso Manuel Castells paraafirmar que a comunicação é a forma mais importante de exercício de poder no mundo contemporâneo. Em seguida, salientou que a ideia dominante propagada pela grande mídia é de que o Estado é inimigo da liberdade de expressão. “A ideia dominante, transmitida pela grande mídia, é que liberdade de expressão é identificada com a liberdade da imprensa. Essa é uma inversão absurda, na qual corporações controladas por poucas famílias são as portadoras e defensoras da liberdade de expressão”.
Para Lima, o papel do Estado é de garantir a liberdade e não vetá-la. A proposta do marco regulatório, em sua visão, define se mais ou menos indivíduos terão acesso ao debate público. “A pergunta é: mais gente vai participar do debate público ou apenas poucos grupos continuarão a ter voz na sociedade?”.
Mobilização social é fundamental
Rosane Bertoti, por sua vez, destacou a importância de sua contribuição por trazer a reflexão do tema a partir dos movimentos sociais. Ela chamou a atenção para a importância de mobilização: “Se queremos a democratização da comunicação e a consolidação da democracia no país, precisamos nos espelhar no exemplo sul-americano. A vontade política do governo argentino de implementar essa regulamentação somada à vontade popular e dos movimentos sociais possibilitarão a criação da Lei dos Meios e devemos seguir esse caminho”. Bertoti ainda disse que será um erro histórico do governo e dos movimentos sociais não encaminhar a democratização da comunicação.
Fechando a mesa de debates, Laurindo Lalo também criticou a postura da grande imprensa em relação ao debate. “Ninguem se manifesta a favor da censura, portanto a mídia se coloca como defensora da liberdade de expressão. O enfrentamento dessa barreira é difícil. Em nenhum país desenvolvido, os órgãos reguladores praticam censura. O papel desses órgãos é intermediar as necessidades da sociedade e a prática da comunicação social”, afirmou. Enquanto a grande mídia afirma que “o melhor controle é o controle remoto”, Lalo opina que “o controle remoto é utilizado para você tirar de uma coisa e colocar em outra que fala a mesma coisa. O conteúdo é o mesmo”.
Em sintonia com os outros debatedores, Lalo crê que o Brasil está atrasado em relação aos outros países da América Latina. Após a Argentina aprovar a Ley de Medios, o Equador também avança na regulamentação da comunicação. “Segundo a presidente Cristina Kirschner, a lei não é para controlar ninguém, mas para evitar que o povo seja controlado pelos grandes veículos”, afirma.
Fonte: Barão de Itararé