Um certo natal
Um certo natal
Naquele tempo
a gente era bem diferente de agora
embora todo mundo
no bairrozinho dito o Fim do Mundo
gostasse muito de ganhar presentes
na antiga Vila Itaguari
ninguém não estava nem aí
pra Natal, papai Noel
e outras inglesias.
Naquele tempo
Menino Jesus era caboco ressuscitado
no presépio do sacristão Manoel Ramos
festa boa era Boi Bumbá e pastorinhas
meninos e meninas
seguiam risonhos a estrela de Belém
e a gente achava que era lá no Pará
passagem dos inocentes pra cidade
êxodo rural tão legal!
Naquele tempo
pela primeira vez ouvi
falar dessas estranhas coisas da cidade
vi que minha mãe
ela mesma filha de emigrantes
já misturava as estações:
o Natal era paresque São João
então a brancarana de olhos azuis
inventou ser mamãe Noela
ela não contava com a malícia
dos filhos tapuios mandados dormir
porém com fingimento de tocaia
pegaram o “bom velinho” de saia
e estragaram a estória.
Naquele tempo ilhado perdi a inocência do Natal
em compensação ganhei um belo presente
em forma de pássaro encarnado chamado guará
Íbis rubra de papel crepom
feito com amor pelas mãos de mamãe.
Desde então quando chega a quadra natalina
a ave encantada da infância vem me visitar
e traz nas asas muitas recordações
e o renascer das velhas esperanças do passado.
José Varella, Belém-PA (1937), autor dos ensaios “Novíssima Viagem Filosófica”, “Amazônia Latina e a terra sem mal” e “Breve história da amazônia marajoara”.
autor dos ensaios “Novíssima Viagem Filosófica” e “Amazônia latina e a terra sem mal”, blog http://gentemarajoara.blogspot.com